Adriana Carranca
Com o fim da presença militar permanente dos Estados Unidos no Iraque, o Irã se tornará a maior força bélica no Golfo Pérsico. No ranking de 2011 do site Global Fire Power, de análises estatísticas militares, o Irã aparece como 12.ª potência militar do mundo, seguido da Arábia Saudita em 26.º lugar e do próprio Iraque, em 36.º. A comparação não inclui investimentos em programas nucleares, o que tornaria o Irã ainda mais forte.
Emirados Árabes Unidos, Kuwait, Omã e Catar não aparecem entre as 50 nações com maior poderio militar. O ranking compara não apenas número de tropas, armas, tanques, navios e aviões militares, mas a capacidade de produção, ou seja, a indústria bélica de cada país.
Enquanto os EUA navegam pelas águas turbulentas da crise econômica interna, o regime iraniano tem expandido seus tentáculos para os países vizinhos na tentativa de redefinir a balança de poder na região. A queda de braço entre os dois países está sendo travada agora mesmo no Iraque.
De um lado, Washington tenta (sem sucesso, por enquanto) convencer Bagdá a permitir a permanência mínima de militares americanos em seu território. De outro, Teerã busca utilizar sua influência sobre a maioria xiita iraquiana para impedir que isso ocorra.
"O Irã fará tudo o que estiver ao seu alcance para garantir que o território iraquiano não possa ser usado para atacá-lo", disse ao Estado o analista iraniano Trita Parsi, diretor do Conselho Nacional Iraniano-Americano, que acompanha o embate entre os dois países. Ele cita como exemplo a ofensiva militar iraniana contra campos curdos, na semana passada.
Soldados da Guarda Revolucionária atravessaram a fronteira e tomaram o controle de três bases de milicianos dentro do Iraque. O Partido da Vida Livre do Curdistão, ramificação do Partido dos Trabalhadores do Curdistão, considerado "terrorista" pelo Irã, confirmou a operação. O Irã também anunciou o envio de 5 mil homens para a fronteira.
Para a pesquisadora Reva Bahlla, da consultoria de risco político Stratford, não se trata apenas de defesa, mas uma demonstração de força do Irã.
Os aiatolás tentam convencer os vizinhos sunitas de que resistir a um papel mais importante do Irã na região pode ser um mau negócio, em um momento em que os EUA não parecem dispor de tempo ou recursos para intervir em seu socorro. "Uma ameaça militar dos países do Conselho de Cooperação do Golfo contra o Irã não seria realista sem a ajuda dos EUA", acredita a pesquisadora.
Vácuo. O Irã apoia-se nisso para expandir sua influência regional. "Quando há um vácuo no poder – e haverá um quando os EUA deixarem o Iraque -, há disputa para preenchê-lo. O Irã tentará assumir esse papel, assim como Arábia Saudita e Turquia. Mas sobretudo o Irã, que tenta impedir qualquer tentativa futura dos EUA de isolar ou atacar seu território", diz Parsi.
Se for bem sucedido em preencher esse vazio no Iraque – país que faz fronteira com seis países do Oriente Médio e tem maioria xiita -, o Irã teria garantida superioridade territorial e de produção do petróleo. Para isso, certamente terá de enfrentar a oposição de Israel, que teme o domínio dos aiatolás na região, e da Turquia, potência econômica e militar também em ascensão.
Poder. Teerã busca assegurar maior controle político, econômico e religioso nas mãos dos xiitas, maioria no Irã – e também no Iraque, Bahrein e Azerbaijão – em detrimento dos sunitas, que dominam a região desde o século 16.
Quando os protestos estouraram no Bahrein, em meados de março, o Irã aproveitou a oportunidade para ameaçar a monarquia sunita de Riad com uma revolta xiita batendo à porta de sua fronteira rica em petróleo. Isso explicaria a rápida e voraz resposta contra os manifestantes em uma rara intervenção militar da Arábia Saudita. A situação acalmou, mas a dissidência xiita se mantém e pode ser usada a qualquer momento.
O Irã também pode ameaçar com o bloqueio do fluxo de petróleo pelo Estreito de Ormuz e com os mísseis direcionados para os poços sauditas, algo que talvez amedronte mais os EUA do que o programa nuclear.
O cenário coloca a Arábia Saudita em posição difícil – a monarquia já não descarta a possibilidade de que a Casa Branca tente um acordo direto com o Irã. "Embora um acordo com o Irã seja um desafio, nada prende os EUA à Arábia Saudita", avalia Reva. A alternativa seria os próprios sauditas tentarem uma trégua com o Irã, até que os sunitas consigam erguer uma resistência árabe contra o país persa.
Qualquer que seja o acordo, para os aiatolás seria um atestado de superioridade. É tudo o que eles querem agora.