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Câmara tenta anular decreto de Bolsonaro que cria Centro de Inteligência Nacional

 

Reportagem – Murilo Souza

Edição – Natalia Doederlein

 

Nova estrutura passa a valer a partir do próximo dia 17

Dois projetos em análise na Câmara dos Deputados anulam os efeitos do decreto presidencial (10.445/20) que modifica a estrutura organizacional da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) e cria o Centro de Inteligência Nacional.

Autor do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 351/20, o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) entende que nova estrutura da Abin corrompe a lógica dos serviços de inteligência e compromete a segurança nacional. "A alteração normativa permite transformar a Abin em mera unidade de investigação, em afronta ao seu verdadeiro propósito de produzir inteligência e de auxiliar no processo decisório do Estado’”, observa Molon.

Segundo o decreto, que entrará em vigor no dia 17 de agosto, caberá ao Centro de Inteligência Nacional planejar e executar o “enfrentamento de ameaças à segurança e à estabilidade do Estado e da sociedade”, e assessorar os órgãos públicos em “atividades e políticas de segurança pública" e de "identificação de ameaças decorrentes de atividades criminosas”. Para Molon, o texto pode abrir caminho para a perseguição de opositores políticos.

Treinamento de inteligência

O deputado critica ainda outra mudança trazida pelo decreto: a permissão para que a Escola de Inteligência ofereça treinamento especializado a qualquer pessoa indicada pelo Sistema Brasileiro de Inteligência (SBI) ou por parceiros da ABIN.

A norma anterior (Decreto 8.905/16) autorizava a capacitação apenas de servidores selecionados por concurso público.

Autor de proposta semelhante – Projeto de Decreto Legislativo 353/20 –, o deputado José Guimarães (PT-CE) lembra que as mudanças na estrutura da agência ocorrem pouco tempo após a nomeação de Alexandre Ramagem para o cargo de diretor-geral da Abin.

“Nenhuma mudança é em vão e o decreto presidencial que pretendemos anular dá ensejo a graves ilegalidades e a violações aos direitos fundamentais”, diz o deputado.

Guimarães recorda que, antes assumir a direção da Abin, Ramagem havia sido nomeado por Bolsonaro para o cargo de diretor-geral da Polícia Federal. A posse no cargo, entretanto, acabou suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

 

À época, o ministro Alexandre de Morais, do STF, considerou “viável a ocorrência de desvio de finalidade no ato de nomeação”, tendo como base investigações em andamento no Supremo que apontavam para tentativas de intervenção política na PF.

As investigações se baseavam em declarações do ex-ministro da Justiça Sérgio Moro ao pedir para deixar o governo no dia 24 de abril, exatamente dois dias após Bolsonaro afirmar, durante reunião ministerial, que se mantinha informado por meio de um sistema próprio de inteligência, revelando na ocasião, descontentamento com o trabalho de órgãos oficiais.

Relatórios contra opositores

Por fim, Molon, cita a possível relação entre a reestruturação da Abin e fatos recentes noticiados pela imprensa que dão conta de relatórios produzidos pelo Ministério da Justiça para monitorar servidores públicos e professores que integram o movimento antifascismo.

"Não seria exagero, nesse contexto, afirmar que a abertura do treinamento para não concursados pode despertar práticas já superadas, em que o recrutamento do órgão oficial de inteligência observava as diretrizes de um governo – e não do Estado – justamente para exercer o poder repressivo e autoritário sobre pessoas e situações”, diz Molon.

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