Conheça histórias que fortalecem a presença feminina na área, de alunas até a vida profissional
Por Segundo-Tenente (RM2-T) Milena
Em uma rede social, Monique Silveira divide o seu dia a dia de manobras e atuação pela Marinha Mercante com os seus quase 200 mil seguidores. A partir de seu perfil, ela registra cada detalhe da sua rotina como Imediato de navio (segunda pessoa no comando), em operações de transporte de cargas, água e diesel para plataformas.
A profissional chega a revelar tudo sobre os benefícios da sua carreira: “Trabalho 28 dias, tenho 28 dias de folga, recebo horas extras marítimas, periculosidade, adicional noturno fixo, despesas de viagem, anuênio da empresa e todo esse somatório chega a 27 mil reais, além do vale-alimentação, seguro de vida e plano de saúde completo”, compartilha.
Assim como a piloto, outras mulheres seguem a mesma caminhada em busca da realização profissional e independência financeira. Esse sonho cruzou os mares e encantou a panamenha Jaasiel Ester Arena Mejía que saiu de seu país, na América Central, em 2020, para se matricular na Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante (EFOMM), no Rio de Janeiro (RJ).
A Instituição, além de ser voltada para jovens brasileiros, mantém um programa de intercâmbio com esse e outros países como Peru, Equador e República Dominicana, e forma Oficiais de Náutica e de Máquinas para a qualificação do trabalho em navios, plataformas e offshore.
Quando Ester, como gosta de ser chamada, descobriu a EFOMM por meio do Programa de Ensino Profissional Marítimo para Estrangeiros, ela estudava ciências e morava com a família, mas, aos 19 anos, começou a estudar português e decidiu viajar sozinha para encarar esse desafio no Brasil.
Hoje, aos 22 anos, ela recorda as muitas expectativas que carregava na bagagem, naquele momento: “Estudei muito e enfrentei desafios que foram além de um novo endereço, mas eu sempre quis atuar nessa área, porque o contato que temos com a realidade marítima nos portos do meu país é muito forte. Imaginei logo em ter uma qualificação melhor no exterior e, por isso, quis potencializar a minha carreira aqui no Brasil”.
Integrante da turma de 2022, ela é uma das quatro estrangeiras de uma turma de 138 alunos, juntamente com alunos do Paraguai, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde. Agora, no terceiro e último ano da especialização em Máquinas, ela vive a ansiedade para iniciar a fase de praticagem no ano que vem e sabe que o futuro da sua carreira está muito próximo.
“As práticas da Marinha Mercante proporcionam uma visão ampla ao aluno. Durante o curso, aprendemos todas as funções de bordo, desde a manutenção ao gerenciamento da praça de máquinas. Acredito muito no potencial petrolífero do Brasil e espero me formar uma Oficial de Máquinas de excelência”.
Ester deve permanecer por aqui durante todo o período de praticagem que, a depender da empresa escolhida por ela, pode ter um regime de um mês de trabalho para um mês de descanso ou de seis para seis meses. Ela concedeu essa entrevista durante os estudos e fez questão de reforçar a importância das mulheres pioneiras neste segmento: “Agradeço às mulheres que abriram esse caminho para que outras mulheres como eu possam trabalhar com o que amam e embarcar nos seus próprios sonhos”.
Sonho compartilhado
No mesmo oceano, em diferentes ondas. Apesar de ser da mesma turma da Ester, a maré que embala as realizações de Paula Marinho Cunha Francisco, de 21 anos, é outra: ela não vê a hora de se formar Oficial de Náutica.
Nascida em Vicente de Carvalho, bairro da Zona Oeste da capital fluminense, ela lembra que tudo começou quando ainda tinha 14 anos. Os pais sempre incentivaram o estudo para a área militar. “Eles pensavam no meu futuro e na minha estabilidade financeira. Com o passar do tempo, estudei para alguns concursos, mas me direcionei mesmo para a Marinha Mercante sem nem saber o que era a EFOMM ainda”, lembra.
Outro reforço vindo da família é a irmã mais velha, Mariana Cunha, Aspirante do terceiro ano da Escola Naval da Marinha do Brasil. Por coincidência, ambas estudaram e ingressaram em seus cursos no mesmo ano.
Na contagem regressiva para a formatura, que será em dezembro, Paula Marinho reconhece a própria evolução. “Quando entendi o que era trabalhar na Marinha Mercante, confirmei a minha vontade de seguir em frente. Além de a remuneração ser boa e existir oportunidade de um futuro promissor, eu já sei que quero ir para o ramo offshore e ficar 28 dias no mar e 28 em terra”, reforça a aluna de Náutica.
Proativa durante o curso, ela participa da Secretaria da Sociedade Acadêmica da Marinha Mercante, do Grêmio de Náutica, da equipe de natação da Escola e ainda escreve para o Jornal Pelicano, que divulga as ações da EFOMM para a sociedade.
Apesar de jovem, Paula Marinho já tem um olhar consistente sobre a sua presença e de outras mulheres em posições importantes dentro de uma embarcação ou plataforma: “Temos a oportunidade de explorar as habilidades em outros setores, apresentar a nossa liderança em novas áreas e contribuir com uma competência genuína para o universo mercante”.
Para a futura Oficial de Náutica, apesar de ser desafiadora, a presença feminina cada vez maior na Marinha Mercante tem um brilho especial, por inspirar outras mulheres a seguirem esta carreira.
“No futuro, me vejo empregada e realizada, mesmo sabendo que para chegar lá o período de praticagem não vai ser fácil. Enxergo sempre além, principalmente esse universo que o transporte de mercadorias e a área de petróleo e gás permitem, mesmo a sociedade usufruindo diariamente e não compreendendo muito bem do que se trata”, acrescenta Paula Marinho.
A formação e o futuro
Para além do olhar em direção a esse horizonte de novidades está a Marília Fernanda Alves da Costa. Aos 40 anos e Chefe de Máquinas, ela acumula 19 anos de formação e atua, sempre embarcada, no ramo da Indústria de Petróleo e Gás, pela empresa Equinor.
Ao contrário de quem ainda navega em busca de um sonho, Marília já alcançou o cargo máximo na sua profissão: “Lembro-me de ter feito uma passagem tranquila pela EFOMM, pois eu sempre soube o que queria. Hoje, sinto-me realizada e orgulhosa por ter alcançado essa função que eu desejei desde o início”.
Como Chefe de Máquinas e em um regime de trabalho de 14×14 dias, Marília Fernanda é responsável por gerir a equipe da seção de máquinas, além de planejar e coordenar as atividades específicas do setor para garantir a operação eficiente das máquinas e instalações.
Assim, todo o plano de manutenção de maquinário passa pela supervisão dela. Entre as missões, estão elevar a proteção e a performance dos equipamentos e assegurar o cumprimento da regulamentação das normas de segurança marítima e ambientais.
Embora seja um cenário desafiador, ela comemora: “As mulheres têm se destacado cada vez mais, mostrando bastante conhecimento técnico, habilidade, colaboração, proatividade e empatia. A área mercante só tem a ganhar com a força de trabalho feminina”, reforça a Chefe de Máquinas.
Mesmo diante de tanta evolução, Marília ainda percebe uma realidade de discriminação com a presença da mulher em cargos como esse. Apesar disso, ela diz focar no que realmente importa. “Independentemente dos obstáculos, eu, sinceramente, só vejo benefícios e a minha mensagem para as mulheres que querem ser ‘mercantes’ é que não desistam desse objetivo, o caminho é árduo, mas a carreira é muito promissora”, conclui Marília.
Sobre o curso e a EFOMM
A Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante é referência na qualificação e capacitação profissional de jovens, brasileiros e de outros países, para o exercício de atividades operacionais de embarcações mercantes, além de formar militares para a incorporação à Reserva da Marinha do Brasil, como Segundo-Tenente.
O ingresso é por meio de concurso, em que o candidato precisa ter concluído o ensino médio e optar pelo local de realização do curso, caso seja classificado. As atividades são desenvolvidas nos Centros de Instrução Almirante Graça Aranha (CIAGA), no Rio de Janeiro (RJ), e Almirante Braz de Aguiar (CIABA), em Belém (PA).
Para as duas opções de curso, Náutica ou Máquinas, os alunos estudam por três anos em regime de internato. Após a fase acadêmica, os alunos embarcam no estágio de praticarem por dois semestres.
Nesse contexto, a Comandante da 5ª Companhia de Alunos da Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante, no CIAGA, e única mulher no cargo, a Capitão-Tenente (T) Marcela de Sousa Costa Tavares, celebra o aumento do público feminino entre as vagas.
“Atualmente temos 23% do corpo de alunos formado por mulheres, número que vem crescendo gradualmente nos últimos três anos. Em uma profissão predominantemente masculina, encontrar mulheres em cargos de chefia, por exemplo, torna a profissão atrativa também para elas”.
Fonte: Agência Marinha de Notícias