Ele foi sugerido para o Prêmio Nobel da Paz, tomou o lugar do presidente dos Estados Unidos no topo da lista das pessoas mais poderosas do mundo da revista Forbes e está de viagem marcada para visitar o papa – as coisas não têm sido tão ruins para o presidente russo, Vladimir Putin.
Para consolidar a nova posição da Rússia – de ator influente no Oriente Médio – Putin tem exercitado a diplomacia. Nesta segunda-feira (18/11), ele falou por telefone com o presidente sírio, Bashar al-Assad, e com o presidente iraniano, Hassan Rouhani. Dois dias depois, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, esteve em Moscou, e uma visita do primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, está prestes a ser acertada.
"Os russos estão desfrutando de um ressurgimento em todo o Oriente Médio", diz Jonathan Eyal, diretor do instituto britânico Royal United Services Institut, um centro de estudos de defesa e segurança. "Há uma grande frustração em relação aos americanos, especialmente no que se diz respeito às negociações com o Irã, as quais, na opinião de muitos árabes, estão indo contra seus próprios interesses."
"É claro que Putin aproveitou uma série de fatores, criando uma grande abertura para a Rússia", diz Leon Aron, diretor de estudos russos no American Enterprise Institute, um centro de estudos sobre relações internacionais.
Três vias: Síria, Egito e Irã
Entre esses fatores, o mais espetacular foi fechar o acordo sobre as armas químicas da Síria, quando Putin habilmente transformou um comentário espontâneo do secretário de Estado dos EUA, John Kerry, em salvação para seu aliado Assad. "Foi de tirar o chapéu", avalia Aron.
Enquanto isso, a Rússia está aproveitando o vácuo de influência no Egito, para onde os EUA pararam de mandar ajuda financeira depois que um golpe de Estado depôs o presidente Mohammed Morsi. Depois de um intervalo respeitoso, dois ministros russos, o do Exterior, Sergei Lavrov, e o da Defesa, Sergei Shoigu, visitaram o Cairo, na semana passada, para discutir um possível acordo, no qual a Rússia venderia sistemas de defesa antimísseis para os militares egípcios.
Além disso, a Rússia também está tirando proveito do inesperado progresso nas discussões sobre o programa nuclear iraniano. As negociações, que poderiam levar a um acordo de inspeções nucleares em troca do relaxamento de sanções, não estão agradando nem a Israel nem à Arábia Saudita.
"Há uma clara discordância entre os membros da coalizão que apoiaram as sanções ao Irã", diz Aron. "Os franceses querem mantê-las, e é improvável que o Congresso dos EUA vá relaxar qualquer tipo de sanção. Então, os EUA estão novamente enfraquecidos, e, para Putin, a definição da Rússia como uma grande potência se dá em oposição aos EUA."
Poder russo ou fraqueza americana?
O especialista em assuntos russos Stephen Sestanovich, do Council of Foreign Relations, um centro de estudos dos EUA, diz que a visão de Putin é compartilhada por muitos americanos. "A grande maioria tem um sentimento negativo em relação a Putin: ele é considerado um símbolo antiamericano", afirma. "Este ponto de vista, obviamente, amplia suas conquistas: quando ele consegue o que quer, isso é visto como uma derrota americana."
Por outro lado, a política externa de Putin está sujeita a pressões inerentes à sua natureza. A visita de Netanyahu ao Kremlin foi uma tentativa desesperada de impedir um acordo internacional com o Irã. Mas a Rússia, como um membro do grupo P5+1, que conduz essas delicadas negociações, não deve ameaçar a possibilidade de um acordo, especialmente depois que Putin disse a seu colega iraniano, nesta segunda-feira, que "surgiu uma oportunidade real de encontrar uma solução para esse problema de longa data".
A especialista Lilia Shevtsova, do Carnegie Moscow Center, lembra que a política externa da Rússia é paralisada também por outros motivos. "Moscou não tem recursos suficientes ou capacidades diplomáticas para manter este ritmo", comenta.
Ela lembra ainda que Putin, assim como o presidente dos EUA, Barack Obama, tem que lidar com preocupações domésticas. "Para Putin, a política externa é apenas um meio para assegurar seu próprio poder", diz. "Muita gente não apoia sua política interna, mas apoia a crescente importância da Rússia no cenário internacional. A Rússia está afundando numa crise e está tentando compensar isso com atividades internacionais. E, por coincidência, isso está acontecendo exatamente quando o Ocidente passa por dificuldades."
Ela afirma que o sucesso do acordo sobre as armas químicas da Síria serviu para esconder outros problemas que Putin está enfrentando. "De uma maneira geral, os americanos tendem a superestimar a habilidade de Putin", diz. "Em muitos aspectos, a política externa dele fracassou – afastando os seus vizinhos europeus, assim como os principais governos do Oriente Médio e os EUA. Se Putin conseguir de fato restabelecer uma relação segura com o Egito, seria impressionante."
Tudo pode mudar
Há ainda bons motivos para acreditar que essa atitude mais "moderada" de Washington em relação ao Oriente Médio não deva durar muito tempo. No mais tardar, deverá mudar em 2016, quando Obama deixar o cargo. "A política dos EUA é muito personalizada", diz Eyal.
Além disso, Eyal também discorda da opinião generalizada de que os EUA estão em um declínio de longo prazo. "Se você considerar a quantia que os americanos gastam com defesa, por exemplo, fica claro que eles têm a maior capacidade militar do mundo, e continuará sendo assim pelas próximas décadas."
A ideia de que os EUA vão ignorar o Oriente Médio não faz sentido, afirma. Ele cita cita três motivos importantes: a sobrevivência de Israel é uma questão "pessoal" para os EUA, a necessidade de garantir recursos energéticos para a economia mundial – mesmo que os EUA sejam menos dependente dos recursos fósseis da região – e, em terceiro lugar, o fato de que a proliferação de armas de destruição em massa e de extremistas islâmicos continua sendo uma ameaça à segurança do país.
Tudo isso, claro, não impede Putin de desfrutar o seu atual momento de glória diplomática – dure o quanto durar.