Armas de destruição em massa e responsabilidade corporativa
Adrián Sánchez
Diretor de Compliance e Crimes Financeiros para a América Latina e Caribe da LexisNexis® Risk Solutions
É uma realidade que os diversos grupos criminosos e terroristas buscam traficar materiais químicos, biológicos, radioativos e nucleares regidos por diferentes tratados internacionais, leis dos Estados Unidos e da Europa, bem como por padrões corporativos globais. Embora esses tipos de materiais sejam legalmente usados por diferentes setores industriais em benefício da humanidade, eles também podem ser usados na produção de armas de destruição em massa (ADM), que estão sujeitas às mais rígidas regulamentações globalmente.
As penalidades pelo uso intencional ou não intencional de sistemas financeiros e cadeias logísticas comerciais para o tráfego desse tipo de material têm maior fiscalização internacional. Os principais agentes internacionais preocupados com este problema global são: os Estados Unidos, o Conselho de Segurança da ONU, a Interpol, a GAFI – Grupo de Ação Financeira Internacional e os países europeus. Todos eles compartilham uma agenda comum: impedir que os maus agentes desenvolvam armas de destruição em massa, bem como a lavagem de dinheiro que apoia esta questão. Quando evitamos que a lavagem de dinheiro aconteça, a qual financia esta atividade, ajudamos a impedir atividades criminosas e terroristas.
Vamos nos aprofundar em cada um desses agentes internacionais, que trabalham para impedir o desenvolvimento de armas de destruição em massa:
Organização das Nações Unidas (ONU) – O Conselho de Segurança (UNSON) e a Assembleia Geral da ONU alertam continuamente sobre a possibilidade de agentes não estatais, incluindo grupos terroristas, obterem acesso a armas e materiais de destruição em massa. Os terroristas testaram novas formas e meios de adquirir e usar essas armas com o objetivo de controlar melhor os seus próprios interesses criminosos, aumentando os danos às operações legítimas e espalhando o terror. A dark web torna possível obter facilmente materiais químicos, biológicos, radiológicos ou nucleares por meio de canais comerciais legais e ilegais, para atingir os objetivos propostos.
Devemos lembrar que as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSONU) são vinculativas para todos os Estados e, no campo de armas de destruição em massa, destacam-se as resoluções 2325 (2016), 1929 (2010), 1803 (2008), 1747 (2007), 1737 (2006), 1696 (2006), 1540 (2004) e 1373 (2001). Essas resoluções exigem que os países "congelem, sem atraso, os fundos ou outros ativos e garantam que nenhum fundo ou outro ativo seja disponibilizado, direta ou indiretamente, para o benefício de qualquer pessoa ou entidade designada por ou sob a autoridade do CSONU dentro do capítulo VII de sua carta de fundação" (recomendações da GAFI – Grupo de Ação Financeira Internacional, atualizadas em junho de 2021).
Essas resoluções garantem efetivamente que os sistemas jurídicos e bancos de dados, dentro das instituições financeiras, e empresas envolvidas em logística comercial devem seguir listas de sanções de grupos terroristas e as empresas que foram usadas para a transferência desses materiais no passado para impedir a produção de armas de destruição em massa no futuro.
GAFI – Por meio das Unidades de Inteligência Financeira (UIFs), o GAFI – Grupo de Ação Financeira Internacional promove o cumprimento da Recomendação 7 sobre sanções financeiras contra a proliferação de armas de destruição em massa. Os países membros da GAFI devem implementar sanções financeiras específicas para cumprir as resoluções do Conselho de Segurança (UNSON) para prevenir, suprimir e interromper o desenvolvimento e o financiamento de armas de destruição em massa.
Adrián Sánchez – Diretor de Compliance e Crimes Financeiros para a América Latina e Caribe da LexisNexis® Risk Solutions
Estados Unidos – É prioridade para o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos (DOT: 2011 e 2012), fazer cumprir as sanções para prevenir a proliferação de armas de destruição em massa. Desde os ataques de 11 de setembro de 2001, o Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC-Office of Foreign Assets Control) e a Unidade de Execução de Crimes Financeiros (FINCEN) adicionaram inúmeros países e empresas às listas de sanções. Além das penalidades que o governo dos EUA pode impor, o custo para a reputação de instituições financeiras ou comerciais, por serem usadas indiretamente por qualquer um dos países que violam essas leis, pode ser muito alto.
Europa – Todos os países europeus têm a responsabilidade de cumprir as resoluções do Conselho de Segurança da ONU, com relação à proliferação de armas de destruição em massa. O Reino Unido está liderando o caminho na Europa e provavelmente possui as regulamentações mais rígidas do continente. Pelo menos seis agências britânicas têm mandato para prevenir a proliferação de armas de destruição em massa. Por exemplo, o Departamento de Negócios, Inovação e Habilidades (BIS-Business, Innovation and Skills) é responsável por manter o sistema de aprovação de licença de exportação para mercadorias exportadas do Reino Unido fora da União Europeia, incluindo Irã, Coréia do Norte e Síria.
A França, em particular, tem uma grande indústria de energia nuclear e é muito cuidadosa em monitorar os materiais nucleares, bem como o manuseio e transporte de resíduos dentro e fora de seus portos. Os países do Leste Europeu também estão em alerta permanente, por causa das fronteiras que compartilham.
América Latina (LATAM) e Caribe – Todos os países membros do Grupo de Ação Financeira da América Latina (GAFILAT), o qual trabalha para desenvolver e implementar uma estratégia global abrangente para combater a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo – conforme estabelecido nas recomendações da GAFI -, são responsáveis pelo cumprimento da Recomendação 7 da GAFI. Os países membros também sofrem forte pressão dos Estados Unidos, para tornar o hemisfério ocidental livre da proliferação de armas de destruição em massa. Embora a maioria dos países da região tenha assinado o Tratado de Tlatelolco – que criou a primeira Zona Livre Nuclear do Mundo na América Latina e foi negociado e assinado pelos países latino-americanos resultantes da crise dos mísseis soviéticos de 1962 em Cuba -, os EUA continuam sendo um dos principais alvos de grupos terroristas, os quais tentam acessar este tipo de armamento. Por isso, os Ministérios de Finanças e as unidades de inteligência financeira dos países da América Latina e do Caribe estão constantemente avaliando os seus compromissos com a GAFI, quanto à proliferação de armas de destruição em massa.
A América Latina não está livre de atividades terroristas internacionais. Em julho de 2018, a Unidade de Informação Financeira da República Argentina (UIF-AR) expediu uma medida administrativa de congelamento de bens e dinheiro dos integrantes de uma suposta organização criminosa ligada ao Hezbollah, que estaria atuando na área conhecida como "tríplice fronteira", entre Argentina, Brasil e Paraguai. A UIF-AR reuniu elementos de evidência, sugerindo que esta organização criminosa poderia estar envolvida em ações de lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo. Esses indivíduos faziam parte de uma organização chamada "Clã BARAKAT", liderada por Assad Ahmad BARAKAT, que teria laços estreitos com a liderança do Hezbollah (UIF-AR: 2018).
Alertas do Reino Unido para Trinidad e Tobago incluíram cidadãos que faziam parte dos grupos de combate do ISIS na Síria e no Iraque (Reino Unido: 2021). Cuba também voltou à lista de países patrocinadores do terrorismo em janeiro de 2021, após ter sido removida em 2015 (DOS: 2021). As relações da Venezuela com o Irã são de grande preocupação para as autoridades dos Estados Unidos, já que o Irã é um dos países com o maior número de sanções emitidas por Washington e pelo Conselho de Segurança no que diz respeito à posse de armas de destruição em massa.
Bens de dupla utilização – Outra questão de grande interesse para a segurança internacional é a regulamentação da produção e do comércio de bens de dupla utilização. Esses são ativos tangíveis e intangíveis, que podem ser usados para fins civis, militares ou de proliferação de armas convencionais ou de destruição em massa (SE: 2011). Os ministérios da economia e/ou de comércio da maioria dos países se comprometeram com as mencionadas resoluções do UNSON, que também exigem que os Estados contribuam para o desarmamento, controle de armas e não proliferação. Por esse motivo, a maioria dos governos desenvolve mecanismos regulatórios, como cotas de exportação anteriores e manifestações de uso final. Os governos podem cancelar as licenças de exportação e sancionar as empresas que não cumpram todos os regulamentos.
Conclusão
Ações regulatórias e de sanção extremamente fortes reduziram significativamente a ameaça de armas e de destruição em massa ao longo dos anos. As instituições financeiras e empresas, especialmente aquelas ligadas à logística e ao comércio global, devem permanecer vigilantes para que nenhum grupo criminoso ou terrorista pretenda utilizá-las indiretamente para cumprir seus fins ilícitos. Embora superficialmente pareça complicado cumprir todas as diversas obrigações nacionais e internacionais, os acessos à tecnologia e aos dados corretos permitem uma diligência devida e simplificada, o conhecimento do cliente, o combate à lavagem de dinheiro e a triagem de listas de sanções. Isto porque, a realidade é que: a humanidade está em jogo.
Referências
Departamento do Tesouro (DOT-Department of the Treasury), Non Proliferation Sanctions. (Consulta em 18/07/2021: https://bit.ly/3ezKXdq).
Força-Tarefa de Ação Financeira (FATF), International Standards on Combating Money Laundering, Financing of Terrorism and Proliferation. (Atualização em 2020, veja: https://bit.ly/3wQXcZi) .
Escritório Contraterrorismo, Departamento de Estado (DOS), State Sponsors of Terrorism,United States, 2021. (Consulta em 20/07/2021: https://bit.ly/3wST8Ih).
Escritório Contra-Terrorismo do Conselho de Segurança da ONU, Chemical, Biological, Radiological and Nuclear Terrorism. (Consulta: 18/07/2021: https://bit.ly/3wN8Kgh) .
Secretaria de Economia (SE), "Acuerdo por el que se subject to the requirement of prior permission by the Secretaría de Economía la exportación de armas convencionales, sus partes y componentes, bienes de dual uso, software y tecnologías susceptible de desvío para la fabricación y proliferación de armas convencionales y destrucción masiva", Diario Oficial de la Federación, México, 16/06/2011. (Veja em: https://bit.ly/3itWYlN ).
Dr. Gary Ackerman e Sra. Michelle Jacome. (2018). “WMD Terrorism: The Once and Future Threat”, US National Defense University, Department of Defense, United States, PRISM Volume 7, no.3. (Consulta: https://cco.ndu.edu/News/Article/1507339/wmd-terrorism-the-once-and-future-threat/
Unidade de Informação Financeira da República Argentina (UIF-AR), Summary of the UIF-AR communiqué of July 13, 2018,Argentina, 2018. (Veja em: https://bit.ly/3kEQ0xk).