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ITAMARATY – Discreto e acanhado, o novo tom

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KLÉCIO SANTOS | Brasília

  O Brasil perdeu a ambição no cenário mundial. Diante da passividade da diplomacia, o país deixou de ter o protagonismo do governo Lula, e sua liderança no hemisfério começa a ser questionada ao relativizar a repressão na Venezuela.

Não há mudança radical nos rumos da política externa, mas, por conta da postura centralizadora da presidente Dilma Rousseff, a discrição tem pautado o Itamaraty, em especial após a troca do chanceler Antonio Patriota por Luiz Alberto Figueiredo, em 2013. Essa postura ganhou nitidez a partir do acirramento das tensões na Ucrânia e Venezuela.

Com Patriota, a ordem era expressar a política nacional em um cenário de crise na Europa e pós-Primavera Árabe. A gestão, contudo, foi marcada pelo esvaziamento da posição brasileira em fóruns internacionais e por sobressaltos regionais, como a crise no Mercosul (com a suspensão do Paraguai e o ingresso da Venezuela) e a fuga de um asilado político da embaixada na Bolívia, o senador Roger Pinto Molina, escoltado clandestinamente para dentro do Brasil.

O único avanço foi o discurso menos contundente a favor do Irã, mas o crédito é da presidente. Patriota e Dilma não falavam a mesma língua. Em vários momentos, ela se irritou com manifestações do ex-chanceler.

Tentando se adaptar ao estilo da chefe, Figueiredo se retraiu. Nos corredores do Itamaraty, a mudança no comando foi comemorada. Patriota estava desgastado, e o atual ministro se mostra mais afável aos problemas internos.

– Figueiredo é mais aberto ao diálogo e às discussões sobre questões internas, até recebe parlamentares – diz um diplomata.

Dilma conheceu e aprovou o estilo de Figueiredo na Convenção do Clima de Copenhague, em 2009, à época em que ela era ministra da Casa Civil e chefiou a delegação. O problema é que o prestígio junto à presidente não se estende ao restante do Itamaraty. A política externa segue em segundo plano para o Planalto, o foco é a economia interna.

O papel subalterno de Figueiredo foi realçado durante a polêmica escala de Dilma em Lisboa, quando vieram à tona gastos com hospedagem da comitiva após viagem a Davos (Suíça). Coube ao chanceler explicar as despesas de pernoite. Para a professora do programa de pós-graduação em Estudos Estratégicos Internacionais da UFRGS, Analúcia Danilevicz Pereira, os principais eixos da política externa estão mantidos, e o que existe é uma mudança de personalidade:

– Sem adjetivar, este governo não se coloca de forma tão enfática nos temas que vão surgindo. O discurso se mantém, mas é apresentado de outra forma.

Assessor mantém atuação paralela

No atual cenário, cresceu o espaço de Marco Aurélio Garcia, assessor da Presidência em assuntos sobre América Latina e governos mais à esquerda. Com Lula, o embaixador Samuel Pinheiro, então o número 2 do Itamaraty, também exercia o papel de ideólogo em defesa dos países bolivarianos. Agora, as opiniões de Garcia ganham força, e sua equipe aumentou. Ele desembarcou na Venezuela antes mesmo de Figueiredo e dos chanceleres da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), para mediar negociações frente à onda de violência.

Sua função foi tentar construir canais com setores da sociedade, como Igreja e empresários. O êxito da iniciativa para a estabilidade venezuelana ainda é duvidoso, apesar de a Unasul ter convencido o presidente Nicolás Maduro a aceitar conversar com parte da oposição. Em recente visita ao Brasil, a deputada cassada María Corina Machado, opositora ao chavismo, criticou a Unasul, que estaria alinhada com Maduro. Figueiredo se mostra satisfeito com os desdobramentos e considera que há “avanços importantes e boa vontade do governo”, embora uma anistia aos presos políticos tenha sido descartada.

Professor de Relações Internacionais da UnB, Alcides Costa Vaz entende a opção do Brasil pela Unasul como fórum, mesmo ressaltando o fato de a Venezuela ter um regime com traços autoritários.

– O Brasil fica exposto às críticas, é visto como aliado (do chavismo), mas é um preço a pagar por não legitimar tentativas de derrubadas de governos.

Para Vaz, o problema é que a política externa nacional entrou em um compasso “inercial e de desgaste”, ao contrário do governo Lula. Ainda, segundo o professor, com a tensão crescente entre as grandes potências, o espaço é residual para ação de terceiros. O Brasil chama mais a atenção por conta da passividade diante de impasses na região.

–Tivemos quatro anos sem nenhuma iniciativa nova na área. Os momentos de maior visibilidade foram de sobressaltos, não de protagonismo – atesta Vaz.

 

NOS FÓRUNS INTERNACIONAIS
A maior vitória no governo Dilma foi a eleição de Roberto Azevêdo, que assumiu a direção-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). A eleição do diplomata – que tem como desafio desbloquear as negociações da Rodada de Doha para liberalizar o comércio mundial – é reflexo da política externa de Lula, mais agressiva e focada em mudanças em organismos internacionais.

A cadeira permanente ao Brasil no Conselho de Segurança da ONU continua um sonho, mas foi no governo Lula que o país se fortaleceu no G-20 e nos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Também foi na gestão Lula que a Unasul foi criada com objetivos mais políticos e estratégicos no vácuo do Mercosul.

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