Renata Mariz
Informações de inteligência do Sistema Penitenciário Federal às quais O GLOBO teve acesso apontam que o Primeiro Comando da Capital (PCC) ordenou a execução de oito servidores que trabalham em presídios administrados pela União. A ordem teria como alvo dois agentes de cada um dos quatros presídios federais até 30 de junho deste ano.
Nos últimos oito meses, três agentes federais foram assassinados por ordem de facções criminosas. Dois deles morreram há menos de 45 dias. Em alerta máximo, o Ministério da Justiça suspendeu as visitas por 30 dias nas quatro unidades prisionais federais.
A última morte, na quinta-feira passada, da psicóloga Melissa de Almeida Araújo, que trabalhava no presídio de Catanduvas (PR), levou o Ministério da Justiça a pisar no acelerador em mudanças definitivas para restringir o acesso dos visitantes aos estabelecimentos de segurança máxima. Por meio do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), a pasta estuda a melhor forma de alterar a legislação colocando a visita como um benefício no sistema carcerário federal, e não um direito garantido a todos.
Uma das ideias é modificar a legislação que estabelece os critérios de inclusão de presos nas unidades federais. Desta forma, não seria necessário mexer na Lei de Execuções Penais, aplicável a todos os detentos do país e mais difícil de ser modificada no Congresso. Para defender a mudança, o governo argumenta que a visita, especialmente a íntima, tem sido usada pelos criminosos trancafiados nos presídios federais para repassar ordens aos membros das facções — de negociações sobre drogas ao assassinato de agentes públicos.
O flagrante organizado recentemente pelo Sistema Penitenciário Federal em conjunto com a Polícia Federal na Operação Epístola é um dos exemplos. As autoridades filmaram o traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, detido em presídio federal, usando outro preso com direito à visita íntima para passar bilhetes com ordens à rede de tráfico e lavagem de dinheiro que ele administra.
A morte de Melissa, porém, foi o estopim para que o DEPEN buscasse um controle mais efetivo dos presídios no curto prazo. Servidora no sistema carcerário federal desde 2009, a psicóloga foi abordada na porta de casa, na última quinta-feira, ao buscar o filho de 11 meses na creche. Quatro homens desceram de um carro e acertaram o veículo.
O marido dela trocou tiros com os bandidos. Melissa correu para dentro de casa, tentou fechar a porta, mas não conseguiu. Os criminosos a mataram com disparos no rosto. Nada foi roubado. A criança não teve ferimentos e o viúvo está internado.
Se as circunstâncias do crime levavam à suspeita inicial de se tratar de execução premeditada, as investigações vêm corroborando a tese. As imagens do local dos disparos, os depoimentos colhidos de dois presos e informações de inteligência já identificaram de qual facção partiu a ordem.
Tudo leva a crer que a rotina de Melissa havia sido cuidadosamente estudada. Os criminosos não contavam com a presença do marido dela, que estava havia tempos fora de Cascavel (PR), onde a família morava, fazendo um curso da Polícia Civil. Dois criminosos foram mortos e dois, presos.
OUTROS CRIMES LIGADOS A FACÇÕES
Os outros dois casos com confirmação de participação de facções criminosas tiveram como alvo agentes penitenciários federais homens, que em geral trabalham na custódia dos presos. Cerca de um mês e meio antes do assassinato de Melissa, Henri Charle Gama e Silva estava em um bar próximo de casa, em Mossoró (RN), quando um veículo parou e o alvejou pelas costas.
Em setembro do ano passado, a vítima foi Alex Belarmino Almeida e Silva, executado dentro do próprio carro em Cascavel (PR), cidade onde os servidores do presídio de Catanduvas costumam morar. A Polícia Federal concluiu no inquérito, segundo o Ministério da Justiça, que Alex foi assassinado por ordem do PCC. Dois acusados da morte estão presos, aguardando julgamento.
Para Cíntia Rangel Assumpção, diretora do Sistema Penitenciário Federal do Ministério da Justiça, a morte dos agentes é um ato claro de intimidação do crime organizado.
— Essas ocorrências, além de serem verdadeiras tragédias para os familiares e colegas, nos deixam em total alerta. Hoje, o sistema penitenciário federal é o último elo do poder coercitivo do Estado no controle das organizações criminosas. Não podemos retroceder nisso — afirma Cíntia.
Desde que a carreira de agente federal de execução penal teve início, em 2006, com a abertura do primeiro presídio gerido pela União, 17 servidores morreram, sendo que sete foram assassinados. Nos casos de Melissa, Alex e Henri, a participação do crime organizado foi confirmada.
Em outras duas mortes, as vítimas estavam sendo roubadas, mas acabaram assassinadas ao serem identificadas.