Marcelo Monteiro
Um mistério de quase um século pode estar próximo de ser solucionado. Mergulhadores acreditam ter encontrado no último domingo o submarino alemão U-93, responsável pelo afundamento do navio brasileiro Macau, no episódio que resultou na entrada do Brasil na Primeira Guerra Mundial, em 1917. A informação foi divulgada nesta sexta-feira, 25, pelo jornal francês Ouest-France.
Em 18 de outubro de 1917, após torpedear o vapor brasileiro, o comandante do U-93, Helmuth Gerlach, exigiu que o capitão Saturnino Furtado de Mendonça e o taifeiro Arlindo Dias dos Santos subissem a bordo do submersível. Desde então, os dois brasileiros nunca mais foram vistos (leia texto abaixo).
O submarino foi encontrado a uma milha náutica de Penmarch, na costa francesa, a uma profundidade de 85 metros. A descoberta foi feita pela Expedição Scyllias. Curiosos sobre os comentários de pescadores locais, que diziam sempre enroscar suas linhas em algum objeto no fundo do mar em determinado ponto da costa, os mergulhadores decidiram investigar.
Em uma hora de mergulho, encontraram um submersível de aproximadamente 70 metros de extensão, com canhões na proa (aparentemente 105 milímetros) e na popa (88 milímetros), características idênticas às do U-93. Além disso, outras duas razões levaram os mergulhadores a acreditar que descobriram o submarino de Gerlach. Na I Guerra (1914/1918), apenas dois submarinos alemães – os chamados U-boots – operavam na região, o U-93 e o U-84. Já na II Guerra Mundial (1939/1945), nenhum submersível desapareceu na região.
Embora o U-84 e o U-93 tivessem caracterísicas similares, Yves Duffeil, especialista em submarinos de guerra e membro da expedição, foi taxativo ao garantir que o U-boot encontrado seria o de Gerlach. Segundo os mergulhadores, que permaneceram nas imediações do submersível por apenas 13 minutos, o quiosque (parte alta, onde ficavam os vigias na navegação submersa) está em boas condições. Além disso, a escotilha que dá acesso ao interior da embarcação está aberta.
– Será que os homens escaparam quando o submarino afundou ou ela (escotilha) abriu-se mais tarde? – questionou-se Jean-Louis Maurette, líder da expedição.
Em 29 de dezembro de 1917, dois meses após o torpedeamento do Macau, o U-93 partiu em sua última missão. Um mês depois, em janeiro de 1918, o submarino simplesmente desapareceu, com todos os 39 tripulantes, em um episódio cuja causa até hoje não foi esclarecida. A principal hipótese levantada pelo comando da Marinha alemã era de que a embarcação tenha colidido com uma mina nas águas do Canal da Mancha, em 15 de janeiro de 1918. Agora, a possível descoberta do U-93 em águas francesas pode dar uma nova – e definitiva – versão para o fato.
Sumiço de brasileiros nunca foi explicado
O chanceler Nilo Peçanha dedicou-se pessoalmente a buscar explicações junto aos alemães a respeito do sumiço dos tripulantes brasileiros. De outubro de 1917 a janeiro de 1918, dezenas de telegramas cruzaram o Atlântico, envolvendo o Itamaraty e a embaixada brasileira em Berna, além de órgãos e representações diplomáticos na Alemanha e na Bélgica.
Entre os sobreviventes do naufrágio, circulava o boato de que Saturnino teria matado Gerlach com um tiro de pistola, sendo fuzilado em seguida pelos marujos alemães, assim como o companheiro brasileiro. No Brasil, falava-se da conhecida valentia do capitão. Para muitos, ele não teria aceitado a agressão ao seu navio e reagido, o que poderia ter determinado o seu destino. Mas não havia testemunhas que apontassem qualquer direção. Apenas boatos.
Em 16 de janeiro de 1918, o Ministério Imperial da Marinha alemã informou o governo brasileiro que, de acordo com a documentação do U-93, Saturnino e Arlindo teriam subido a bordo do submarino e, mais tarde, sido deixados em seu próprio bote salva-vidas – os demais tripulantes do Macau já haviam se afastado do local em duas baleeiras. A versão alemã abriu margem à hipótese de que os brasileiros pudessem ter sido recolhidos por algum navio, que posteriormente tivesse sido afundado na zona de guerra.
Durante quatro mandatos presidenciais, o governo brasileiro pressionou a Alemanha – sem sucesso – para que fornecesse informações mais concretas sobre o caso. Mas Saturnino e Arlindo nunca foram encontrados e, tampouco, sabe-se se e como morreram.