Malcolm Alvarez-James
O suposto envolvimento de dois membros de gangues das ruas de Los Angeles na guerra civil na Síria pode estimular extremistas do Oriente Médio a recrutar outros integrantes de grupos criminosos da América Latina, de acordo com Rafael Martínez, colunista que geralmente escreve sobre questões de segurança para o El Vocero Nacional.
“É bem provável que grupos extremistas [venham a] recrutar membros de gangues, especialmente na América Central, para cometer atos de terrorismo”, disse Martínez. “Eles podem fazer isso pela tentação do dinheiro ou em troca de armas. Nós devemos ter em mente que nesses países existem gangues de rua que podem ser corrompidas por dinheiro.”
Os dois homens de Los Angeles que apareceram no vídeo da internet e afirmaram ser a favor dos combatentes do governo na guerra civil da Síria foram identificados por autoridades dos Estados Unidos como cidadãos sírios que foram deportados dos EUA nos últimos anos.
As autoridades americanas identificaram um dos homens, que se autodenomina “Wino” no vídeo, como Nerses Kilajyan (há diferentes grafias do nome em registros oficiais), 31 anos. Wino é um cidadão sírio que morava nos EUA até ser deportado em 2012. Segundo as autoridades, ele foi deportado após ter cometido vários delitos, incluindo dirigir embriagado e receber propriedades roubadas.
De acordo com as autoridades, Wino é afiliado à gangue Westside Armenian Power (Poder Armênio da Zona Oeste).
O outro homem, que se autodenomina “Creeper” no vídeo, é Sarou Madarian e também tem nacionalidade síria.
As autoridades dos EUA deportaram Creeper em 2010.
Possíveis laços com gangue salvadorenha
A gangue Westside Armenian Power foi formada a partir de alianças com a Máfia Mexicana, uma poderosa gangue de presídio que opera principalmente na Califórnia. A Máfia Mexicana também é aliada da Mara Salvatrucha, ou MS-13, uma violenta gangue transnacional que foi formada por cidadãos da América Central no início dos anos 80 em Los Angeles. Na década de 80, a gangue voltou a se disseminar em seus países de origem, El Salvador, Guatemala e Honduras.
Existe uma grande variação entre as estimativas do número de membros da Mara Salvatrucha na América Central. Há cerca de 25.000 membros da gangue na América Central, de acordo com o site gangs.umd.edu.
Outras estimativas são bem mais altas. Robert Walker, ex-agente do Controle de Fronteira dos EUA e da Agência Antidrogas dos Estados Unidos (DEA), é certificado para testemunhar em julgamentos em tribunais nos EUA como perito em gangues, além de oferecer treinamento a agentes de polícia sobre as gangues. Segundo Walker, há pelo menos 250.000 membros da Mara Salvatrucha na América Central.
Atenção internacional
Wino e Creeper atraíram a atenção internacional em março após terem aparecido no vídeo da internet, que teria sido filmado na Síria. No vídeo, os dois homens, vestidos com uniformes camuflados e com cabeças raspadas, mostram tatuagens de gangue, gritam saudações aos seus “chapas” nos EUA e disparam seus rifles de assalto contra inimigos imaginários.
No vídeo, Wino identificou-se como um membro da gangue Westside Armenian Power, enquanto Creeper alegou ser membro da gangue Sun Valley GW-13, também conhecida como “Grumpy Wynos”.
A gangue Armenian Power, também conhecida como AP-13, é um grupo criminoso de Los Angeles que pratica sequestro, extorsão, fraude bancária e narcotráfico, segundo as autoridades dos EUA. A gangue é composta principalmente de imigrantes armênios e armeno-americanos, mas é aliada à gangue Máfia Mexicana.
A gangue Grumpy Wynos é um pequeno grupo criminoso de San Fernando Valley, uma região de Los Angeles. Embora originalmente hispânica, a quadrilha pode ter poucos membros não hispânicos, de acordo com as autoridades.
O vídeo com os dois homens foi divulgado em 1º de março pelo Instituto de Pesquisas de Mídia do Oriente Médio (MENRI), organização estabelecida em Washington que monitora notícias e postagens das mídias sociais sobre o Oriente Médio. O vídeo foi postado no YouTube.
No vídeo de 20 segundos de duração, desarticulado e cheio de obscenidades, os dois homens falam em um dialeto que mistura inglês americano, espanhol e linguagem de gangues.
'Ainda fazendo coisas de gangue'
“Nós temos os inimigos bem aqui, meu chapa”, diz Creeper para a câmera no vídeo, de pé atrás de um muro semidestruído. “No Oriente Médio, meu chapa, na Síria, ainda fazendo coisas de gangue.”
“Na Síria, chapa, nós estamos na Síria chapa, na linha de frente, chapa”, diz Wino após dar alguns tiros desenfreados no muro. Não houve nenhum tiro de volta dos supostos inimigos.”
Em sua agora inativa página no Facebook, Wino foi identificado como "Wino Ayee Peeyakan”. Na página, Wino disse estar trabalhando com o Exército Sírio juntamente com o grupo militante libanês Hezbollah, embora não seja possível verificar de forma independente a afirmação. A página do Facebook mostrava fotos dele posando com combatentes e usando o uniforme do Hezbollah, de acordo com reportagens da imprensa. O grupo xiita libanês ajudou o presidente sírio Bashar Assad a lutar contra os grupos rebeldes.
Estrangeiros lutando na Síria
Estima-se que em torno de 11.000 estrangeiros estejam lutando ativamente na guerra civil síria, que matou 130.000 nos últimos três anos. Autoridades de inteligência dos EUA disseram que pelo menos 50 americanos se uniram a grupos extremistas rebeldes que lutam para derrubar o presidente sírio Bashar Assad. Porém, o caso de Wino e Creeper pode ser o primeiro em que pessoas ligadas aos EUA dizem estar lutando ao lado do governo.
“Isto é bastante singular, porque estes sujeitos estão lá e eles estão com as forças favoráveis à Síria e às forças a favor do Hezbollah”, disse à CNN o diretor-executivo do Instituto de Pesquisas de Mídia do Oriente Médio, Steven Stalinsky. “Nós monitoramos os combatentes estrangeiros ao longo dos anos, e existe um grupo de americanos indo lutar, mas eles foram lutar contra Assad.”
No vídeo, Wino e Creeper não apresentam nenhuma razão política ou religiosa para estarem lutando pelo governo de Assad. Entretanto, Wino é considerado membro da comunidade armênia cristã, da qual muitos membros apoiam o governo de Assad.
Em sua página no Facebook, Wino teria escrito (com erros ortográficos e abreviações) “eu faço tudo para proteger meu povo”, de acordo com informações da mídia. “Somente meu povo, todos os armênios, e pronto para morrer por meu povo.”
Os cristãos armênios e outros cristãos eram cerca de 10% da população da Síria antes da revolta de 2011, mas muitos deixaram o país como refugiados.
Alguns grupos islâmicos extremistas contrários ao governo lançaram ataques à população cristã. Os ataques incluem profanação de igrejas e o sequestro de freiras, que são mantidas como reféns, de acordo com reportagens da imprensa.