Eles ainda estão em terra firme, na capital grega, mas os ventos de uma possível tempestade política em alto mar já incomodam os 292 ativistas e 36 jornalistas de 22 países que aguardam em Atenas a autorização para zarpar, em dez embarcações, rumo a uma nova tentativa de furar o bloqueio imposto por Israel à Faixa de Gaza. Atrasos impostos pela burocracia da Grécia – que ativistas atribuem a um lobby israelense para impedi-los – denúncias de sabotagem e até a ameaça de uma greve, no auge dos protestos contra um pacote de austeridade para salvar o país europeu da crise já atrasam em pelo menos dois dias o embarque da segunda Flotilha da Liberdade, inicialmente previsto para ontem. E tudo isso sob as ameaças do governo de Israel, que apesar da intervenção que levou à morte de nove ativistas turcos no navio Mavi Marmara no ano passado, promete impedir que os barcos cumpram a missão.
Ontem, diante de rumores de que os ativistas estariam levando a bordo ácido e materiais químicos para atacarem os soldados israelenses, o ministro das Relações Exteriores Avigdor Lieberman criticou a iniciativa – e acusou os integrantes da flotilha de ajuda humanitária de ocultarem terroristas entre eles.
– Eles estão lá claramente para criar uma provocação, buscando confronto, sangue e muitas fotos e imagens na televisão – afirmou o ministro à rádio estatal "Reshet Bet".
O comentário foi mais uma fagulha na escalada de provocações dos dois lados antes da partida. Concentrados em um hotel de Atenas há uma semana, ativistas pró-Palestina acusam o lobby israelense pelos entraves burocráticos colocados pelo governo grego à partida de dez embarcações. Pelo menos dois dos barcos atracados no Porto de Pireus – incluindo o "Audácia da Esperança", de bandeira americana – foram retidos pelas autoridades após uma petição da ONG israelense "Shurat Hadin" denunciando a falta de apólices de seguro e registros impróprios de sete embarcações da flotilha.
A expectativa dos ativistas é deixar o porto grego até o fim desta semana. Mas, além das questões burocráticas, ontem, o grupo sofreu outro revés: outro barco, o "Juliano", de bandeira sueca, apresentou problemas na hélice do motor. E, num comunicado, os organizadores da flotilha denunciaram um ato de sabotagem perpetrado por "mergulhadores hostis".
– Uma coisa é um país estrangeiro pressionar o governo grego para atrasar nossa viagem. Outra são agentes inimigos operando em território grego. É hora de a comunidade internacional dizer "chega!" – reclamou Mattias Gardell, porta-voz de uma das organizações envolvidas na empreitada, a sueca Ship to Gaza.
Enxofre, uma arma contra militares
Israel insiste em classificar a ação marítima como um ato de "provocação perigosa", unidades especiais da Marinha vêm treinando para o caso de uma interceptação violenta como a que ocorreu no ano passado, quando um dos barcos da primeira Flotilha da Liberdade insistiu em alcançar o isolado território palestino diante da abordagem de soldados israelenses.
– Não há crise humanitária em Gaza. O problema real é o cativeiro de Gilad Shalit e o fato de que mais mísseis ameaçam o sul de Israel – disse o ministro israelense da Defesa, Ehud Barak, referindo-se ao soldado capturado há cinco anos pelo Hamas na Faixa de Gaza.
A denúncia publicada no jornal "Ha'aretz" de que "elementos radicais" infiltrados na flotilha estariam planejando matar soldados israelenses deflagrou uma renovada guerra de acusações e desmentidos entre Jerusalém e Atenas. Outro diário, o "Yediot Ahronot" garante que fontes militares obtiveram informações da Inteligência dando conta de que os passageiros estariam levando substâncias como enxofre para ferir os militares.
– É um argumento mentiroso. Nós vamos em paz e todos assinamos um termo nos comprometendo com a não violência. A ideia é não ter contato com o Exército de Israel. – garantiu a polonesa Ewa Jasiewicz, da ONG Gaza Livre. – Há alguns problemas, não podemos descartar um atraso que adie a partida para a próxima semana.