A passagem de fronteira entre o Iraque e a Jordânia é um posto de controle solitário, em algum lugar do deserto, entre as capitais Amã e Bagdá. Agentes alfandegários do governo iraquiano deveriam regular o tráfego de pessoas no local, mas o governo central iraquiano não exerce mais nenhum controle sobre a fronteira entre os dois países: ele está nas mãos de milicianos sunitas, aliados do grupo terrorista Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).
Esse é apenas um detalhe no avanço do EIIL no Iraque. Mas na jordaniana Amã, a notícia de que os radicais ocuparam o posto de fronteira provocou grande apreensão. O ministro do Interior Hussein Al-Majali declarou que seu país está "cercado de extremistas". O governo colocou suas tropas em estado de alerta na fronteira com o Iraque. Fontes militares indicam que o país monárquico mobilizou dezenas de guarnições ao longo da fronteira.
Os Estados Unidos também estão preocupados: o presidente Barack Obama advertiu que o avanço dos jihadistas pode "se alastrar do Iraque para a Jordânia". O secretário de Estado americano, John Kerry, declarou que o EIIL é uma ameaça para toda a região, e que nenhum país está a salvo desse tipo de terrorismo. A Jordânia é um aliado importante dos EUA na região.
Forte aparato de segurança
Segundo o especialista em Oriente Médio André Bank, do Instituto de Estudos Globais e Regionais (Giga) de Hamburgo, o objetivo do EIIL é estabelecer um Estado teocrático islâmico no Iraque e na assim chamada Grande Síria, que inclui "não somente a atual Síria, partes do Iraque, do Líbano e grandes extensões da Palestina, mas também grandes parcelas da Jordânia".
Essa intenção hegemônica está explícita num vídeo de propaganda que o grupo sunita divulgou pela internet na última semana. Nele veem-se cinco combatentes, supostamente provenientes do Reino Unido e da Austrália. "Não conhecemos fronteiras", explica um dos homens no vídeo. "Lutamos na Síria, em alguns dias vamos entrar no Iraque, e também vamos para a Jordânia e Líbano. Para onde quer que o nosso líder nos envie."
Mas, por enquanto, talvez se trate apenas propaganda. Bank considera improvável que os combatentes do EIIL venham a invadir a Jordânia, no momento. Enquanto no Iraque eles se deparam com um Exército desmoralizado, que abdica de grande parte do país sem nenhuma luta, as forças militares jordanianas são consideradas bem mais combativas. "O aparato de segurança da Jordânia é um dos mais fortes na região. As instalações fronteiriças são fortemente protegidas", destaca o especialista.
Crescente ameaça de terrorismo
No entanto, o EIIL poderia tentar desestabilizar a Jordânia por meio de atentados terroristas. Não seria a primeira vez que o país entra na mira dos terroristas: em 2005, mais de 50 pessoas morreram em três atentados contra hotéis de luxo. O autor foi o grupo terrorista Al Qaeda no Iraque, antecessor do EIIL cujo líder é o jordaniano Abu Musab al-Zarqawi.
Ramzy Mardini, morador de Amã, é especialista em segurança do Atlantic Council – organização criada em 1961 para promover a cooperação entre a Europa e os Estados Unidos. Ele diz acreditar que grupos radicais já formaram células terroristas dentro da Jordânia e que o país abriga um número cada vez maior de jihadistas.
Isso se confirmou na última sexta-feira (20/06), quando 200 apoiadores do EIIL foram às ruas da cidade de Maan. Carregando faixas, eles declararam a cidade a "Faluja da Jordânia" – Faluja, no Iraque, é um bastião dos radicais islâmicos.
Jordânia estável, mas carente de reformas
Para Marwan Muasher, ex-ministro jordaniano do Exterior e atual vice-presidente do instituto de pesquisas Carnegie Endowment, a "grande maioria da população" está contra os extremistas do EIIL. Segundo o chefe de diplomacia, o risco que o grupo terrorista significa para a Jordânia – onde é uma ameaça à segurança, mas não é um "perigo de vida" – não pode ser comparado ao que representa e para a Síria ou Iraque.
Bank diz também acreditar que a posição do rei Abdullah 2° da Jordânia é relativamente segura, até por ter apoio, não só dos Estados ocidentais e de Israel, mas também das monarquias do Golfo Pérsico. Ainda assim, o país enfrenta grandes problemas, pois acolheu centenas de milhares de refugiados da Síria e sua economia está debilitada, com numerosos desempregados.
Nesta terça-feira, o rei Abdullah está em Berlim, onde se encontra com a chanceler federal alemã, Angela Merkel. André Bank defende que a Alemanha utilize uma estratégia dupla para lidar com a Jordânia: deve-se fortalecer o apoio aos jordanianos, com vista a superar a crise de refugiados; no longo prazo, no entanto, essa ajuda deve estar subordinada a condições.
Pois, sem mais abertura política no país ainda governado de forma autoritária e sem uma política econômica socialmente mais equilibrada, também sobre a Jordânia paira a ameaça de que os extremistas se fortaleçam, alerta o especialista do Giga.