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Unasul vê ‘ameaça de ruptura democrática’ no Paraguai

A Unasul (União de Nações Sul-Americanas) enviará ainda nesta quinta-feira uma comissão de chanceleres ao Paraguai com o objetivo de ajudar a preservar a ordem democrática no país após a abertura de um processo de impeachment contra o presidente Fernando Lugo.

A missão se baseia em um protocolo da Unasul que dá aos seus membros a possibilidade de impor sanções a um país em caso "de ruptura ou ameaça de ruptura da ordem democrática", de acordo com o documento.
 

Um dos artigos prevê até mesmo o fechamento das fronteiras do Paraguai.

O protocolo foi citado pelo chanceler brasileiro Antonio Patriota após reunião extraordinária de líderes da Unasul reunidos no Rio de Janeiro por ocasião da Rio+20.

"Os presidentes consideram que os países da Unasul conquistaram com muito esforço a democracia e nesse sentido nós todos devemos ser defensores extremados da integridade democrática na América do Sul", disse Patriota.

O chanceler disse ainda que os líderes da Unasul "expressaram sua convicção de que se deve preservar a estabilidade e o pleno respeito à ordem democrática, observar o pleno cumprimento dos dispositivos constitucionais e assegurar o direito de defesa e ao devido processo."

Patriota e secretário-geral da Unasul, o venezuelano Alí Rodrigues, estão entre os membros da missão que se dirige ao Paraguai.

A situação política no país se deteriorou rapidamente após a morte, na última sexta-feira, de 18 pessoas, entre policiais e camponeses sem-terra, em um confronto em uma fazenda em Curuguaty, no Departamento (Estado) de Canindeyú, próximo à fronteira com o Paraná.

O episódio derrubou ministros do governo, como Carlos Filizzola (Interior), e agora ameaça o próprio Lugo.

Julgamento

Os deputados aprovaram a abertura do processo de impeachment por 73 votos contra um em uma votação relâmpago também transmitida pelas televisões paraguaias nesta quinta-feira.

No Paraguai, as regras para impeachment são diferentes das do Brasil, onde as duas casas do Congresso precisam aprovar a abertura do processo.

Segundo a imprensa paraguaia, ainda nesta quinta-feira um grupo de deputados deverá expôr as acusações contra o presidente em uma sessão extraordinária na Câmara.

Lugo e seu equipe terão então 18 horas para elaborar sua defesa. Ele deverá apresentá-la em uma sessão de apenas duas horas, marcada para o meio dia de sexta-feira no Senado paraguaio.

Em seguida, opositores devem apresentar supostas provas contra o mandatário e fazer alegações finais. A decisão final sobre o impeachment deve ocorrer a partir das 16h30 (17h30 de Brasiília). O Senado paraguaio é dominado por opositores de Lugo.

Reações

O anúncio do processo de impeachment surpreendeu o país a nove meses do fim do mandato de Lugo. As eleições presidenciais estão marcadas para abril de 2013, e a Constituição não permite a reeleição presidencial.

O presidente deu declarações em cadeia de TV desmentindo rumores de que pretenderia renunciar.

"Não renunciarei ao cargo para o qual fui eleito pelo voto popular. Não interromperei um processo democrático e me submeterei ao processo político, como mandam as leis paraguaias, com todas as suas consequências, como indica a Constituição paraguaia", afirmou o presidente.

Afirmou ainda que se submeterá ao julgamento e todas as suas consequências.

"A vontade popular expressada nas urnas em abril de 2008 (data da eleição de Lugo) está sendo alvo de ataques de misericórdia por parte de setores que sempre foram contra as mudanças e se opuseram a que o povo pudesse ser protagonista da sua democracia. O povo não esquecerá que se pretende interromper um processo democrático histórico a apenas nove meses das eleições gerais ", disse.

Lugo, um ex-bispo católico ligado a movimentos sociais, tornou-se em 2008 o primeiro presidente a quebrar a hegemonia de seis décadas do Partido Colorado no poder, incluindo os 35 anos do regime militar comandado por Alfredo Stroessner (1954-1989).

Moradores e comerciantes de Assunção temem que a situação política dê origem a protestos de rua como os desencadeados em 1999 pelo assassinato do vice-presidente Luis Maria Argana, do partido Colorado.

Surpresa

Ouvido pela BBC Brasil, o analista político e amigo de Lugo, Alfredo Boccia, que também é médico particular do presidente, disse que o pedido de impeachment surpreendeu a todos.

"Uma surpresa desagradável para o país, que vive um momento de recuperação econômica histórica e que vinha enfrentando seus piores problemas que são a pobreza e a desigualdade social", disse.

"Há comoção porque ninguém esperava uma ação assim. A maioria opositora no Congresso sempre foi um desafio para Lugo. mas ninguém sabe agora o que vai acontecer ", acrescentou.

Para Boccia, o Paraguai vive momentos de incerteza, mas a expectativa é de que o Senado decida sobre o afastamento do presidente nos próximos dias. Na opinião dele, como a oposição tem ampla maioria no Senado, o impeachment, se nada mudar, seria apenas uma formalidade.

Com pouco mais de 6 milhões de habitantes, o Paraguai tem uma trajetória política e economica marcada pelas incertezas e golpes militares. Segundo Boccia, a diferença é que desta vez o processo politico está previsto na Constituição.

A legislação prevê que o vice, Federico Franco, assuma o cargo caso seja aprovada a destituição do presidente. Franco é opositor de Lugo desde o rompimento da coalizão nos primeiros anos do governo.

Colaborou Márcia Carmo, de Buenos Aires

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