Antes que o vazamento no campo de Frade, no Rio de Janeiro, explorado pela norte-americana Chevron, levantasse dúvidas sobre o preparo das autoridades brasileiras para gerenciar o setor petrolífero, a agência reguladora se posicionou: "O que aconteceu é indesejável e intolerável para o Brasil neste momento, em que pretendemos iniciar uma jornada muito grandiosa nessa próxima década com o Pré-Sal", pontuou Magda Chambriard, diretora da Agência Nacional de Petróleo (ANP).
Desde a descoberta do Pré-Sal, em 2007, a maior reserva de petróleo e gás do país, a Petrobras lançou-se numa corrida tecnológica para extrair o minério soterrado a até 7 mil metros de profundidade. As características geológicas dessa camada exigem um novo modelo exploratório, com tecnologias mais resistentes à corrosão, altas temperaturas e pressão, ainda em desenvolvimento em diversos laboratórios do país.
O Brasil nunca se perguntou publicamente se vale a pena buscar petróleo em águas tão profundas e expor a costa a uma catástrofe ambiental. "Os riscos do Pré-Sal não são diferentes dos de outros empreendimentos nessa área. Mais importante é o gerenciamento, o controle, o trabalho das agências reguladoras, que tem de ser feito de maneira imparcial e sem erros", opinou Martin Tygel, do Centro de Estudos de Petróleo, da Unicamp, em conversa com a DW Brasil.
A questão central não é tecnológica, mas política. "Para se evitar uma catástrofe ambiental, é preciso uma efetiva imparcialidade na maneira como esses problemas são tratados. E a falta de confiabilidade nas agências reguladoras é uma questão mundial, não só do Brasil. Olhe para o caso da BP, nos Estados Unidos. Ficou claro que o vazamento lá aconteceu também por falhas no monitoramento", critica.
Falta de confiança
Na opinião de Tygel, o setor petrolífero sofre com o que ele chama de "promiscuidade" entre as agências reguladoras e as empresas. E não se trata de uma questão localizada. "Não é algo em que o Brasil seja mais ou menos confiável. Não há confiabilidade em nenhuma parte do mundo", comenta, citando casos emblemáticos como o vazamento nuclear em Fukushima e desastre da Exxon Valdez.
Tecnicamente, acredita Tygel, o país tem capacidade para resolver os desafios da exploração do Pré-Sal. "O problema será se os grandes interesses envolvidos vão querer obter esse petróleo a qualquer preço, a qualquer custo, no menor prazo", completa.
A ANP quis usar o episódio da Chevron para alertar o resto do mundo sobre a gravidade da falha. A empresa norte-americana terá que pagar uma multa 150 milhões de reais, aplicada pelas autoridades brasileiras. "Esse caso servirá de exemplo para que não pairem dúvidas sobre a seriedade do Brasil em seus próximos passos nessa grandiosidade que será a exploração do Pré-Sal." A Chevron já apresentou um projeto para extrair petróleo desse reservatório, mas a ANP admite que a falha recente possa atrapalhar a empresa a obter a licença.
Em águas cada vez mais profundas
O Brasil clama para si o papel de liderança na corrida pela descoberta de reservas de petróleo em águas profundas: 33% das novas áreas identificadas nos últimos cinco anos estão em solo brasileiro. Desde o anúncio da existência do Pré-Sal, o setor está agitado com os lucros que essa fonte trará.
A reserva que abriga mais de 8 bilhões de barris numa extensão de 800 km está a cargo da Petrobras, a empresa de petróleo nacional. E a exploração já começou: segundo Almir Barbassa, diretor Financeiro e de Relações com Investidores, o Pré-Sal contribui com quase 10% da produção nacional atualmente. Ou seja, dos cerca de 2 milhões de barris de petróleo diários que a Petrobras produz, 180 mil vêm dessa reserva.
Procurada pela DW Brasil, a Petrobras preferiu não comentar o incidente que envolveu a Chevron, parceira da companhia em campos de exploração no Brasil. Sobre os riscos ambientais da exploração de petróleo em águas profundas, a empresa assegura que "todas as unidades marítimas de perfuração que trabalham para a Petrobras são equipadas com sistemas de detecção, que podem prover o fechamento imediato e automático do poço, prevenindo seu descontrole", discurso usado desde o acidente no Golfo do México, em abril de 2010.
"As capacidades de resposta dos planos de emergência da Petrobras foram dimensionadas considerando as hipóteses acidentais de pior caso, abrangendo todos os cenários onde ela opera e não somente os do Pré-Sal", diz a nota padrão.
Autora: Nádia Pontes
Revisão: Roselaine Wandscheer