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O Barão e os Brics

Paulo Nogueira Batista Jr.

Na quinta-feira, ocorreu a quarta cúpula dos líderes dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) em Nova Dehli. O encontro teve grande repercussão internacional. O "Financial Times", por exemplo, publicou ontem reportagem de primeira página sob o título "Brics pedem mais poder no FMI". O "Washington Post" destacou a oposição dos Brics à retórica de ação militar contra o Irã e a Síria.

Na "Declaração de Dehli", que formaliza os resultados da cúpula, os Brics trataram extensamente de temas econômicos e financeiros. Indicaram a sua insatisfação com o funcionamento do Banco Mundial e do FMI, acolheram positivamente os dois candidatos de países em desenvolvimento à presidência do Banco Mundial, e iniciaram a discussão de um possível novo Banco de Desenvolvimento para financiar projetos nos Brics e em outros países em desenvolvimento, entre diversos outros temas.

Os líderes dos Brics expressaram, por exemplo, preocupação com o ritmo lento das reformas das cotas e da governança do FMI e enfatizaram que os esforços em andamento para aumentar a capacidade de empréstimo do Fundo somente serão bem-sucedidos se houver confiança de que todos os membros da instituição estão verdadeiramente empenhados em reformá-la.

A Declaração de Dehli foi forte, e até contundente em certos aspectos, mas há muita controvérsia sobre o real significado dos Brics. Os críticos e céticos sustentam que o agrupamento é artificial, mais emblema ou sigla do que realidade política. Apontam para as enormes diferenças entre os integrantes e duvidam de que os cinco países possam, de fato, atuar de forma coordenada. "Tigre de papel", dizem alguns.

É inegável que as dificuldades de coordenação dos Brics são consideráveis.

Sou testemunha, pois tenho participado, desde 2008, desse processo no âmbito do FMI e do G-20. Quando cheguei a Washington, em 2007, os Brics não existiam como realidade política. Na época, era realmente uma mera sigla (inventada por um economista do Goldman Sachs).

Na diretoria do FMI e no G-20, a atuação conjunta dos quatro países (a África do Sul só se juntou ao grupo em 2011) começou em 2008, por iniciativa da Rússia. A primeira cúpula dos líderes realizou-se em Yekaterinburgo, na Rússia, em 2009.

Os Brics têm altos e baixos, momentos de proximidade e de distância, mas uma coisa é certa: esta tem sido a nossa principal aliança desde 2008, pelo menos no que se refere a G-20 e FMI.
O diretor-executivo da Rússia no FMI, que está aqui há 20 anos, disse em seminário recente na Brookings Institution, em Washington, que o surgimento dos Brics foi a maior mudança na governança do FMI desde a sua chegada à diretoria da instituição. Posso confirmar. De fato, a nossa atuação conjunta tem sido uma alavanca importante em vários temas estratégicos.

O que os Brics têm em comum, para além de todas as diferenças, é fundamentalmente o seguinte: são países de mercado emergente de grande dimensão econômica, geográfica e populacional. Por isso mesmo, todos eles têm capacidade de atuar com autonomia em relação às potências ocidentais – EUA e Europa. Isso vale sobretudo para os quatro integrantes originais do grupo, mas, creio, que crescentemente também para a África do Sul.

O chanceler Antonio Patriota acertou em cheio, no meu entender, quando comparou a coordenação entre os Brics à nossa aproximação com os EUA no início do século XX, época do Barão do Rio Branco. "Um grande legado do barão", disse Patriota, "é a capacidade de apreensão das mudanças. Na época em que o dinamismo econômico e o eixo de poder mudavam da Europa para os Estados Unidos, ele teve a capacidade de estabelecer uma boa relação com os EUA. Transferindo para hoje, o movimento equivalente é a coordenação com os Brics."

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