As eleições em Taiwan chamam a atenção do mundo. O interesse não é pela democracia local, mas sim devido às permanentes ameaças da China.
(swissinfo.ch) Nos últimos 30 anos, Taiwan deixou de ser uma ditadura militar anticomunista para se transformar em uma democracia exemplar. A paz e a prosperidade reinam na 16ª maior potência econômica do mundo (Suíça está em 20º lugar).
O futuro de Taiwan é considerado decisivo frente às pressões chinesas. Mas por quê? O que Taiwan pode fazer a respeito? E qual é o significado ideológico de Taiwan para o Ocidente?
swissinfo.ch explica as questões mais importantes sobre o país com ajuda de Simona Grano, sinologista da Universidade de Zurique, e do cientista político Ho-fung Hung, da Universidade Johns Hopkins (EUA).
Importância de Taiwan
Um motivo importante tem quatro letras: “TSMC”. A abreviação significa “Taiwan Semiconductor Manufacturing Company”, com sede em Hsinchu.
É lá que uma grande parte dos semicondutores utilizados em telefones celulares, laptops, carros, geladeiras, televisores e sistemas de armas digitais utilizados no mundo inteiro são fabricados.
“Além disso Taiwan também tem uma importância geoestratégica como centro das cadeias de suprimentos globais e das rotas comerciais marítimas”, afirma Grano. Para a pesquisadora, a independência do país é, portanto, de importância central para a “estabilidade global”.
Por que a China reivindica Taiwan?
A postura hostil de Pequim remonta à guerra civil chinesa de 1949. Naquela época, os comunistas sob o comando do revolucionário chinês Mao Tsé-Tung derrotaram os nacionalistas do general Chiang Kai-Shek. Após a derrota, ele fugiu para a ilha de Taiwan junto com mais de dois milhões de chineses, que antes foi controlada por potências coloniais como Portugal, Holanda e, finalmente, Japão.
O partido nacionalista de Chiang Kai-Shek governou Taiwan como uma ditadura por 40 anos e reivindicava toda o território chinês. Desde que o primeiro partido de oposição foi reconhecido em 1987, Taiwan se transformou em um modelo democrático. “Em nenhum momento da história Taiwan fez parte da República Popular da China, que foi fundada em 1949”, explica Hung.
No entanto, o governo chinês sustenta que “Taiwan é uma província renegada”, que deve ser “reunificada à pátria pela força, se necessário”, como enfatizou o presidente Xi Jinping em seu discurso de Ano Novo de 2024. Devido ao veto chinês, Taiwan não está representada na ONU atualmente. Parte da política da China é não manter relações diplomáticas com países que reconhecem a independência de Taiwan.
A lista de países que reconhecem oficialmente Taiwan é, portanto, pequena: Apenas 12, dentre eles Guatemala, Haiti e o Vaticano.
A Suíça também não reconhece formalmente Taiwan. “O país adota uma política de uma só China e não reconhece Taiwan como um estado independente”, afirma o Ministério suíço das Relações Exteriores (EDA, na sigla em alemão).
Como se armar contra a China?
Idealmente, o país tem um trunfo. “Ideologicamente, Taiwan é importante porque contradiz a afirmação da China de que os valores ocidentais e a democracia são incompatíveis com a cultura chinesa e os valores locais”, acrescenta Grano.
Essas conquistas são um consenso em Taiwan atualmente, como explica Hung: “Apesar das diferentes atitudes políticas em relação à China, os participantes mais importantes da política interna de Taiwan concordam em uma questão: todos querem manter e defender os direitos humanos pelos quais lutaram nos últimos anos e a sociedade democrática independente.”
Mas o que a coesão social pode alcançar quando confrontada com um grande exército? Está claro que Taiwan pode fazer pouco para combater seu vizinho muito maior no caso de uma escalada.
No entanto, o governo está fazendo muito para aumentar o preço de um ataque chinês. Por exemplo, o serviço militar obrigatório passou de quatro para doze meses a partir de 1º de janeiro de 2024. Os EUA também fornecem apoio militar a Taiwan. As autoridades em Taipei também fortalecem seus canais não oficiais com parlamentos e governos de outros países, tendo como pano de fundo a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia.
Um modelo de democracia?
Grano vê Taiwan como um “excelente exemplo de um país que conseguiu fazer a transição do governo autoritário de partido único para uma democracia sem nenhum retrocesso autoritário”. Essa transição tem sido pacífica. Houve três mudanças de governo desde as primeiras eleições livres em 1996. A questão de saber se as eleições provocam mudanças políticas e se os governos renunciam ao poder após perderem as eleições é considerada um teste decisivo para o funcionamento de uma democracia.
Em 2019, Taiwan se tornou o primeiro país da Ásia a introduzir o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Para a pesquisadora, uma coisa é certa: “Na Ásia, Taiwan é um dos países mais liberais e livres, onde a diversidade, os direitos humanos e as liberdades civis são respeitadas.”
A luta de Taiwan pelo reconhecimento internacional é uma força motriz para as forças políticas do país darem o exemplo em termos de direitos humanos e democracia. De acordo com Hung, esse desejo da sociedade taiwanesa foi ainda mais fortalecido pelos desenvolvimentos autoritários em Hong Kong, na China. O professor da Universidade Johns Hopkins considera que “a promessa de Pequim de aceitar um país com dois sistemas diferentes não tem valor”. Apesar da situação de ameaça, no entanto, ele está otimista quanto ao futuro de Taiwan na independência.
Importância da Suíça para Taiwan
Grano vê muitos paralelos: “Assim como Taiwan, a Suíça é um país pequeno. Assim como Taiwan, a Suíça é um país democrático no qual as liberdades civis são respeitadas. Para a Suíça, a promoção da democracia em todo o mundo é um mandato constitucional”. Isso é particularmente evidente no animado intercâmbio entre a Suíça e Taiwan sobre a questão dos direitos democráticos diretos do povo: Taiwan introduziu esses direitos em 2003 e os reformou várias vezes desde então.
Entre outras coisas, os obstáculos de assinatura para iniciativas populares e referendos foram reduzidos, o que levou a mais de uma dúzia de referendos desencadeados pelos eleitores nos últimos anos sobre temas como segurança alimentar, energia nuclear e a organização da democracia. “A Suíça serve claramente como um ponto de referência para Taiwan em termos de democracia direta”, ressalta Hung.
Qual é a presença da Suíça?
Taiwan é o quinto parceiro comercial mais importante da Suíça na Ásia. De acordo com a representante suíça em Taipei, Claudia Fontana Tobiassen, o comércio entre os dois países “quase dobrou desde 2010”. Atualmente, “mais de 120 empresas suíças” estão presentes em Taiwan. Entre elas está a fabricante de trens e vagões Stadler Rail, que recentemente recebeu um grande pedido para a ferrovia subterrânea na cidade portuária de Kaohsiung.
Como a Suíça não reconhece Taiwan como um “estado independente” devido ao veto da China, as relações diplomáticas são tratadas pelo “Escritório de Comércio das Indústrias Suíças” em Taipei e pela Delegação Cultural e Econômica de Taipei em Berna para o lado taiwanês. Ambas as representações se reportam aos respectivos ministérios das relações exteriores e são chefiadas por diplomatas de carreira.
Historicamente, os missionários católicos e especialistas da Missão de Belém da Suíça também contribuíram para o desenvolvimento de Taiwan nos últimos 70 anos: em treinamento vocacional, saúde e proteção de minorias para membros dos 16 povos indígenas de Taiwan.
Edição: Benjamin von Wyl
Adaptação: Alexander Thoele