O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, iniciou nesta segunda-feira (03/06) sua segunda viagem oficial ao Reino Unido, em meio a várias crises políticas que afetam os governos dos dois lados do Atlântico.
Essas visitas oficiais ocorrem a convite da rainha Elizabeth 2ª, que toma a decisão após consultar o governo, e costumam ser grandes ocasiões repletas de cerimônias – como um desfile em carruagem pelas ruas de Londres e um banquete no Palácio de Buckingham – além de também serem usadas pelo governo britânico para fazer avançarem seus próprios interesses.
A situação política no Reino Unido faz com que a chegada de Trump ocorra em circunstâncias peculiares. Ao anunciar a visita em abril, a primeira-ministra britânica, Theresa May, disse se tratar de uma oportunidade para reforçar o relacionamento já próximo em áreas como o comércio, investimento, segurança e defesa, e discutir como reforçar ainda mais esses laços nos próximos anos.
A visita de três dias de duração ocorre no âmbito das comemorações do 75º aniversário do Dia D, quando as forças aliadas invadiram a Normandia ocupada na Segunda Guerra Mundial, iniciando o que se considera como o princípio do fim do domínio nazista na Europa.
Mas, desde o anúncio da visita, o impasse político em torno do Brexit se agravou com fracasso do governo de May ao tentar resolver a crise, e resultou no adiamento da saída do país da União Europeia (UE) de 29 de março para 31 de outubro. A poucos dias da chegada do ilustre visitante americano, ela acabaria anunciando que deixará o cargo dia 7 de junho, dois dias após Trump retornar a Washington.
"O significado da visita mudou desde que foi proposta e a data acertada", observa Matthew Cole, professor de história da Universidade de Birmingham. "O propósito inicial pode ter sido demonstrar apoio da maior economia do mundo ao Reino Unido após o país deixar a UE. Nada disso se materializou."
"Nesse vácuo de relevância, a imprevisibilidade do comportamento de Trump poderá se tornar muito importante – por exemplo, com quem ele manterá encontros privados? Será que se encontrará com [o líder do partido do Brexit] Nigel Farage ou [o conservador cotado para substituir May] Boris Johnson", questionou Cole.
No fim de semana, Trump, em entrevista ao tabloide britânico The Sun, manifestou apoio a Johnson como novo líder conservador e disse,que ele seria um "excelente" primeiro-ministro britânico. "Na verdade, eu estudei a coisa a sério, conheço os vários candidatos. Mas creio que Boris faria um trabalho bom. Creio que seria excelente. Gosto dele, sempre gostei dele", disse o americano, qualificando o ex-ministro do Exterior como um político "muito talentoso".
Após os protestos realizados na primeira passagem de Trump pelo país, os manifestantes prometem mobilizar novamente um grande número de pessoas no que chamaram de "atmosfera carnavalesca", inclusive com o retorno do boneco inflável gigante do "bebê Trump", que ficou bastante conhecido durante a primeira passagem do americano pelo país.
Shaista Aziz, integrante do grupo Stop Trump Coalition, diz que os protestos não são apenas em relação à presença do americano, mas cobrem uma variedade de temas como a negação à crise do clima, atribuição de culpa aos migrantes e refugiados, aumento do racismo aberto, retrocessos nos direitos das mulheres, ataques a transexuais e gays, entre outros.
A impopularidade da visita de Trump reforça a instabilidade do momento político atual nos dois lados da parceria transatlântica. Em seu país, Trump enfrenta diversas crises internas e é alvo de graves denúncias por parte oposição democrata, que o acusa de obstrução da Justiça. Questões como a disputa comercial com a China e as controversas políticas migratórias adotadas por Washington também deixam o presidente sob forte pressão.
No primeiro dia da visita oficial, Trump almoça com a família real no Palácio de Buckingham e mais tarde irá à abadia de Westminster para depositar uma coroa de flores no túmulo do soldado desconhecido. Mas tarde, o presidente e sua esposa tomarão parte no banquete de Estado.
Na terça-feira, Trump se encontrará com May e participará de um evento com empresários americanos e britânicos. No último dia de sua visita, o presidente tomará parte na cerimônia em homenagem ao Dia D na cidade de Portsmouth.
Apesar das honras com as quais o americano é recebido em Londres, a visita possui algumas anormalidades, como o presidente da Câmara Baixa do Parlamento, John Bercow, afirmando que se opõem "com veemência" a um discurso de Trump no Parlamento britânico – algo bastante habitual – em razão e suas posições racistas e sexistas.
Logo ao chegar em solo britânico, Trump recorreu ao Twitter para criticar o prefeito de Londres, Sadiq Khan, reavivando as animosidades entre ambos. No domingo, o prefeito publicou um artigo na imprensa comparando o americano aos ditadores dos anos 1930 e 1940.
Khan, um muçulmano filho de imigrantes paquistaneses, criticou Trump pelo "uso deliberado da xenofobia, racismo e alienação como tática eleitoral" e se disse contra o tratamento pomposo que o governo britânico dedica ao americano.
Trump rebateu, dizendo que o Khan é um "perdedor de marca maior" que fez um "trabalho horrível como prefeito de Londres", que fracassou ao combater o crime e o terrorismo na cidade. A assessoria do prefeito disse que "insultos infantis" não combinam com a postura de um presidente dos EUA.
Distância virou rotina na relação EUA-Alemanha
É sexta-feira, e as três bandeiras tremulam pacificamente ao vento, uma ao lado da outra, em frente ao gabinete da Chancelaria em Berlim: a americana, a alemã e a europeia. Até se poderia pensar que é como no passado na capital alemã, que foi durante décadas quase uma cidade americana. Mas as bandeiras dão a impressão errada: pouco ou nada é verdade na relação oficial teuto-americana.
O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, visitou 40 países desde que tomou posse. Ele ainda não tinha tido tempo até então para a Alemanha. Uma visita estava planejada para algumas semanas atrás. Mas Pompeu a cancelou porque havia viajado para o Iraque em cima da hora. Esta foi uma afronta à Alemanha, um aliado tão importante no passado – uma atitude impensável há alguns anos.
Claro, o tom agora foi diplomaticamente educado. A situação ainda não chegou ao ponto de o chefe da diplomacia americana adotar um tom provocativo, como faz constantemente o seu presidente. Soou quase como uma memória melancólica de tempos melhores quando o ministro do Exterior, Heiko Maas, a chanceler Angela Merkel e Pompeu invocaram valores comuns ou Pompeu falou do seu tempo como soldado americano na Alemanha.
Mas depois foi a vez dos conflitos: Irã, Síria, o gasoduto Nord Stream 2, o orçamento de defesa alemão, as relações com a China. E procura-se em vão um tema sobre o qual não haja disputa. Pior ainda, a impressão é de que a alienação se tornou rotina há muito tempo. Ambos os lados estão notavelmente ocupados, salientando, apenas, que estão em contato constante. Qualquer um que tenha que enfatizar isso tantas vezes não tem mais nada a oferecer no momento.
O que a chanceler realmente pensa sobre o atual governo americano, por exemplo, ela deixou claro em seu célebre discurso de Harvard no dia anterior. Foi um apelo apaixonado ao multilateralismo, à proteção do clima, à vitória dos fatos sobre as mentiras. Nem uma vez Donald Trump foi mencionado pelo nome. E, no entanto, apareceu em cada uma das frases da chanceler.
A relação transatlântica é atualmente apoiada por inúmeros contatos pessoais, pelo intercâmbio de negócios e de cultura. Mas os governos vivem em planetas diferentes.
E a cidade de Berlim mal notou que o secretário de Estado dos EUA estava de visita. Tais viagens costumavam ser um evento. Para o bem ou para o mal, sempre houve protestos. A visita de alguém de Washington nunca era tratada com indiferença. Agora, uma nuvem de silêncio paira sobre o quarteirão do governo em Berlim. A coisa só pode melhorar.