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Serviço militar obrigatório aumentaria segurança da Europa?

Após anos de aparente segurança com o fim da Guerra Fria, desde o início da invasão russa da Ucrânia, diversos países europeus consideram reinstituir o alistamento compulsório. Custo – também político – pode ser alto.

(DW) Em abril de 2023, o parlamento da Letônia reintroduziu o serviço militar compulsório, anulando a resolução de 2007 que abolira a obrigatoriedade. A medida se aplica aos homens entre 18 e 27 anos de idade – para as mulheres o alistamento permanece facultativo.

Paralelamente aos recrutas voluntários, a partir de 1º de janeiro de 2024 o número de convocados para o treinamento de 11 meses aumentará gradativamente, até o máximo de 7.800 por ano, em 2028. Desse modo, o país báltico pretende elevar seu contingente de 22 mil para 50 mil soldados.

Por sua vez, a vizinha Lituânia reinstituíra a obrigatoriedade já em 2015, a Suécia em 2017. E em países como a Alemanha e o Reino Unido discute-se se não é hora de também adotar a medida: assim como outras da Europa, suas Forças Armadas encontram dificuldade para recrutar o contingente necessário.

“O serviço militar obrigatório é uma grande promessa”, comenta Sophia Besch, da Fundação Carnegie pela Paz Internacional, sediada em Washington. “Ele parece proporcionar uma via para compor reservas militares, de que se precisa em caso de guerra.”

Guerra na Ucrânia foi mudança de paradigma

Remontando aos exércitos cidadãos da Revolução Francesa, na Europa pós-Guerra Fria o serviço militar universal parecia supérfluo. A partir de 24 de fevereiro 2022, contudo, quando a Rússia invadiu a Ucrânia em grande escala, o quadro mudou: as nações do continente temem um conflito direto e querem estar preparadas para tal.

“O argumento era que precisávamos de mais tecnologia e menos tropas profissionais, porém altamente equipadas. Acho que precisamos de ambas: mais tecnologia no campo de batalha e mais soldados. E é exatamente isso que a guerra na Ucrânia está nos mostrando”, afirma Besch.

O conflito provocado por Moscou é considerado uma guerra de exaustão. Centenas de milhares de soldados já foram mortos, e a Rússia continua enviando novos recrutas para o front, em parte quase sem treinamento militar. Isso demonstraria que, mesmo com a mobilização de drones e mísseis ultrassônicos, na guerra moderna a exigência de material humano segue alta.

O especialista em conflitos Vincenzo Bove, da Universidade de Warwick, no Reino Unido, contesta que o serviço militar universal seja a solução para a busca desesperada dos exércitos europeus por novos recrutas: “Na estratégia bélica moderna, é preciso armamento de alta tecnologia e também claro, soldados capazes de operá-lo.”

Para tal, contudo, não basta o período de treinamento obrigatório para os recrutas, inferior a um ano: “Fala-se de três, seis, nove meses, o que, a meu ver, não fornece as aptidões e conhecimentos fundamentais indispensáveis às unidades de combate das Forças Armadas”, explica Bove, ex-oficial da Marinha italiana treinado para o combate anti-submarinos.

O especialista em conflitos frisa um outro problema ainda mais fundamental do que as deficiências técnicas: “Quando se força gente jovem a servir as Forças Armadas contra a própria vontade, é claro que há um problema de falta de motivação, que se acumula à falta de treinamento e experiência.”

Custos altos, impacto para a democracia

Só soldados altamente motivados estão dispostos a colocar a vida em risco – possivelmente um fator decisivo para se vencer uma guerra: “Não vejo como, no fim das contas, realmente assegurar que os recrutas vão empregar as armas, lutar no campo de batalha e ter êxito”, questiona Bove.

Como exemplo, ele lembra a alta mortalidade entre os recrutas compulsórios do exército russo. E cita consultas segundo as quais grande parte dos jovens não estaria disposta a defender seu país a mão armada, mesmo no caso de uma agressão militar.

O especialista italiano aborda ainda um outro aspecto: o alto custo, não só financeiro, do recrutamento compulsório. Uma análise recente demonstrou que a reintrodução da medida custaria à Alemanha até 70 bilhões de euros por ano. Pois não só os treinadores, casernas e uniformes são caros: uma geração jovem que presta serviço militar em vez de trabalhar enfraquece a economia.

A estes somam-se os custos políticos, pois “quem é forçado a servir apresenta mais tarde menor confiança em relação às instituições”, aponta o ex-oficial da Marinha, que participou de um estudo científico sobre o tema. Seu temor é que a imposição do serviço militar universal possa, no futuro, também debilitar a democracia da Europa.

Como alternativa, Bove cita o modelo sueco, baseado no alistamento voluntário: entre todos os recrutas potenciais, só é convocado a servir quem demonstre alto grau de motivação nos numerosos testes. Desse modo, se dispõe de menos soldados, porém, cumulativamente, cria-se uma grande reserva militar qualificada.

Alistamento obrigatório segundo o modelo finlandês

Sophia Besch compartilha o receio de que o serviço militar compulsório impulsione os partidos extremistas europeus: “Se os políticos insistirem no alistamento contra a resistência interna, eles arriscam criar ‘eleitores monotemáticos'” – os que votam motivados por um único aspecto da agenda político-social. “Penso em especial nos grupos diretamente afetados pelo serviço militar, ou seja, os jovens e também seus pais.”

Na opinião da especialista da Fundação Carnegie, os Estados que consideram adotar o alistamento compulsório deveriam se orientar pelo exemplo da Finlândia: só tendo se filiado à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) em 2023, até então ela era inteiramente autônoma do ponto de vista militar.

“A Finlândia é uma espécie de padrão ouro, pois tem uma longa tradição de recrutamento para o serviço militar, que lhe permitiu formar uma reserva nacional realmente forte.” O ponto decisivo é a alta motivação dos finlandeses para servir as Forças Armadas e em seguida integrar a reserva: não se pode simplesmente pedir aos jovens para lutarem e possivelmente morrer pelo seu país.

“Primeiro é preciso fomentar essa disposição a servir e o senso de propósito, de que se tem algo pelo que vale a pena lutar. Não dá para impor isso de cima para baixo”. Portanto é de se esperar longos debates até que países europeus como a Alemanha revertam ao serviço militar obrigatório.

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