Gen Ex Maynard Marques de Santa Rosa¹
Por que planejar?
Planejar o futuro é um impositivo racional, não só para o indivíduo, mas, principalmente, para a coletividade como um todo.
O talento do povo brasileiro em improvisar é notório, sendo reconhecido por todas as correntes sociológicas. Segundo Sérgio Buarque de Holanda, foi graças ao processo de colonização português que a cultura da improvisação se consolidou como traço característico da personalidade nacional. Não obstante, a ciência da Administração veio demonstrar que as soluções improvisadas são mais caras, desperdiçam recursos e levam mais tempo para serem concluídas.
Planejar o futuro do Brasil é um imenso desafio à inteligência nacional, que não pode mais ser postergado, por constituir aspiração consensual. Como fazê-lo é uma questão inerente ao campo da estratégia. O planejamento, aplicado sistematicamente à administração pública, pode trazer significativa bonificação educativa ao aprimoramento cultural da sociedade.
Pensamento de Governo
O pensamento estratégico governamental implica considerações idealísticas que se traduzem em metas políticas, transcendendo os fatores objetivos normalmente considerados nas metodologias do planejamento de mercado. Sua interpretação gera incógnitas e incertezas acerca de aonde se quer chegar.
A chave da questão estratégica reside na definição do futuro que se deseja. Essa “visita ao futuro” pode ser visualizada com as técnicas de análise prospectiva, cujo produto é a descrição de um cenário. A caracterização dos cenários, de modo realista e objetivo, facilita a sua codificação. A partir desse direcionamento, levantam-se possibilidades, limitações e obstáculos a transpor. As opções devem partir das condições vigentes na conjuntura e incorporar as tendências de futuro.
Política e Estratégia
O método de planejamento tem como essência os conceitos de política e estratégia. A política pode ser sintetizada como a ciência e a arte de governar, o que abrange o universo das ideias. A estratégia, por sua vez, consiste em codificar as metas políticas, a fim de transformá-las em ação. Portanto, é a política que estabelece os fins, enquanto que a estratégia define os meios e o processo a ser utilizado para alcançá-los.
O desafio de um plano estratégico é a sua conversibilidade em diretriz de ação. Todo plano deve definir quem faz o que, como e quando. Para isso, deve ser formatado em duas partes: uma política e outra estratégica. O conceito político define o “que fazer”. O conceito estratégico deve discriminar o “como fazer”, isto é, traduzir os objetivos políticos em programas e projetos, inclusive metas, processos e recursos necessários.
Diretrizes Estratégicas de Governo
A centralização do planejamento estratégico no Centro de Governo caracteriza o método consagrado como “top-down”, recomendado pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico – OCDE.
Quando se criou o Ministério do Planejamento, em 1995, extinguiu-se a função da antiga SEPLAN-PR; os planos nacionais passaram a ser elaborados pelos ministérios, perdendo a vinculação com o orçamento federal. Na prática, a presidência da República delegou a um ministro de Estado a missão de planejar o futuro, reservando a si os assuntos da dialética política. A dificuldade desse ministro em impor aos seus pares as metas de longo prazo afetou o processo de planejamento, que terminou evoluindo para a configuração “bottom-up” em que hoje se encontra.
No modelo “bottom-up”, o Plano Plurianual – PPA, dispositivo criado pela Constituição Federal de 1988 para garantir a continuidade das metas de curto prazo, perdeu a sua eficácia, cedendo espaço para os planos setoriais de oportunidade, como o Plano de Aceleração do Crescimento – PAC.
Nivelado o planejamento, o Brasil perdeu o rumo. A administração errática do setor público passou a refletir-se, naturalmente, no desgaste da infraestrutura econômica, onerando o custo Brasil e impactando o crescimento do PIB.
Sistema de Planejamento Estratégico Brasileiro – SIPEB
O Sistema Integrado de Planejamento Estratégico Brasileiro – SIPEB, em fase de concepção, tem a finalidade de centralizar, novamente, o planejamento estratégico no Centro de Governo.
Evidentemente, a complexidade atual não mais permite a centralização total de programas, projetos e atividades, como no passado. Contudo, é possível uma centralização flexível, por meio de diretrizes estratégicas e de mecanismos de monitoração que assegurem a eficácia da transversalidade e garantam o seu cumprimento pelos órgãos setoriais responsáveis pela execução. Nesse contexto, o planejamento de longo prazo poderá ser retomado e o PPA poderá retornar ao Centro de Governo.
Conceito Estratégico
O conceito estratégico transcende o escopo de um simples plano de gestão, por perseguir uma intenção evolutiva no tempo. Deve definir o “que”, isto é, as metas previstas; o “quanto custa”, isto é, a quantificação dos projetos; e o “quando”, isto é, o cronograma de execução. Outros elementos necessários à operacionalização do plano, dificilmente, podem ser estimados nessa fase com razoável precisão.
As metas estratégicas podem ser genéricas ou específicas. Exemplo: “Revitalizar o programa espacial brasileiro” (genérica); “Ampliar a Base de Lançamentos de Alcântara” (específica). Contudo, devem ser sempre sinérgicas, isto é, dotadas de força gravitacional para atrair investimentos de outras fontes. (Sinergia é a capacidade de imbricar-se com outras atividades não necessariamente afins, permitindo alcançar, simultaneamente, metas não planejadas em áreas diversas, como bonificação).
Os planos estratégicos devem ser elaborados por grupos de trabalho qualificados.
Conclusão:
A construção do futuro é uma função inalienável do topo da administração pública. A erraticidade inerente aos nossos hábitos e costumes retarda o desenvolvimento nacional. Para avançar, o Brasil precisa planejar, superando o paradigma da improvisação.
¹Gen Ex Maynard Marques de Santa Rosa – Secretário Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República