Uma concorrência aberta pela Vale para a construção de embarcações fluviais, pacote estimado pelo mercado em US$ 300 milhões, está preocupando a indústria naval nacional, que teme perder a encomenda para China e Argentina. A empresa lançou licitação internacional para contratar 128 barcaças e 8 empurradores, comboios que vão operar na hidrovia Paraná-Paraguai. No meio empresarial e no governo circulam informações segundo as quais a Vale poderá contratar as embarcações com chineses e argentinos uma vez que as cotações dos estaleiros nacionais estão mais altas, na comparação com os estrangeiros, em função da taxa de câmbio e do preço doméstico do aço.
A Vale nega que tenha tomado decisão sobre o assunto. Consultada, a empresa disse, na terça-feira, que está fazendo apenas cotações e que não há definição em relação a novas encomendas. Ontem, ao ser perguntada novamente sobre o tema, a mineradora informou que ainda não concluiu as análises comerciais, etapa necessária para encaminhar as negociações com os estaleiros. Fontes do setor dizem, porém, que o processo avançou e que a Vale está prestes a tomar a decisão final.
O problema agora é preço e não prazo, como ocorreu em 2008, quando a empresa tentou encomendar a construção de navios de grande porte nos estaleiros nacionais e não conseguiu. Em agosto de 2008, a Vale assinou contrato com estaleiro chinês para construção de 12 navios de grande porte (400 mil toneladas cada um). A encomenda motivou polêmica e opôs o ex-presidente da mineradora Roger Agnelli com o setor naval e com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Agora o governo acompanha a situação.
Segundo fontes próximas às negociações, o governo teria feito gestões junto à siderurgia nacional para tentar redução de preços das chapas de aço vendidas aos estaleiros para construção das barcaças. A redução final no preço das barcaças nacionais, porém, teria sido muito pequena. Em nota, o presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), Ariovaldo Rocha, disse que a entidade defende a contratação, em estaleiros brasileiros, de todas as encomendas de embarcações necessárias às empresas nacionais, como a Vale, quem considerou um importante cliente do setor.
Rocha disse que a mineradora está recebendo embarcações para transporte fluvial construídas em estaleiro no Pará e que, portanto, existem no país as condições técnicas para que esses navios sejam construídos no Brasil. Ele reconheceu que o preço do aço e a valorização do real são fatores que reduzem a competitividade da construção naval brasileira e exigem atenção da política industrial do governo. O Valor apurou que na próxima semana a diretoria do Sinaval tem reunião prevista com o ministro do Desenvolvimento (Mdic), Fernando Pimentel.
Fabio Vasconcellos, diretor comercial do estaleiro Rio Maguari, do Pará, disse que o preço do aço naval no Brasil e o real valorizado, além do custo da mão de obra chinesa, deixam os estaleiros nacionais em desvantagem competitiva frente aos estaleiros chineses. Nessa concorrência, os argentinos também levam vantagem no quesito localização, uma vez que não vão ter o custo de transporte dos comboios para operar na hidrovia Paraná-Paraguai.
Vasconcellos afirmou que o Rio Maguari tem contrato em andamento com a Vale para a construção de 32 barcaças, que já se encontram na Argentina, e de dois empurradores fluviais, que estão sendo lançados hoje à água e devem ser entregues em 60 dias. A Vale afirmou que nos últimos dois anos encomendou 51 embarcações a estaleiros nacionais, entre rebocadores, comboios fluviais e catamarãs. O investimento nesse pacote, segundo a empresa, é de R$ 403,9 milhões.