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ONU autoriza e França decide enviar soldados para Bangui, após violentos confrontos entre cristãos e muçulmanos

RODRIGO CRAVEIRO 
 
Vackat Thierry, conselheiro do Conselho Nacional de Transição da República Centro-Africana, contou 26 corpos espalhados pelas ruas perto de sua casa. O ex-ministro da Juventude Jean-Serge Bokassa, filho do ex-presidente Jean-Bédel Bokassa (1966-1979), garante que apenas em um dos bairros da capital Bangui foram encontrados 130 mortos. O medo da morte tomou conta da cidade de 1 milhão de habitantes desde a madrugada de ontem, quando guerrilheiros cristãos anti-Balaka — inimigos da milícia muçulmana Seleka (“União”, no idioma Sango) — atacaram várias regiões de Bangui, usando armas de fogo e machetes. Com o acirramento da violência, o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou resolução que autoriza o envio de mais mil soldados da Missão de Apoio na República Centro-Africana (Misca, pela sigla em inglês), aumentando o efetivo de 2.500 para 3.500. O presidente da França, François Hollande, anunciou, na noite de ontem, uma ação militar “imediata” no país. Em pronunciamento na tevê, ele declarou que a “intervenção francesa será rápida” e “não deve durar”. A expectativa é de que o parlamento ouça as explicações das autoridades sobre a operação na próxima semana. 
 
“Um toque de recolher em Bangui vigora das 18h às 6h. Mas existe uma verdadeira tensão entre cristãos e muçulmanos. Disparos de armas pesadas e leves puderam ser ouvidos durante todo o dia”, afirmou Bokassa ao Correio, pela internet. 
 
“Perdi cinco familiares nos confrontos de hoje (ontem), além de vários conhecidos.” De acordo com ele, o atual regime organizou meios rudimentares para contra-atacar forças que ameaçavam os civis. Representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) na República Centro-Africana, Souleymane Diabete considera a situação humanitária no país “muito ruim”. “Temos informações de que vários civis morreram e há muitos deslocados internos em Bangui. Devido à situação de insegurança, fomos aconselhados a não deixar nossas casas”, disse à reportagem, por telefone. “Não temos hospitais apropriados para tratar dos feridos”, concluiu. Segundo ele, os confrontos sectários se espalharam por todo o país e deixaram os 4,3 milhões de centro-africanos em perigo. 
 
Golpe 
 
Thierry admite que a situação piorou muito depois da destituição do presidente François Bozize, em 24 de março de 2014. “Desde a queda dele, enfrentamos uma série de extorsões por parte dos membros da milícia Seleka. Fazendeiros formaram grupos de defesa motorizada”, contou. Ele teme ser alvo da violência. “Nós não estamos seguros enquanto esperamos pele chegada do Exército francês. 
 
Qualquer pessoa pode invadir nossa casa e nos matar”, acrescentou. Nos confrontos de ontem, pelo menos 53 corpos de muçulmanos foram localizados dentro das mesquitas. Um camaronense que não quis se identificar, morador de Bangui, relatou ao Correio ter visto soldados feridos sendo transportados em jipes militares. “Vejo isso tudo como uma clara tentativa de golpe antes da intervenção francesa.” 
  
Aceno ao Brasil 
 
SILVIO QUEIROZ 
 
A segunda intervenção militar da França na África em menos de um ano, depois da ação de janeiro no Mali, é um dos temas da agenda política que o presidente François Hollande pretende abordar com a colega Dilma Rousseff, na próxima quinta-feira. Hollande fará uma visita de Estado de dois dias, que tem na cooperação econômica e científica os pontos centrais, mas contemplará também o aprofundamento do diálogo político entre os dois governos — nos marcos da parceria estratégica firmada em 2006 entre os presidentes Jacques Chirac e Luiz Inácio Lula da Silva. 
 
“É importante ser transparente sobre a África”, disse ontem a um grupo de jornalistas brasileiros o embaixador francês, Denis Pietton, ao apresentar o programa de Hollande em Brasília e São Paulo, sob o impacto da escalada dos combates em Bangui e do sinal verde da ONU para o avanço das tropas francesas no país. “O Brasil tem ambições no continente, multiplicou o número de embaixadas, desenvolve programas de assistência ao desenvolvimento”, ponderou o diplomata. Pietton ressaltou o papel brasileiro no comando da missão de paz das Nações Unidas na República Democrática do Congo. 
 
Hollande vem acompanhado de cerca de 80 empresários e assinará acordos de cooperação, entre eles para o projeto de um satélite geoestratégico de uso civil e militar — uma parceria entre a empresa francesa Thales e a brasileira Visiona, joint-venture entre a Telebrás e a Embraer. 

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