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A luta para desinformar e solapar

 

Por Deycon Silva (historiador) e

Flávio César Montebello Fabri (colaborador DefesaNet)

 

A obtenção de informações confiáveis sempre foi algo importante para qualquer nação ou organização. Compreender o que está ocorrendo em qualquer cenário e época (não exatamente da forma com que os fatos são expostos e por vezes “digeridos” por uma imensa maioria), o provável desenvolvimento destes mesmos cenários e objetivos (muitas vezes, escusos), sempre foi algo primordial para qualquer liderança. É fundamental para qualquer nação ou organização séria, tão como deveria ser para todas.

Exemplo de instituição dedicada a este mister? No Vaticano, a Santa Aliança, criada em 1566 pelo Papa Pio V e o Sodalitium Pianum (que em termos singelos, seria a contra-espionagem), criada por Pio X em 1913. Por sinal, é atribuído ao cardeal Luigi Poggi (que era conhecido como o “espião do Papa”, no caso, o sumo pontífice João Paulo II) a incisiva atuação provendo informações imprescindíveis para que um atentado, cujo alvo seria a primeira-ministra de Israel, Golda Meir, fosse desbaratado. Após a traumática ação do grupo terrorista Setembro Negro em Munique, durante os Jogos Olímpicos, temendo-se pela integridade da primeira-ministra que encontrar-se-ia com o Papa, coube ao padre Cario Jacobini efetuar a ligação entre a Santa Aliança e o Mossad.

Aproveitando, sugerimos, para quem não o fez, que assista ao formidável filme “Munique”, de 2005, dirigido por Steven Spielberg, que retrata o desenvolvimento da “Operação Ira de Deus”. O filme é baseado (parcialmente) no livro A Hora da Vingança, do jornalista canadense George Jonas (no Brasil, disponível pela Editora Record, edição de 1989). Por intermédio do filme, é possível ter uma idéia das ações de equipes Kidon (baioneta, em hebraico) do Mossad, uma das mais impressionantes agências (ou “Instituto”, como o próprio nome diz) do mundo, tão como ações (algumas desastradas), os custos políticos e humanos destas, tão como a imprescindível necessidade de informações para tomada de (duras) decisões. Consideramos,  também, um excelente investimento a leitura do livro A Santa Aliança – Cinco Séculos de Espionagem no Vaticano (de Eric Frattini,  Editora Boitempo, edição de 2009).

No decorrer de anos, é justo mencionar que DefesaNet já aborda, por intermédio de diversos artigos, não somente o tema Guerra Híbrida, como também a área de informações / análise. Em artigos anteriores já foram citadas outras obras, a exemplo do que fizemos agora, onde a necessidade de se buscar informações é demonstrada como imprescindível para a compreensão de cenários e ações, tão como constata-se sobre tal, registros na  própria Bíblia (sugerimos a leitura do artigo https://www.defesanet.com.br/ghbr/noticia/26484/Flavio-Fabri—Informacao-e-desinformacao–um-dos-aspectos-da-Guerra-Hibrida/).

Por outro lado, o livro Desinformação (do Tenente-General Ion Mihai Pacepa, Vide Editorial, 2015) deveria ser leitura obrigatória para todos que atuam na área de segurança pública. Desinformar, utilizando-se dos mais diversos subterfúgios, meios e técnicas foi praticamente uma “arma” utilizada em grande escala pelos soviéticos. Eram sabedores que, isoladamente,  provavelmente jamais ganhariam uma guerra com a desinformação. Mas causariam muitos, mas muitos estragos, solapamento de instituições, desgaste, constrangimentos, exposição com a finalidade de não somente denegrir ou desacreditar, mas de “quebrar a vontade” do oponente lutar ou de ao menos reagir. Por mais óbvio que pareça, obter e, por vezes, até divulgar (quando for tática ou estrategicamente interessante) informações fidedignas, conhecer a verdade, é tão importante como perceber, notar os objetivos (vontade de antagonistas) e combater a desinformação. Por curiosidade (sendo adequada a pesquisa sobre) dentro da STASI (Ministerium für Staatssicherheit – Ministério para Segurança do Estado, que foi a principal instituição de polícia secreta e de inteligência da República Democrática Alemã), havia uma divisão extremamente secreta e eficaz, a HVA (Hauptverwaltung Aufklärung) e, nela, a Divisão X, responsável pela desinformação e guerra psicológica.

Seus agentes coletavam informações (foco na República Federal da Alemanha) e as utilizavam para causar danos com seus vazamentos, efetuavam a divulgação de “conversas gravadas” que de fato nunca existiram, forneciam a jornalistas (ocidentais) documentos falsificados ou “depoimentos” montados (inventado a origem destes), criavam boatos, financiavam publicações, políticos ou grupos de esquerda, enfim, faziam de tudo para enfraquecer o “lado capitalista”.

Citamos o descrito anteriormente pois, atualmente, vivemos em uma época estranha. Bastante estranha.

Imagem a respeito de operação policial no Rio de Janeiro. Vídeo divulgado mostrou a tentativa de narcoterroristas de atingir a aeronave (fonte: O Globo)

Sabemos que, como organização de ESTADO (não de Governo), os militares estaduais (Polícias e Corpos de Bombeiros Militares) são imprescindíveis. Durante a pandemia Covid-19, foram os integrantes destas instituições, juntamente com os pertencentes à área de saúde, aqueles que ficaram expostos, permanecendo em sua rotina de trabalho e atuando para que houvesse ordem, segurança e um mínimo de normalidade durante um período de exceção (com imposições e restrições que NÃO foram oriundas das forças policiais, mas de quem possui a autoridade para tal, ordenamento que veio por parte de representantes do Poder Executivo e Judiciário).

Quando de decisões políticas/judiciais e seus diversos desdobramentos, são os militares estaduais, de forma majoritária, que respondem, infelizmente, pelo resultado dos atos alheios. Atos estes com suas conseqüências (ou inconseqüências). Por exemplo? Em caráter recente observamos a ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 635, protocolada pelo Partido Socialista Brasileiro no ano de 2019. Em 2020, a Suprema Corte sancionou praticamente todos os pedidos dos socialistas (que também contavam com o apoio, voz e aplausos de ONGs e outras entidades). A própria pandemia foi uma das “justificativas” para a ADPF 635. Conhecida como ADPF das Favelas, foi instaurada em novembro de 2019, sancionada em junho de 2020 (tendo parecer favorável da maioria dos ministros da Suprema Corte) impondo diversas restrições operacionais e deixando claro o recado de que era a polícia (e não os narcoterroristas, suas “tropas”, armas e “leis”) que representava risco aos moradores das comunidades.

Tal ação dificultou, de sobremaneira, a atuação das forças policiais em comunidades cariocas, comunidades que por sinal, em considerável parte, possuem características de área negada (black spots ou áreas não governadas). Na verdade, narcoterroristas impõe a sua vontade, as suas “leis” e os seus interesses nessas áreas que possuem pouca ou nenhuma influência do Estado. Como resultado tivemos criminosos de diversos Estados que migraram em busca de refúgio para as comunidades cariocas (a mídia especializada é rica na produção de informações para corroborar este posicionamento). Mas pelo visto, principalmente pela ADPF das Favelas, os narcoterroristas não deixaram seus negócios, suas armas não foram entregues para as autoridades e também não buscaram ofício lícito. Pelo contrário. A mídia demonstrou o considerável poder de fogo dos narcoterroristas que tentavam abater uma aeronave da polícia carioca poucos dias atrás.

 

O altíssimo preço pago pelos poucos que, fora dos gabinetes, são aqueles que tentam fazer com que a ordem impere, tão como a paz (fonte: site G1).

De qualquer forma mencionaremos (falando de uma forma extremamente singela, muito singela), sem nos atermos de uma forma mais técnica nas diversas gerações de guerras e (de um ponto de vista relativamente contemporâneo) sobre atores, quando da  opção puramente militar (guerra) para impor seus interesses, com ações para negar uso do mar (ou galgar seu controle), conquistar superioridade área e projetar poder sobre terra em relação aos seus oponentes, sem outros “componentes” utilizados de forma maciça, que ainda assim existem vários outros meios para bater em quem é considerado “inimigo”. Se não vencê-los, ao menos bater até o ponto de diminuir a vontade de lutar.

Não estamos falando de alguns meios materiais, somente (como as aeronaves remotamente pilotadas). A divulgação na mídia leiga e em diversas redes sociais do uso de “drones” em guerras, onde conforme definição de David Deptula (U.S. Air Force) que sua maior vantagem residiria em “permitir projetar poder sem projetar vulnerabilidade” (na verdade, impondo estragos ou causando baixas diretas sem, contudo, expor militares ou outros ativos de grande valor estratégico) não é o caso. A questão não é o uso desses meios. É algo mais antigo. A desinformação como arma. A desinformação e outros meios.

Vejamos em A Guerra Além dos Limites – Conjecturas Sobre a Guerra e a Tática na Era da Globalização  (Qiao Liang e Wang  Xiangsui, Edição PLA – People’s Liberation Army, Fevereiro de 1999):

 

Outras formas de operações de guerra não-militares

… podemos apontar um grande número de outros meios e métodos que podem ser utilizados para a execução de ‘Operações de Guerra Não-Militares’, alguns dos quais já existem …

Tais meios e métodos incluem: a guerra psicológica, (divulgação de rumores visando a intimidar um inimigo e neutralizar sua vontade), a guerra de contrabando (gerando confusão em mercados de consumo e atacando o ordenamento econômico), a guerra de mídia (manipulando o que as pessoas vêm e ouvem visando a influenciar a opinião pública), a guerra de drogas (obtendo elevados lucros ilegais de forma rápida, difundindo o desastre em outros países), a guerra em redes interativas (comprometendo o segredo e a identidade de pessoas, num tipo de guerra em relação à qual que é virtualmente impossível a proteção), a guerra tecnológica (criando monopólios através do estabelecimento de padrões independentes), a guerra de maquinação (criando uma falsa aparência de poder real aos olhos de um inimigo), a guerra de recursos (apoderando-se de riquezas através da pilhagem de estoques de recursos), a guerra de ajuda econômica (concedendo favores de forma ostensiva, encobrindo condicionantes secretas de controle), a guerra cultural (liderando e difundindo tendências culturais, de modo a cooptar aqueles que têm pontos de vista divergentes), a guerra de legislação internacional (aproveitando as ocasiões mais oportunas para interpor novas regras e normas de interesse particular), além de diversos outros tipos de guerra não-militar…”

Parece que, se pararmos para pensar (ou reparar com certa atenção), alguns de nós já percebemos no cotidiano alguma coisa similar com o descrito (e por nós destacado), no texto acima. De qualquer forma, ainda lemos, no que os autores (há mais de 20 anos) deixaram explícito:

 

“No que se refere à perspectiva das ambiências: a militar; a política; a diplomática; a econômica; a cultural; a religiosa; a psicológica; e da mídia; todas podem, freqüentemente, serem percebidas como meios. E as ambiências podem ainda ser subdivididas. Por exemplo, na ambiência militar, a estratégia, as táticas … as alianças militares … todos estes elementos constituem, sem sombra de dúvida, meios militares. E ainda que outros elementos como o auxilio econômico, as sanções comerciais, a mediação diplomática, a infiltração cultural, a propaganda da mídia, a formulação e implementação de regras internacionais, o emprego das resoluções das Nações Unidas, e assim por diante, pertençam a diferentes ambiências como as da política, da economia ou da diplomacia, os estadistas utilizam-nos, cada vez mais, como se fossem meios militares tradicionais.

Sob a perspectiva dos métodos, os métodos filosóficos, os métodos científicos e os métodos artísticos, todos são usados pela raça humana para produzir benefícios em seu proveito. No entanto, eles também podem ser utilizados como meios em uma guerra.”

 

Para neste momento, encerrarmos (ao menos temporariamente), citamos um artigo de DefesaNet, de 24 de junho de 2020: A quem interessa o fim da Polícia Militar, exatamente neste momento? (https://www.defesanet.com.br/pm/noticia/37266/A-quem-interessa-o-fim-da-Policia-Militar–exatamente-neste-momento-/ ).

Em época de acirrada disputa eleitoral (e mais que evidente polarização), um ponto tem chamado a atenção: a quantidade de atores que estão, continuamente, atacando o comando das Polícias Militares e a própria instituição. Se antes era a instituição em si, agora são seus oficiais. Inúmeros perfis em redes sociais atacam, de diversas formas, oficiais e comandantes.

Alguns ex-policiais (muitos demitidos ou expulsos) passaram não somente a “fiscalizar” ou “propor melhoras”, mas denegrir. Que a lei (e principalmente o cumprimento irrestrito de valores legais, éticos e morais), seja definitivamente para todos, da mesma forma que celebrar a virtude e a camaradagem, tão como a responsabilidade pelos próprios atos. Definitivamente para todos.

Claro que para alguns (que passaram a ofender oficiais e propor a desmilitarização da força), talvez, seja esquecida parte da “história” (a conduta que levou à exclusão) ou que ela passe a ter outra interpretação (favorável tão somente a quem a conta). Se certo ou errado, passam a ser “vítimas” e “paladinos da verdade”.  Se o sonho de determinada linha ideológica era fim desta força policial (militar), por outro foi dada voz, oportunidade e meios para que essa mensagem (contra a força policial e seus oficiais) fosse potencializada e encontrasse eco.

Época estranha onde, para alguns, a Bandeira do Brasil virou símbolo de uma liderança (e orientação) política. Posicionamentos, como o da reportagem, saltam aos olhos (fonte: site Veja)

 

De qualquer forma, vendo tudo o que a Polícia Militar e os Corpos de Bombeiros Militares fazem e já fizeram em prol à sociedade, por tudo que no passado recente presenciamos nas manifestações dos mais diversos cunhos ideológicos (alguns com o fulcro de clara desestabilização, inspirados em movimentos ocorridos no exterior), com atuação incisiva da força policial para que houvesse a manutenção da ordem, por qual motivo alguns, neste período, passaram a utilizar novamente a retórica de “desmilitarização”? Qual o objetivo que não é dito? Quem está por trás e com qual interesse, de forma específica? Mera coincidência? Talvez não.

Existem diversas formas de ações e narrativas que foram utilizadas com finalidades outras que não a imediatamente visível. A história já demonstrou isso.

A quem interessa desestabilizar, enfraquecer ou mesmo extinguir a Polícia Militar? 

Clique na imagem abaixo para baixar o texto em formato PDF

 

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