Por Rodger Shanahan – Texto do The Interpreter
Tradução, adaptação e edição – Nicholle Murmel
Enquanto os acontecimentos de desenrolam em Bagdá, a decisão unilateral do presidente Barak Obama de retirar as tropas americanas do Iraque – por conta da falta de de um acordo que estabelecesse o status das forças alocadas no país – parece justificada. O primeiro ministro iraquiano, Nouri al-Maliki, exacerbou a natureza sectária da política nacional, colaborando para a atual crise. E a Casa Branca deve estar dando graças por não ter soldados a serviço de um governante surdo às súplicas para que deixe o cargo.
Alguns comentaristas afirmam que o Estado Islâmco (EI) não teria tanto sucesso no Iraque se ainda houvesse presença residual dos EUA. A realidade é que o EI vem cortejando assiduamente as tribos sunitas privadas de seus direitos civis por Maliki. Além disso, os militares do país se mostraram vazios e corruptos. Um contingente residual americano teria sido espectador e, no pior dos cenários, cúmplice do mau gerenciamento da situação. Para o jornalista Greg Sheridan, em editorial no The Australian, a noção de que tropas estadunidenses teriam ajudado a estabilizar o cenário em Bagdá e apoiar as Forças Armadas iraquianas é típica do batalhão do “quem dera”, e ignora a complexa dinâmica entre elementos seculares, religiosos e tribais na realidade polítca do Iraque.
É por isso que, de certa forma, a decisão do EI de atacar minorias religiosas e curdos deu a Obama um presente estratégico que ele rapidamente aceitou. Claramente o Iraque precisa de assistência militar, mas os EUA precisam oferecê-la de um modo que não beneficie Malik. Que melhor maneira de indroduzir poder de fogo, do que alegando socorro a uma crise humanitária e em defesa das áreas de população curda? A intervenção americana foi aprovada pelo governo iraquiano, mas não o favorece diretamente. Trata-se de uma manobra difícil de operar, mas dá a Washington algumas garantias: se Maliki tentar se agarrar ao poder, contará com apoio militar muito restrito. Se o ministro deixar o cargo e for substituído por um governo mais inclusivo, o apoio aéreo dos EUA poderia então ser usado com mais boa vontade.
Já o Estado Islâmico está começando a compreender a dificuldade de combater uma campanha militar convencional usando equipamentos capturados, enquanto o oponente tem supremacia aérea. Até onde se sabe, os bombardeios americanos destruíram apenas uma peça de artilharia, um ponto de lançamento de morteiros, alguns veículos blindados e um comboio. Mas até mesmo os ideólogos mais inflamados do califado extremista começaram a perceber que tentar operar nas planícies abertas ao norte do território iraquiano é uma tarefa perigosa considerando as aeronaves ocidentais à espreita no céu. Os efeitos de algumas bombas de 500 libras e mísseis Hellfire também não passaram despercebidos para os outros protagonistas da crise. Forças iraquianas e curdas provavelmente lutarão com mais vigor se souberem que podem contar com apoio aéreo. Além disso, caso a intervenção estadunidense seja expandida em apoio a um governo mais inclusivo no Iraque, as tribos atualmente alinhadas com o EI podem decidir que seus interesses serão melhor atendidos abandonando a coalizão islâmica.
Tudo que foi colocado aqui são grandes hipóteses, e a situação em Bagdá se altera a cada hora. Mas a decisão do Estado Islâmico de atacar minorias religiosas e curdos pode muito bem ser um erro não apenas tático, mas estratégico.