Nota DefesaNet
Matéria publicada originalmente em 07 Julho 2018
O Editor
GUERRA HÍBRIDA
DESVENDANDO A “PMC WAGNER”.
APONTAMENTOS A PARTIR DE FONTES ABERTAS
Frederico Aranha
Pesquisador Independente
Advertência: tradução livre
Forças especiais americanas na Síria, posicionadas na margem oriental do rio Eufrates nas cercanias das instalações da companhia petrolífera CONOCO, na periferia da estratégica cidade Deir-ez-Zor, rechaçaram dois ataques de tropas pró-regime sírio. Em 06 de fevereiro de 2018, SOFs americanas requisitaram apoio aéreo e da artilharia para repelir súbito assalto de quase 1.000 homens – exército sírio, milícias e membros da PMC WAGNER – equipados com carros de combate e armas pesadas. Dias depois, as SOFs solicitaram apoio aéreo, realizado por um drone Reaper MQ-9; destruiu carros de combate adversários T-72, que disparavam insistentemente contra posições ocupadas em conjunto com unidades das SDF (Syrian Democratic Forces) – militantes curdos, majoritariamente, e árabes de tribos do leste sírio.
As SDF e os assessores americanos estavam posicionados a leste de uma imaginária ‘linha-formal-do-conflito” fixada para separar as atividades militares russas e americanas na Síria e, por extensão, dos seus “clientes” e aliados, com o propósito de evitar engajamentos indesejados, que possam resultar num conflito generalizado. O confronto de 06 de fevereiro resultou na morte de centenas de mercenários ditos “russos”.
Soldados regulares do Exército Russo, não se sabe em que número, certamente participaram do ataque, talvez como advisers, porquanto o Alto Comando russo na Síria requereu um cessar-fogo aos americanos para recolher mortos e feridos. Estes foram levados para hospitais militares russos na Síria e na própria Rússia (Bloomberg, 2018).
Num primeiro momento, o inexplicável ataque surpreendeu os analistas. Posteriormente, veio à tona o contrato firmado em fins de 2017 entre o governo sírio e a PMC WAGNER, fixando sua participação de 25% na produção dos campos de petróleo porventura por ela ocupados e guarnecidos. As instalações da CONOCO eram o alvo.
“O “Wagner Group” é uma empresa militar privada (PMC) cuja missão principal é cumprir missões militares atendendo a políticas externas da Rússia. Foi fundada pelo Tenente Coronel Dmitri Utkin, antigo operador das Forças Especiais Russa (Spetnaz). É dirigida pelo empresário Yevgeny Prigozhin. Sabe-se que é controlada por oficiais do GRU e do FSB.
A Wagner vem conduzido operações militares na Ucrânia, Síria, República Centro-Africana e Sudão. A capacidade tática de combate inclui: infantaria, artilharia pesada, defesa aérea, blindados, assessoria e inteligência. A PMC Wagner pratica guerras por procuração e híbrida e é empregada para garantir infraestruturas consideradas de alto valor para a política externa russa. Tem a vantagem de controlar o fluxo de informações operacionais.
Isto permite atividades encobertas, impedindo uma opinião pública negativa. A morte de um soldado contratado não chama atenção, o que ocorreria com a morte em combate de tropas regulares russas. PMCs como a Wagner são essenciais para a aplicação da doutrina estratégica militar russa. São imprescindíveis aos esforços russos para projetar poder e influência em regiões e alianças da era soviética e para criar oportunidades adequadas à agenda externa da Rússia”. (S.A. Cavanagh – Analista Independente)
O QUE É A PMC WAGNER?
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O “Wagner Group”, também conhecido como “ChVK Wagner” ou simplesmente “Wagner” é uma companhia militar privada (PMC – Private Military Company) russa registrada em Hong Kong (Vice, 2018)
ONDE A WAGNER TEM OPERADO?
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Ucrânia/Criméia
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Síria
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República Centro-Africana (CAR)
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Sudão
O QUE A WAGNER FAZ?
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Guerra por procuração (do governo russo)
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Guerra Híbrida/Não-linear
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Anexações na Ucrânia (Criméia e Donbass)
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Assistência na segurança do regime Bashar al-Assad na Síria
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Combate os diversos grupos rebeldes sírios
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Combate o Daesh (Estado Islâmico) na Síria
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Treina forças regulares e milícias pró-Assad na Síria
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Captura e controla campos de petróleo e gás antes ocupados por Rebeldes & Daesh na Síria
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Assessoria & treinamento na CAR & Sudão
QUAIS SÃO AS QUALIFICAÇÕES MILITARES DA WAGNER?
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Infantaria
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Artilharia pesada
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Defesa aérea
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Blindados
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Assessoria e treinamento
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Inteligência & Contra-inteligência
QUAIS SÃO AS AGÊNCIAS DE INTELIGÊNCIA RUSSAS ASSOCIADAS À WAGNER?
Acredita-se que age sob controle de oficiais
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do FSB (Serviço Federal de Segurança – sucessor da KGB)
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e do GRU (Diretório Central de Inteligência Militar – criado em 1918, subordinado ao Estado-Maior das Forças Armadas da Federação Russa)
QUEM SÃO OS CONTRATADOS PELA WAGNER?
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Veteranos russos
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Voluntários ucranianos e oriundos de todo o Oriente Médio e Ásia Central
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Ex-operadores das Forças Especiais Russas (Spetnaz)
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Conscritos e unidades autônomas de Cossacos, Sérvios, Chechenos, Inguches e de outras etnias da Federação Russa
“Separatistas” (membros da PMC WAGNER) na Donbass, Ucrânia. O armamento é russo, no entanto os fardamentos e equipamento pessoal são de diversas origens
QUANTOS SÃO OS CONTRATADOS DA COMPANHIA?
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É uma organização fluída, que se altera de acordo com as necessidades operacionais. Números exatos são desconhecidos e difíceis de avaliar. Há quem fale em até 20.000 homens em determinado período
Ucrânia
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Eventualmente, 2.000-10.000 mercenários Wagner serviram no país (Euromaidan Press, 2017)
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Cerca de 1600 membros da Companhia, que serviram na Ucrânia/Criméia, foram identificados pelo SBU (Serviço de Segurança da Ucrânia) (Euromaidan Press, 2017)
Síria
· Fontanka, um canal independente de notícias da Rússia, teve acesso a documentos confidenciais indicando que no mínimo 5.000 mercenários foram enviados à Síria em várias deslocamentos (AP News, 2017)
República Centro-Africana
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Vários militares russos e 170 instrutores civis (mercenários) estão treinando pessoal da CAR (Conflict Intelligence Team, 2018)
Sudão
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Há mercenários russos treinando ativamente soldados sudaneses e inclusive participando de combates. O número deles é desconhecido (Inform Napalm, 2017)
QUANTOS MERCENÁRIOS DA WAGNER FORAM MORTOS?
Não se conhece números exatos.
Ucrânia
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Mais de 100 teriam sido mortos (Kyiv Post, 2018)
Síria
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O CIT (Conflict Intelligence Team) fala em números conservadores de aproximadamente 100 (ABC News, 2017)
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O Der Spiegel informa a morte de 600 contratados (Spiegel Online, 2018)
QUAIS SÃO OS OBJETIVOS DA RÚSSIA ATENDIDOS PELA WAGNER?
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Influência política externa & poder econômico
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Anexação da Ucrânia
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Propósitos comerciais
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Òleo & Gás na Síria – 25% da produção de campos protegidos pela Wagner
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Mineração na CAR
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Proteção de minas de ouro, diamantes e urânio no Sudão (Warsaw Institute, 2017)
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Guerra por procuração contra o EEUU, NATO e aliados
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Influência na África Subsaariana (Real Clear Defense, 2018)
QUEM SÃO OS CABEÇAS DA WAGNER?
Yevgeny Prigozhin
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Apelidado “Chef do Putin” pela mídia russa, Prigozhin é proprietário de restaurantes e companhias de catering que fornecem alimentos para a rede escolar de Moscou e de São Petesburgo, para 90% das forças armadas russas e para banquetes a dignitários no Kremlin – contratos avaliados em mais de 1 bilhão de dólares. Desde que estabeleceu relações próximas com Putin, Prigozhin firmou vários convênios com as forças armadas e instituições estatais. É o controlador das holdings Evro Polis, Wagner, Concord Management e Consulting & Concord Catering, além da Internet Research Agency (IRA) em São Petersburgo (“troll farm”), que emprega a internet para influenciar a opinião pública em todo mundo, inclusive no EEUU (New York Times, 2017)
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As companhias Evro Polis Ltd., Concord Management e Consulting and Concord Catering foram colocadas na lista de sanções do US Treasury em razão de violações da soberania e integridade da Ucrânia. (BBC News, 2018)
Yevgeny Prigozhin na sua função real como "Chef" de Vladimir Putin
Dmitri Utkin
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O fundador do Grupo Wagner é Tenente Coronel operador da Forças Especiais russas (Spetsnaz). Completou seu serviço military em 2013 comandando o Destacamento Independente n. 700 da 2ª Brigada Independente da Inteligência Militar subordinada ao GRU. Utkin participou do Moran Security Group e do Slav Corps, ambos grupos de mercenários. (The Interpreter, 2016) (New York Times, 2017)
Por que a Wagner é importante para o Governo Russo?
A Wagner pode controlar informações indesejáveis, fazendo parte da grande estratégia da Rússia de monitorar informes e garantir segurança operacional globalmente.A atividade militar russa é mais fácil de encobrir com as PMCs, comparado com a das forças regulares russas.
Um empregado da Wagner assina contrato com garantia de 10 anos de confidencialidade, entrega seu celular e outros dispositivos pessoais quando em operações, reduzindo a possibilidade de vazamentos. Os membros da família também estão incluídos no pacto, sob pena de não receberem o pagamento do seguro de vida em caso de morte do contratado durante ações militares. Essas condições ajudam a Wagner a manter discrição sobre todas as operações. (The Interpreter, 2016)
A Wagner ajuda a Rússia a dissimular seu potencial militar perante o conhecimento do mundo exterior. O segredo é mantido de tal forma, que a quase totalidade dos mercenários desconhecem o nome e sobrenome dos seus companheiros de unidade, tratando-os por codinomes – “A curiosidade não é bem-vinda”. (The Interpreter, 2016)
Atividades militares russas clandestinas mantêm-se secretas
A Wagner ajuda a Rússia a dissimular seu potencial militar perante o conhecimento do mundo exterior. O segredo é mantido de tal forma, que a quase totalidade dos mercenários desconhecem o nome e sobrenome dos seus companheiros de unidade, tratando-os por codinomes – “A curiosidade não é bem-vinda”. (The Interpreter, 2016)
A Morte dos contratados não é noticiada
Mercenários mortos no exterior praticamente não chamam a atenção.A opinião pública em geral não empresta maior importância à morte de soldados profissionais que lutam só por pagamento. Soldados regulares russos mortos no estrangeiro sensibilizam o público, de modo que o Governo procura não informar a respeito. Há decreto presidencial proibindo a divulgação de perdas militares no exterior. Essa situação representa um alto risco para os contratados da Wagner. O anonimato permite seu emprego em operações extremamente arriscadas, ou seja, são “bucha para canhão” no jargão popular
De acordo com Mark Galeotti, Pesquisador-Chefe do Instituto de Relações Internacionais de Praga, “O povo russo não tem nenhum entusiasmo pela ideia da formação de um império que envolveria o retorno de seus filhos em sacos mortuários. São claramente indiferentes a este conflito (da Síria). (…) Dispondo da PMC Wagner, há uma força que pode ser empregada (…) porquanto, quando gente morre não há necessidade de anunciar” (news.com.au, 2017)
A Wagner é Privada
Não há ligações oficiais entre a PMC Wagner e o Governo russo, tornando as operações facilmente dissimuláveis (Jojart & Racz, 2017) (Newsweek, 2018)
A PMC Wagner é um Modelo Econômico e Ideológico Autossustentável
A Rússia desloca os mercenários para antigas áreas de influência soviética visando também explorar novas oportunidades econômicas. A PMC Wagner é capaz de apoiar regimes falimentares como o governo Assad na Síria em troca de parcerias econômicas lucrativas. Exemplos incluem 25% de participação na produção dos campos de óleo e gás sob controle da Wagner & Evro Polis na Síria e mineração de ouro, diamantes, urânio e outros minerais estratégicos na CAR e no Sudão, no caso permutando por equipamento e treinamento militar e assistência político estratégica. A Wagner como ferramenta de geopolítica valoriza a ideologia russa por meio das guerras por procuração. Uma PMC que gera receita e leva a cabo a agenda russa, continuará sendo importante instrumento de política tática & estratégica.
Conclusões
O Wagner Group PMC é um eficiente mecanismo da política externa russa, atendendo a grande estratégia e a geopolítica mediante guerras por procuração e influência militar. As competências da Wagner são muitas, incluindo infantaria, artilharia, defesa antiaérea, blindados, treinamento e assistência técnica e inteligência e contra informação. A utilidade da Wagner ficou sobejamente demonstrada pelas operações na Ucrânia, Síria, República Centro Africana (CAR) e Sudão. Sendo privada e não tendo laços formais com o governo russo opera livre de fiscalização. A Wagner é um eficiente modelo de negócio, apta a se manter na Síria com a participação na produção dos campos de óleo e gás que detém. É certo que continuará sendo um poderoso instrumento da política exterior da Rússia no futuro.
FONTES DE CONSULTA
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Hume, T. (2018, February,14) Nobody Wants to Talk About the Russians Killed in US Airstrikes. Vice News. V. em https://news.vice.com/en_us/article/evmpnk/russians-killed-syria-us-airstrikes
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