Investimentos em programas navais estratégicos fortalecem a defesa do Brasil no mar
Por Primeiro-Tenente (RM2-T) Daniela Meireles – Brasília, DF
Mais de dois séculos se passaram desde que o Pavilhão Brasileiro foi erguido, pela primeira vez, no mastro de um navio de guerra. Se hoje a Esquadra do País conta com 99 meios navais, somados navios, submarinos e aeronaves, ela era formada por apenas seis naus quando foi criada, em 10 de novembro de 1822. Naquela época, o principal desafio era manter a integridade territorial do Brasil, após declarada sua independência. As missões, agora, são outras, mas a necessidade de uma Força Naval moderna e pronta para atuar permanece.
“A Esquadra Imperial nasceu e entrou em combate na Guerra da Independência, que a nossa história pouco realça, ficando a percepção corrente de que a Independência se ganhou no grito. Na verdade, somente São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais aderiram de imediato. O restante do País teve de ser compelido a fazê-lo, em uma guerra que durou mais de um ano”, enfatiza o Contra-Almirante Guilherme Mattos de Abreu, um dos organizadores do livro “Esquadra 200 anos: livro de quartos 1822-2022”, da editora Letras Marítimas.
Aquela bandeira, hasteada a bordo da Nau “Martim de Freitas”, rebatizada de “Pedro I”, primeiro navio Capitânia da Esquadra brasileira, simbolizava a sua criação, há exatos 201 anos. Na ocasião, o primeiro brasileiro nato a exercer o cargo de Ministro da Marinha, Capitão de Mar e Guerra Luís da Cunha Moreira, esforçou-se para organizar a Força Naval do País, incorporando navios portugueses abandonados nos portos nacionais, recuperados pelo Arsenal de Marinha da Corte, e contratando marinheiros europeus, desmobilizados ao fim das Guerras Napoleônicas.
Desde então, o Brasil pouco se envolveu em embates de tamanha proporção. Dentre as que se destacam, estão a Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870) e a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais (1914-1918 e 1939-1945), além da pouco conhecida Guerra da Lagosta (1961-1963), crise entre os governos do Brasil e da França, decorrente da pesca não autorizada a navios franceses, no mar territorial brasileiro. Embora a diplomacia seja a principal alternativa do País para a solução de conflitos, a Marinha e sua Esquadra continuam defendendo os interesses da Nação no mar.
Já questionava, em 1923, o Capitão de Mar e Guerra Lawrence M. Overstreet, da Marinha de Guerra norte-americana: “A diminuição dos armamentos navais diminuirá as probabilidades de guerra?”. Segundo o Comandante, cujo artigo foi reproduzido pela Revista Marítima Brasileira deste mês, a decisão dos Estados Unidos de desativar sua Marinha após a independência, em 1776, comprometeu a capacidade de o País proteger seus navios mercantes do ataque de piratas no Mediterrâneo e de franceses, durante as Guerras Napoleônicas.
“A Marinha já passou por problemas análogos ao exposto por Overstreet, considerando o grau de prontidão da Esquadra. Ela era exclusivamente oceânica quando começou a Guerra da Tríplice Aliança, uma campanha tipicamente fluvial, que exigiu uma rápida adaptação, com a obtenção de novos meios”, avalia o Contra-Almirante Guilherme Mattos, acrescentando que o Brasil viveu a mesma dificuldade durante as Guerras Mundiais, em razão da falta de recursos no período. “Apesar de os navios serem relativamente novos, já eram obsoletos em função da rápida evolução tecnológica”.
O Brasil aprendeu com o passado?
O País provisionou nos últimos dez anos, em média, o correspondente a 1,32% do Produto Interno Bruto (PIB) em Defesa, enquanto outros países em desenvolvimento seguem avançando, como a Índia (2,4%), a Colômbia (3%) e o Chile (1,8%).
Atualmente, tramita no Senado uma proposta de Emenda ao artigo 166 da Constituição Federal, que pretende estabelecer o orçamento anual mínimo de 2% do PIB para ações e serviços de Defesa Nacional. O documento condiciona 35% das despesas discricionárias do Ministério da Defesa, isto é, aquelas que não são obrigatórias, para o planejamento e execução de projetos estratégicos, priorizando a indústria nacional. Inclui, ainda, uma regra de transição, para que o valor aumente gradualmente até alcançar o seu patamar.
O texto da PEC, conforme apresentado pelo Senador Carlos Portinho, observa o incremento percentual gradual (0,1%/ano) e está em sintonia com o cenário geopolítico atual, que tem incentivado grandes e médias potências a elevarem seus investimentos para renovar seus sistemas de Defesa.
A PEC justifica a proposta com dados do Banco Mundial, que apontaram a média global de investimento com despesas militares, no ano passado, correspondente a 2,3% do PIB. Ela também compara os investimentos do Brasil com outros países da América Latina: “Assim, as despesas brasileiras no ano de 2022, consideradas em percentual do PIB, foram inferiores às do Peru (1,2%), da Bolívia (1,5%), do Chile (1,8%), do Uruguai (1,9%), do Equador (2,2%) e da Colômbia (3,0%)”.
“Uma visão imediatista pode encobrir ou atenuar a percepção de ameaças e seus riscos associados e influenciar a alocação de recursos em defesa, reduzindo essa prioridade. Essa realidade é perigosa e traz consequências graves. A presença de potências extrarregionais no entorno estratégico brasileiro deve ser motivo de preocupação para o Estado. A existência de cooperações e parcerias entre tais potências e países de nosso entorno geram a necessidade de constante avaliação do cenário geopolítico, incluindo, nessa análise, a própria capacidade de dissuasão da Força”, analisa o Comandante da Marinha, Almirante de Esquadra Marcos Sampaio Olsen.
Máquinas avante
Parte do investimento na defesa nacional tem como destino os programas estratégicos da Força Naval, que incluem a renovação dos meios da Esquadra. O Programa de Submarinos da Marinha (PROSUB), por exemplo, deu mais um importante passo na construção do primeiro Submarino Convencionalmente Armado com Propulsão Nuclear (SCPN) “Álvaro Alberto”. Em outubro, teve início a qualificação do estaleiro que ficará responsável por tirar o projeto do papel. Já a montagem do quarto submarino de propulsão diesel-elétrica – o “Angostura” – está em fase de finalização.Nos próximos anos, um dos desafios para a Força de Submarinos é preparar os militares que operarão o SCPN “Álvaro Alberto”. “Este desafio será proporcional como à primeira imersão a bordo do F 1 na Itália em 1913 onde brasileiros, liderados por nosso patrono o Capitão de Fragata Felinto Perry, iniciaram a nossa jornada”, afirma o Comandante da Força de Submarinos da Marinha, Contra-Almirante Manoel Luiz Pavão Barroso.
Este ano, a Marinha também deu o pontapé inicial para a construção dos navios-escolta do Programa Fragatas Classe “Tamandaré”. Pelo menos 30% da produção da primeira unidade é nacional e esse percentual deve aumentar, gradualmente, a partir da segunda, ampliando a independência científica e tecnológica do País. A previsão é de que as quatro novas Fragatas comecem a operar na Esquadra entre 2025 e 2029, fortalecendo o poder de dissuasão, a projeção de força e a negação do uso do mar sob jurisdição do Brasil , também conhecido como Amazônia Azul, contra os interesses nacionais.
Para potencializar o poder de fogo dos navios brasileiros, a Força Naval realizou, no primeiro semestre deste ano, mais um teste de qualificação do Míssil Antinavio Nacional de Superfície (MANSUP), que faz parte do programa homônimo e que deve equipar as Fragatas da Classe “Tamandaré”. É um armamento desenvolvido com 100% de tecnologia nacional, que pode atingir velocidade transônica – próxima à do som -, com alcance de cerca de 70 quilômetros, voo em altitude “seaskimming” – rente ao mar – e com operação sob quaisquer condições climáticas.
Em outra ação que busca ampliar as capacidades dos meios da Esquadra, a Marinha ativou, no ano passado, o 1º Esquadrão de Aeronaves Remotamente Pilotadas (EsqdQE-1), que conta com o modelo RQ-1 ScanEagle. Elas possuem sistema de comunicação integrado com um alcance de mais de 100 quilômetros, autonomia de voo de mais de 20 horas, velocidade máxima de 150km/h e são empregadas em missões de inteligência, vigilância e reconhecimento, inclusive noturnas.
“Esquadras de guerra não se evocam de improviso”
Os programas estratégicos que visam incrementar as capacidades navais, aeronavais e de Fuzileiros Navais da Esquadra têm em comum o desenvolvimento de longo prazo. O PROSUB foi criado em 2008, embora as ações da Força para desenvolver submarinos de propulsão nuclear tenham iniciado na década de 1970. O MANSUP começou a ser projetado em 2011, a viabilidade das aeronaves remotamente pilotadas foi estudada a partir de 2012 e o Programa de Fragatas da Classe “Tamandaré” foi concebido em 2017.
Eles demonstram a antecipação da Marinha às necessidades de defesa, praticando a máxima do jurista Ruy Barbosa, em sua obra “Cartas de Inglaterra”, de 1896: “Esquadras de guerra não se evocam de improviso, nem se atamancam entre apuros com invenções engenhosas de momento. Com os progressos atuais da artilharia, da mecânica e da construção naval, podemos estabelecer o axioma de que, para a guerra, só se aproveitam os navios especialmente construídos para combate”.
A Marinha não apenas está preocupada com a aquisição de novos meios, mas com a manutenção dos que já estão em atividade. É o caso do Navio-Aeródromo Multipropósito (NAM) “Atlântico”, o maior da Esquadra e seu Capitânia, que deverá receber novos hardwares e atualização de software, no Reino Unido. O gigante da Marinha também terá seu sistema de comando e controle otimizado até o final de 2024, com a instalação de um console adicional para este propósito, conforme previsão orçamentária.
Treinar como se estivesse em guerra
“O aprestamento e a modernização requerem planejamento apurado e fluxo financeiro para suportar os custos operacionais dos navios e os de preparação e treinamento das tripulações. Os desafios são diversos, pois demandam racionalização e priorização no uso dos recursos disponibilizados, além da aplicação eficiente, que possibilite atingir o objetivo de manter seus meios prontos a cumprir suas missões”, comenta o Comandante da Força de Superfície da Marinha, Contra-Almirante Rudicley Cantarin.
Enquanto isso, a participação da Esquadra em exercícios internacionais como “GUINEX”, “UNITAS” e “Fraterno”, realizados em conjunto com outras Marinhas, contribuem para manter o preparo constante de meios e militares e promover maior presença da MB no entorno estratégico brasileiro, além do estreitamento de laços com nações amigas, em apoio à política externa. Nessas ocasiões, são favorecidos o intercâmbio de informações e de conhecimento e a perspectiva de cooperação no combate a atividades ilícitas, como tráfico de armas, de drogas e de pessoas, pesca ilegal e crimes ambientais no Atlântico Sul.
São, ainda, oportunidades de treinamento entre os diferentes meios da própria Esquadra e com meios das demais Forças Armadas, aumentando sua integração. “Esse esforço é perene e exige detalhada coordenação entre diversos patamares do Poder Naval. Manter tripulações bem adestradas e atualizadas é crucial para a eficácia operacional”, avalia o Comandante da Força Aeronaval da Marinha, Contra-Almirante Emerson Gaio Roberto.
Principais comissões da Esquadra neste ano
Somente em 2023, os meios operativos participaram de diversas comissões no entorno estratégico brasileiro, como a “UNITAS LXIV”, exercício multinacional mais antigo do mundo, que aconteceu em julho e teve a Armada da Colômbia como anfitriã este ano; a “CAMEX Delta do Amazonas”, realizada em agosto, em proveito das ações de segurança da Cúpula da Amazônia; e a “Fraterno XXXVI”, no mesmo mês, cujo propósito foi ampliar a interoperabilidade e reforçar a cooperação com a Marinha da Argentina.
Houve, ainda, a “GUINEX III”, que incluiu treinamento no mar da costa ocidental do continente africano, com Marinhas africanas e europeias; a Operação “Abrigo pelo Mar”, que levou apoio médico e doações a moradores de São Sebastião (SP) atingidos pelas fortes chuvas em fevereiro; além da “ASPIRANTEX”, “ADEREX”, “TROPICALEX”, “UANFEX”, para preparo das tripulações e de meios, em todo o litoral do País.
Para quem acredita que não existem ameaças aos interesses do Brasil no mar atualmente, um incidente em maio deste ano prova o contrário. Durante uma Patrulha Naval, a Fragata “Independência” impediu que um navio de bandeira alemã coletasse amostras do subsolo marinho na região da Elevação de Rio Grande (RS), para fins de pesquisa científica. A região é de exploração exclusiva do Brasil, conforme Convenção das Nações Unidas sobre o Direito no Mar.
“Felizmente, a América do Sul constitui uma das regiões mais estáveis do mundo na história recente. No entanto, o continente e seu entorno são muito ricos, o que demanda atenção. Sendo o maior país e a maior economia da América Latina, é natural que a sua dimensão traga responsabilidades as quais não pode se furtar “, alerta o Contra-Almirante Guilherme Mattos, para quem o País deveria investir mais em defesa diante de tal cenário. “Não se pode aguardar a configuração de uma situação séria para se providenciar o preparo de uma Força Armada”, argumenta.
Leia, a seguir, entrevista com o Comandante em Chefe da Esquadra, Vice-Almirante Edgar Luiz Siqueira Barbosa:
– Quais os desafios para a Esquadra brasileira se manter aprestada e moderna?
Com o fim da Guerra Fria e a queda do Muro de Berlim, as sociedades ocidentais imaginaram que, finalmente, teriam um longo período de paz. Esses anos de tranquilidade foram responsáveis por propagar uma falsa percepção de que conflitos eram coisas do passado, restritos aos livros de história. Mostrava-se possível, portanto, rever os investimentos nas Forças Armadas, reduzindo a quantidade de pessoal, o inventário de meios e, por fim, suas capacidades combatentes. Infelizmente, essa percepção se mostrou errônea. A globalização possibilitou a proliferação das chamadas “novas ameaças”, tais como pirataria, crimes transnacionais e problemas ambientais. E, recentemente, o conflito entre Rússia e Ucrânia mostrou que os enfrentamentos entre Estados podem ocorrer, sempre que os interesses nacionais se mostram contrários. Nesse contexto, a Esquadra brasileira tem buscado desenvolver capacidades para atuar contra essas novas ameaças, mas sem perder sua vocação de realizar o combate no mar. Assim, buscamos assegurar os interesses nacionais sobre a rica e extensa área marítima de jurisdição nacional, com 5,7 milhões de quilômetros quadrados, uma outra Amazônia por suas dimensões e riquezas, a qual denominamos “Amazônia Azul”. Ao mesmo tempo, buscamos manter a capacidade de ser a primeira linha da defesa nacional, impedindo que eventuais forças navais adversas possam projetar poder sobre o litoral brasileiro. Este é um dos grandes desafios enfrentados pela Esquadra, atualmente. Obviamente, o desenvolvimento e a manutenção dessas capacidades demandam recursos financeiros de maior vulto, que sejam compatíveis com a estatura política e econômica que o Brasil se propõe a ocupar em nível mundial. Como vem alertando o Comandante da Marinha, a Força Naval pode perder 40% de seus navios em cinco anos, sendo necessários investimentos urgentes para garantir a soberania nacional.
– Atualmente, quais as ameaças ou possíveis ameaças enfrentadas pelo Brasil, que exigem uma Esquadra aprestada e moderna?
As riquezas do Brasil são alvo de cobiça internacional desde o seu descobrimento e, sempre que os interesses de potências estrangeiras forem inconciliáveis com os nacionais, nossa soberania pode ser ameaçada. Precisamos, portanto, de uma Esquadra que seja capaz de dissuadir intenções hostis contra o Brasil, forçando eventuais desafiantes a buscarem soluções negociadas, em detrimento daquelas que envolvam o uso da força. Hoje, quanto a inimigos estatais estrangeiros, vivemos um período de tranquilidade, mas essa situação pode ser alterada rapidamente em períodos de escassez. Além disso, em face à vocação marítima brasileira e ao elevado potencial de recursos vivos e não vivos existentes em nossa “Amazônia Azul”, a exploração e explotação não autorizada de nossas riquezas constitui-se em uma ameaça crível, que afeta nossa soberania, sendo materializada por crimes transfronteiriços em nossas áreas marítimas. Tais atividades englobam diversos tipos de ilícitos, tais como: pirataria, tráfico de armas, de drogas e de pessoas, pesca ilegal e crimes ambientais em nossas Águas Jurisdicionais, explicitando a necessidade de ampliação das capacidades de monitoramento, controle e pronta resposta por parte da Força Naval.
– Como a Marinha tem buscado a ampliação de suas capacidades, a renovação de alguns navios que já estão entrando na fase final de sua vida útil?
O estabelecimento da vida útil de um navio envolve diversas variáveis, podendo ser prolongado em função de períodos de manutenção e modernização. Portanto, embora disponham de um casco de construção antiga, o emprego de um navio pode ser estendido mediante a atualização de sistemas de propulsão e, mormente, dos sistemas de combate, com a substituição dos sensores e armamentos por outros no estado da arte.
A despeito da escassez de recursos, a Marinha vem buscando ampliar suas capacidades combatentes. Nesse sentido, destacam-se: o Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB), que entregou o Submarino Riachuelo, plenamente operacional e integrado à Esquadra, com previsão de entrega do Submarino Humaitá em janeiro de 2024 e mais outros dois nos próximos anos; e o início da construção das Fragatas Classe Tamandaré, que dotará a Esquadra de meios de superfície modernos e capazes, com entrega prevista para a partir de 2025. Além dessas duas importantes iniciativas, o Comandante da Marinha tem buscado apresentar as necessidades aos governantes brasileiros, buscando ampliar o volume de recursos financeiros alocados para a Força Naval, a fim de permitir o prosseguimento dos Programas Estratégicos e o seu respectivo reaparelhamento. Em paralelo, enquanto novos meios não são incorporados, a Esquadra vem buscando manter a plena capacidade de seus meios atuais, cumprindo um Sistema de Manutenção Planejada, realizando reparos de grande envergadura, dos quais se destacam o Período Geral de Manutenção da Fragata Defensora, concluído em 2022, e o da Corveta Barroso, cuja conclusão está prevista para o segundo semestre de 2024.
– A Esquadra possui meios suficientes para fazer frente às possíveis ameaças ao País?
Atualmente, nossa Esquadra possui um total de 97 meios, excetuando o Navio-Escola Brasil (U27) e o Navio Veleiro Cisne Branco (U20), dentre os quais são 19 navios de superfície, 3 submarinos e 75 aeronaves. Essa quantidade não se mostra suficiente para a Esquadra fazer frente às possíveis ameaças da atualidade, principalmente se essa análise for conjugada com as dimensões da nossa Amazônia Azul.
De forma complementar, é importante destacar que, além da quantidade de meios disponíveis, a atualização e a manutenção das capacidades embarcadas em cada navio, submarino e aeronave disponíveis devem ser adequadas para atender aos interesses estratégicos do País, constituindo um fator dissuasório frente as ameaças existentes.
– Nas redes sociais, vemos alguns comentários questionando a real necessidade de investir nas Forças Armadas, uma vez que a política externa do Brasil privilegia a diplomacia, e comparando às necessidades de outros setores, que seriam mais urgentes, segundo esses mesmos comentários. Por que o País deve investir na renovação e na quantidade de meios da sua Esquadra?
Um país com as dimensões territoriais e o tamanho da população do Brasil está destinado a ser protagonista no contexto das Nações. Nesse sentido, todas as expressões do Poder Nacional devem avançar juntas e balanceadas. A diplomacia, sem o suporte de um poder militar crível, mostra-se ineficiente, e as forças navais têm um papel tradicional no apoio à política externa, por intermédio da contribuição para o estabelecimento de parcerias estratégicas, fortalecimento da autoridade do Estado e para a projeção do país no cenário internacional. Além disso, o investimento na Esquadra aumenta a capacidade nacional em proteger suas riquezas, cuja correta exploração pode contribuir para atender outras demandas da sociedade. Ademais, a construção de meios navais gera empregos, diretos e indiretos, com impactos sociais importantes para o país. Estima-se que o programa estratégico das Fragatas Classe Tamandaré seja responsável pela criação de dois mil empregos diretos e seis mil indiretos. Por fim, destaca-se que os meios da Esquadra têm caráter dual, projetados para serem empregados em combate, mas podendo ser utilizados em atividades benignas, como o apoio às ações do Estado, como ocorre regularmente nos eventos de desastres ambientais e calamidades públicas, além das participações nas operações de Garantia da Lei e da Ordem.
– Qual a importância estratégica para o Brasil de construir no próprio País, com tecnologia nacional, os meios navais e aeronavais da sua Esquadra?
Em termos estratégicos, deixar de depender de tecnologia estrangeira significa ter a confiança de que, em um eventual conflito, manteríamos a plena capacidade de nossos sensores e armamentos, garantindo a exploração do nosso poder combatente no mais alto nível. Na guerra das Malvinas, por exemplo, o governo francês interrompeu o fornecimento de mísseis antinavio Exocet para a Marinha da Argentina, sua arma mais efetiva, interferindo diretamente no resultado do conflito. Além disso, o investimento em tecnologia nacional também torna as aquisições e manutenções menos onerosas, possibilitando retornos indiretos que poderiam ser reaplicados na Força ou em outros setores do governo. Nesse sentido, há estudos acadêmicos que comprovam que a cada R$ 1,00 investidos na indústria de Defesa, gera aproximadamente R$ 9,80 no Produto Interno Bruto (PIB). Por fim, o desenvolvimento de tecnologias nacionais para uso militar causa o efeito de “transbordamento”, possibilitando o desenvolvimento de capacidades importantes para o uso civil, por meio de tecnologias de uso dual.
– Quantos meios da Esquadra foram construídos, até o momento, no Brasil?
Vários meios da Esquadra foram construídos no Brasil: quatro Fragatas Classe Niterói, quatro Corvetas Classe Inhaúma, a Corveta Barroso, o Navio-Tanque Almirante Gastão Motta, e os Submarinos Tikuna e o Riachuelo.
Muito dificilmente um meio naval possui tecnologia 100% nacional. Contudo, a Marinha do Brasil vem envidando esforços para que a construção sempre busque incrementar o percentual de nacionalização e garantir a transferência de tecnologia. Busca-se, também, sempre que possível, que a construção ocorra no país, em parceria com um estaleiro local, como ocorre com os Submarinos Classe Riachuelo e as Fragatas Classe Tamandaré (FCT), para fomentar os empregos no próprio país.
– O que falta para que o País seja capaz de construir seus próprios meios navais e aeronavais, com tecnologia nacional?
O Brasil possui a capacidade de construir os seus meios navais, mas o caminho para aumentar o índice de nacionalização é fomentar a Base Industrial de Defesa (BID), fazendo com que estímulos adequados incentivem empresas nacionais a investirem no ramo da defesa e, assim, sermos capazes de abandonar a nossa dependência estrangeira nessa área estratégica de importância vital para o Estado brasileiro. Para tal, devemos buscar o alinhamento das diversas expressões de poder nacional, de forma a incorporar tecnologias com conteúdo nacional de uso dual, com perspectivas relevantes de geração e sustentação de empregos diretos e indiretos, permitindo que a sociedade brasileira perceba a importância de obter essa capacidade de maneira plena.
– Recentemente, representantes da Marinha do Brasil estiveram nos Emirados Árabes visitando o Grupo Edge, um dos maiores conglomerados de indústria de defesa do mundo, para conhecer novas tecnologias de armamentos e meios, incluindo as aeronaves remotamente pilotadas. Atualmente, o Brasil dispõe de uma unidade. Há previsão e, caso afirmativo, qual seria ela, para aquisição desse tipo de meio para a Esquadra brasileira?
A Esquadra possui seis Aeronaves Remotamente Pilotadas SARP-E RQ-1 “Scan Eagle”. A Diretoria de Aeronáutica da Marinha está desenvolvendo estudos para a aquisição e a implementação de outros modelos de SARP.
– Com relação ao desenvolvimento de armamentos dos meios navais e submarinos brasileiros, qual o seu atual estágio? Há previsão de modernizá-los e, caso afirmativo, de que forma?
Apesar da idade avançada de alguns meios, seus sistemas de armas têm apresentado desempenho satisfatório, como demonstrado em exercícios regulares de Lançamento de Armas. Em se tratando de desenvolvimentos de novos sistemas, destaca-se o projeto MANSUP, sob gerenciamento da Diretoria de Sistema de Armas da Marinha, que busca desenvolver um míssil de cruzeiro de longo alcance, a ser usado contra navios.
– Com relação à construção/aquisição de novos meios navais e aeronavais, há pessoal qualificado para operá-los? De que forma é feita essa qualificação?
Todos os projetos de construção/aquisição de meios navais e aeronavais contam com acordos para a capacitação das tripulações e mantenedores, e envolvem cursos e treinamentos pelos fabricantes e fornecedores dos equipamentos. No caso específico das Fragatas Classe Tamandaré, a MB já selecionou a primeira tripulação, mantenedores e instrutores e iniciará sua capacitação no início de 2024.
-Quais são as principais atividades ilícitas coibidas pela Esquadra?
Em abril deste ano, realizamos uma patrulha naval com a Fragata Independência e, nesta ação, foi determinado ao navio estrangeiro (de bandeira alemã) que cessasse as atividades de pesquisa no subsolo marinho na área da Elevação do Rio Grande, pois não tinha autorização do nosso Governo para realizar tal pesquisa. A aeronave orgânica embarcada na Fragata Independência foi também empregada, a fim de registrar imagens do dispositivo de pesquisa que iria ser usado para coletar as referidas amostras do subsolo marinho. Imediatamente, o navio estrangeiro encerrou suas atividades de pesquisa na Elevação do Rio Grande, uma região localizada há mais de 800 km da costa brasileira.
A participação em exercícios internacionais está alinhada à importância do Atlântico Sul como área prioritária em nosso entorno estratégico, sendo fundamental o controle do acesso marítimo ao Brasil e a presença ostensiva nesse espaço marítimo. Nesse sentido, a MB realizou a Operação GUINEX-III, entre 08 de agosto e 12 de outubro de 2023, com o objetivo de fortalecer as relações com as Marinhas dos países da costa ocidental da África, além de contribuir para a Segurança Marítima no Golfo da Guiné, que faz parte do nosso entorno estratégico. Essa operação também teve o objetivo de fortalecer a Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS), que é um fórum para promover a cooperação entre os países costeiros do Atlântico Sul. A Fragata Liberal visitou portos de países da costa ocidental africana, como São Tomé e Príncipe, Camarões, Nigéria, Costa do Marfim, Senegal e Cabo Verde. Contudo, também operou com Marinhas de Togo, Espanha e Portugal.
Fonte: Agência Marinha de Notícias