Apesar do clima relaxado durante as conversas preliminares, a questão do monitoramento dos aliados europeus pelo serviço secreto americano pairou como uma potencial fonte de discórdia sobre a visita da chanceler federal alemã, Angela Merkel, à Casa Branca, nesta sexta-feira (02/05).
Falando a jornalistas, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, admitiu que seu país e a Alemanha "não estão perfeitamente alinhados" quanto ao tema espionagem, ressalvando que ambos partilham "os mesmos valores e preocupações". Ele se disse "magoado" pela forma como as revelações do ex-colaborador da Agência Nacional de Segurança (NSA) Edward Snowden prejudicaram sua relação com Merkel.
Porém, afirmou, Washington e Berlim estarão empenhados num "ciberdiálogo para fechar ainda mais as lacunas que possam existir". Ligeiramente mais incisiva, a chefe de governo alemã comentou: "Temos algumas dificuldades para superar." Elas serão abordadas, prosseguiu, mas "isso vai estar na pauta pelos próximos anos".
Após minimizar durante semanas as sucessivas revelações de Snowden de que a NSA viria espionando instituições públicas nos países aliados, em outubro último Merkel foi confrontada com a notícia de que até seu telefone celular pessoal fora grampeado pela agência americana. Desde então, o escândalo, apelidado "Cellphone Gate", esfriou as relações entre a Alemanha e os EUA.
Em relação ao "No-Spy Agreement", o pretendido tratado de não espionagem entre os dois países, o presidente Obama fez questão de rebater a versão segundo a qual Washington teria proposto o acordo e depois recuado. Em vez disso, argumentou, seu governo teria proposto à Alemanha as mesmas diretrizes que mantém com outros aliados, inclusive com o Reino Unido.
Consenso em sanções à Rússia
Durante a coletiva de imprensa na Casa Branca, os dois líderes preferiram se concentrar num tema em que o consenso é total – pelo menos na teoria: a crise na Ucrânia e as providências a serem tomadas contra Moscou, que não cessa de fomentar o conflito, em benefício próprio.
Ambos prometeram já para esta sexta-feira medidas punitivas mais amplas e mais rigorosas, se a Rússia não mudar rapidamente seu procedimento destrutivo. "Não teremos opção, senão prosseguir com sanções adicionais, mais severas", caso a Rússia comprometa o pleito presidencial na Ucrânia, marcado para 25 de maio, disse Obama. Merkel concordou que "será inevitável adotar novas sanções".
Até o momento, tanto os EUA quanto a União Europeia dirigiram embargos a personalidades públicas russas envolvidas na crise da Ucrânia, bloqueando seus bens ou impedindo-as de ingressar em solo americano e europeu. Washington suspendeu, ainda, algumas exportações para a Rússia.
Na coletiva na Casa Branca, os dois líderes explicitaram que a próxima fase pode incluir sanções setoriais, podendo atingir, por exemplo, a economia ou as forças militares russas. O presidente russo, Vladimir Putin, "precisa ser dissuadido de seu curso atual", reforçou Obama. No entanto, tanto ele quanto a premiê alemã prefeririam ver a situação ser resolvida por meios diplomáticos.
Desde o agravamento da crise russo-ucraniana, Merkel tem possivelmente conversado mais com Putin do que qualquer outro dirigente europeu. Por esse motivo, ela é vista pelos EUA como um canal de comunicação essencial e peça central na insistência americana para que a UE não arrefeça a pressão contra a Rússia.
Fato é que, devido ao entrelaçamento de suas relações comerciais com o país, e a dependência das fontes de energia russas, o bloco europeu tem se mostrado mais reticente do que os EUA no emprego de sanções como instrumento dissuasório. Políticos americanos, como o senador republicano John McCain, acusam Merkel de servir aos interesses do empresariado alemão, em primeira linha.
As conversas entre Barack Obama e Angela Merkel prosseguiram após o encontro com os jornalistas. Além dos temas mencionados, na pauta estava o problemático acordo entre os EUA e UE, conhecido como Parceira Transatlântica de Comércio; assim como a guerra civil na Síria, os esforços conjuntos para enfrentar a mudança climática global, e as negociações sobre o programa nuclear do Irã.