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Presidente afegão desafia Obama e põe em risco pacto de segurança com EUA

É um jogo arriscado, e as apostas dificilmente poderiam ser mais altas. O Afeganistão perderia bilhões de dólares em ajuda militar e econômica, enquanto os Estados Unidos se arriscariam a deixar o país no caos, depois de gastarem 12 anos e perderem 2.300 vidas no campo de batalha.

Nos últimos meses, a relação entre EUA e Afeganistão, que já vinha se deteriorando durante a gestão do presidente Barack Obama, descambou para um jogo político arriscado em torno do Tratado Bilateral de Segurança (BSA, na sigla em inglês). O pacto é destinado a estabelecer os termos da parceria entre os dois países para os próximos dez anos.

As negociações sobre o documento chegaram ao ápice na segunda-feira (25/11), durante a visita a Cabul da assessora para Segurança Nacional dos EUA, Susan Rice. Na ocasião, o presidente do Afeganistão, Hamid Karzai, se recusou a assinar a BSA. Com a decisão, ele desafia não só os EUA, mas também a Loya Jirga. A assembleia afegã de sábios e chefes tribais aprovou o pacto no domingo e pediu que Karzai assine o acordo até o fim do ano.
 

Sem opção

Em resposta, Rice afirmou que, a menos que Karzai assine o acordo até 31 de dezembro, os EUA não teriam escolha senão invocar a "opção zero" − a retirada completa das tropas depois de 2014. A postura de Karzai irritou a Casa Branca e também muitos afegãos.

"Ele está disputando uma queda de braço, esperando que os americanos se dobrem antes dele", avalia Stephen Biddle, analista de política de defesa no think tank Council on Foreign Relations. "E todo o problema é que ambos os lados podem perder com isso. Uma retirada total dos americanos não é nem do interesse do Afeganistão, nem dos EUA ou da Otan."

A retirada do Iraque em 2011 estabeleceu um precedente sombrio, fazendo o país mergulhar na violência sectária. Michael Keating, especialista em Afeganistão da Chatham House, no Reino Unido, diz que o jogo político de Karzai só está prejudicando os interesses afegãos.

"Para a maioria dos afegãos, o maior problema no momento é a incerteza e o que está prolongando tal incerteza", opina. "Se, por qualquer razão, a BSA não acontecer, então o apoio político em Washington para subsidiar o Estado afegão será, possivelmente, enfraquecido ou mesmo desaparecerá por completo. O orçamento nacional do Afeganistão é, em 90%, dependente de auxílio externo, na forma de ajuda ao desenvolvimento. De modo que isso é um assunto muito sério."

Jogando com o tempo

Ao mesmo tempo, o prazo fixado pelos EUA intensificou a tensão − alguns argumentam que desnecessariamente. Biddle acredita que há uma boa razão para os EUA quererem uma decisão rápida. "Retiradas de tropas levam tempo para serem planejadas", observa. "Você não pode esperar que 60 mil soldados americanos arrumem as malas e desapareçam de um dia para o outro."
 

Karzai, aparentemente, quer que a decisão seja adiada para o período posterior à eleição do próximo ano, que vai escolher seu sucessor. "Embora ela esteja planejada para abril, não há uma garantia de que um novo governo seja empossado em seguida", alerta Keating. "A eleição pode ser impugnada e, então, pode haver um atraso de até 10 meses.".

Em segundo lugar, um atraso pode significar que a BSA se tornaria um dos temas de campanha na eleição. "As eleições são um curinga de qualquer maneira", compara Biddle. "Mas estará criando uma situação onde políticos marginais afegãos favoráveis à retirada dos EUA ganhariam de presente um meio de barganhar por influência com outros políticos afegãos mais ortodoxos. Se o tema da presença dos EUA ainda estiver indefinido em abril, pode servir para um ou outro político marginal tentar pressionar políticos que favorecem a presença dos EUA."

Novas recomendações

O conselho da Loya Jirga para que Karzai assine o acordo com os EUA antes do fim do ano era, entretanto, apenas uma das 31 novas recomendações que a assembleia propôs que sejam incluídas no BSA. Elas incluem uma série de preocupações afegãs, como permitir que observadores afegãos participem em julgamentos de militares americanos; proibir práticas religiosas cristãs em bases militares dos EUA; proibir incursões em domicílios afegãos por forças americanas; e a libertação dos presos restantes em Guantánamo.

"Essas preocupações são legítimas", reconhece Keating. "Mas não acho que sejam as questões mais importantes. A questão fundamental é se Karzai assinará o BSA. Eu não estou menosprezando esses problemas, eles estão falando sério, mas eu acho que sejam esses os problemas que impedem uma assinatura."
 

Especulações

Há também especulações de que o plano de Karzai para atrasar o acordo não é somente uma tentativa de conseguir dos EUA mais concessões. Biddle acredita que o presidente afegão está lutando para manter sua importância política. "Manter essa negociação em aberto é uma maneira de se manter influente. Além disso, ele gostaria que outra pessoa fosse rotulada como aquela que possibilitou uma presença estrangeira de longo prazo no Afeganistão. E, por último, eu não ficaria surpreso se parte do que ele está fazendo agora for resultado de sua frustração pessoal com a administração americana."

"Ao fazer isso, ele mantém muitas cartas nas mãos", ressalta Keating. "Incluindo a escolha do próximo presidente. Quem quer que receba sua bênção terá muito boa chance de vencer."

Em entrevista na quarta-feira para a rádio Free Europe, Karzai pareceu suavizar um pouco sua postura. Ele disse que assinará o acordo se os EUA atenderem aos pedidos para que não haja mais invasões de casas afegãs e ajudarem no reinício das negociações de paz – embora pareça ter dado um pequeno passo para trás em sua exigência de que Washington garanta eleições presidenciais livres e justas, em abril. Apesar de tudo, Karzai ainda se recusa a assinar o acordo antes do prazo.

 

 

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