O jornal alemão Bild am Sonntag publicou uma reportagem neste domingo (19/08) sobre a suposta utilização do navio Oker para uma missão de espionagem no Mediterrâneo. O navio de apoio da frota alemã estaria equipado com instalações de espionagem avançada do Serviço Federal de Informações (BND, na sigla em alemão), com os quais seria possível coletar notícias no interior da Síria.
Estes dados, por sua vez, seriam transmitidos aos serviços parceiros dos americanos e britânicos, chegando, através destes, aos rebeldes sírios. Caso a informação do jornal esteja correta, o fato teria carga realmente explosiva. Pois, oficialmente, a Alemanha não está envolvida de forma alguma na guerra civil síria.
Diferença entre reconhecimento e espionagem
Seja como for, a palavra "navio espião" já está em todas as bocas. E a suspeita é compartilhada pelos oposicionistas dos partidos A Esquerda e Verdes. Na interpretação do ministério alemão da Defesa, o Oker e outros dois barcos seriam "unidades de reconhecimento, comunicação e alerta de longo alcance". O porta-voz do ministério, Stefan Paris, descreveu as manobras diante da costa síria como uma missão desarmada de reconhecimento, "como fazemos regularmente".
O barco, segundo o órgão governamental, vai operar até o final do ano. Sua missão condiz com suas habilidades, conforme Paris: "recolher informações". Ele, entretanto, não pode fornecer mais detalhes no que se refere a objetivos e resultados da operação. Também a Chancelaria Federal, responsável pelo serviço secreto BND, só emitiu comentários genéricos. O porta-voz de Angela Merkel, Steffen Seibert, afirmou que, "como sempre", não pode dar informações sobre operações do serviço de inteligência.
Controle parlamentar
Já o Grêmio de Controle Parlamentar (PKG, na sigla em alemão) do Bundestag seria uma exceção. "Caso haja perguntas dos parlamentares, o governo naturalmente fornecerá as informações devidas", garantiu Seibert. Esta observação é interessante, já que o governo alemão é obrigado por lei a informar o PKG.
O comitê, que se encontra secretamente, deve ser informado "amplamente sobre as atividades gerais" do BND e também sobre o Serviço de Contrainteligência Militar (MAD, na sigla em alemão) e o serviço interno de espionagem, o Departamento Federal de Proteção da Constituição (BfV, na sigla em alemão).
O deputado dos Verdes Hans-Christian Ströbele integra o PKG e se sentiu diversas vezes mal ou pouco informado pelo governo. Por isso, ele cogita convocar uma sessão especial do PKG por causa da operação do navio alemão no Mediterrâneo. Mas mesmo que isso aconteça, as informações fornecidas na reunião permanecerão secretas, já que os membros do PKG são obrigados a guardar sigilo.
Parceiros da Otan são informados
Embora as opiniões dos deputados geralmente sejam diferentes. Hans-Peter Uhl, assessor especializado em serviço secreto da bancada democrata-cristã, não vê qualquer "obrigação de informar" por parte do governo alemão no caso da missão do Oker na costa da Síria. Em entrevista à edição online do jornal Frankfurter Rundschau, Uhl opinou que "grampear" o regime de Assad faz parte das "atividades normais de inteligência". Mas se o BND vier a saber que o regime de Assad utiliza armas químicas ou que estas podem cair nas mãos dos rebeldes, a informação teria uma grande importância política, "e o Parlamento alemão teria de ser informado sobre isso", ressaltou o político.
Nesta segunda-feira (20/08), o presidente dos EUA, Barack Obama, ameaçou a Síria com uma ação militar, caso Assad utilize armas químicas ou biológicas. Ele alertou que, mesmo nos preparativos para uma tal utilização, a "linha vermelha" já teria sido ultrapassada. Os indícios decisivos podem, teoricamente, vir do BND. Caso o serviço secreto alemão obtenha tais informações, as repassaria aos EUA automaticamente. O porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert, também reconheceu na segunda-feira que considera "normal que informações sejam compartilhadas com os parceiros da Otan".
Lembranças da guerra no Iraque
Um caso similar, ocorrido durante a guerra do Iraque e divulgado em 2003, provocou grande discussão. Embora a Alemanha do então chanceler Gerhard Schröder não tenha se unido à aliança liderada pelos EUA contra o regime de Saddam Hussein, agentes do BND estavam em ação durante o bombardeio de Bagdá. Eles teriam fornecido aos Estados Unidos informações valiosas sobre os movimentos de tropas iraquianas. Críticos acusaram o governo de então de ter participado da guerra, contrariando sua retórica oficial e sendo responsável pela morte de civis.
Autor: Marcel Fürstenau (md)
Revisão: Francis França