Não é a primeira vez que um líder paquistanês diz ao mundo que o arsenal nuclear do país está em boas mãos. Mas, apesar das repetidas garantias, o Ocidente vem se preocupando há algum tempo com a segurança de armas atômicas do Paquistão.
O Paquistão, que realizou seus únicos testes nucleares em 1998, luta contra uma já prolongada insurgência islâmica, que ameaça paralisar o Estado. Na última década, os islamistas não só atacaram civis, mas também instalações e bases militares. Observadores dizem que o Talibã e a Al Qaeda estão de olho nas ogivas nucleares paquistantesas.
Na semana passada, o primeiro-ministro Nawaz Sharif visitou o Centro de Comando Nacional, que supervisiona as instalações nucleares paquistanesas. Ele estava acompanhado por funcionários do poderoso Exército paquistanês que, segundo analistas, tem a última palavra nos assuntos relacionados a defesa e segurança. Após a visita, o premiê disse que Islamabad quer "paz na região" e que "não fará parte de uma corrida armamentista". Ele ressaltou, ainda, que o arsenal nuclear está "bem protegido".
Segundo a especialista em questões de defesa Maria Sultan, as autoridades têm, de fato, um forte controle sobre as instalações nucleares. "O Paquistão tem capacidade de monitorar suas armas nucleares, e a tecnologia que está usando para fazer isso é muito sofisticada", opina a analista, que classifica como "infundadas" as preocupações do Ocidente.
“Talibanização dos militares”
Embora o Estado afirme que suas armas nucleares estão sob rigoroso controle, muitos especialistas em defesa temem que eles possam cair nas mãos de terroristas, caso radicais eventualmente assumam o controle de Islamabad ou se as coisas ficarem fora de controle do governo e dos militares.
"Programas nucleares nunca são seguros. Por um lado, há, talvez, um certo nervosismo exagerado sobre as bombas do Paquistão nos meios de comunicação ocidentais. Por outro, há também uma preocupação genuína", avalia Farooq Sulehria, pesquisador e jornalista paquistanês baseado em Londres. "Mas a talibanização dos militares do Paquistão é algo que não podemos ignorar."
As preocupações de Sulehria provavelmente são justificadas. Os talibãs têm demonstrado repetidamente que são capazes não só de atacar alvos civis, como também bases militares. Em agosto de 2012, um grupo armado com fuzis e lançadores de foguetes atacou uma base aérea na cidade de Kamra, na província de Punjab.
A base abriga vários esquadrões de caças e aviões de vigilância, que, segundo oficiais da Força Aérea, não foram danificados pelo ataque. O Talibã tem grande influência no inquieto Vale do Swat, no noroeste do Paquistão, e, de acordo com especialistas em defesa, várias instalações nucleares estão localizadas não muito longe da área.
Apesar disso, o analista político e de defesa Zahid Hussain garante que o Ocidente está "preocupado desnecessariamente". "O Paquistão realizou seus testes nucleares mais de 15 anos atrás. Nada aconteceu desde então. O Paquistão assegura que as armas nucleares continuam seguras", assinala.
Proliferação nuclear
No entanto, o histórico de segurança nuclear do Paquistão não é tão limpo como alega Hussain. Em 2004, o "criador" da bomba nuclear do país, Abdul Qadeer Khan, confessou ter vendido tecnologia atômica à Coreia do Norte e ao Irã.
Khan foi afastado da chefia do programa nuclear paquistanês pelo então presidente Pervez Musharraf, em 2001. Ele passou cinco anos em prisão domiciliar, depois que Musharraf mandou prendê-lo em 2004 por seu suposto papel na divulgação de segredos nucleares. Um tribunal em Islamabad determinou sua libertação em 2009.
Os líderes militares e civis paquistaneses foram acusados ??de serem condescendentes com Khan, mas se defendem, dizendo que o Estado não teve papel algum no que eles afirmam ter sido um "ato individual" de Khan. Mas muitos no Paquistão e no Ocidente acreditam que Khan só foi capaz de repassar tais informações sigilosas com apoio do regime.
Khan é popular entre ativistas muçulmanos e setores da população do país, que acreditam que as armas nucleares são "necessárias" para a segurança nacional. Partidos políticos e religiosos do Paquistão invariavelmente usam a retórica nuclear contra a Índia e os países ocidentais.
"A bomba atômica é nossa protetora. Ela garante nossa soberania. Ninguém pode atacar o Paquistão enquanto tivermos esta bomba, e essa é a razão por que os EUA, a Índia e outros países ocidentais estão conspirando contra ela", argumenta Abdul Basit, um estudante na Universidade de Karachi.
Asim Uddin, um ativista do partido islâmico paquistanês Jamaat-e-Islami baseado em Londres, é da mesma opinião. Ele argumenta que o Paquistão precisa de armas atômicas porque tem um vizinho nuclear, a Índia, contra a qual já lutou em três guerras. "O Paquistão precisa de armas nucleares como um elemento de dissuasão de guerra", acredita.
Já Sulehria diz que, embora o mundo precise ser mais vigilante a respeito das armas nucleares do Paquistão, sua obsessão nuclear tem mais a ver com a política interna do que com as ameaças externas: "Os políticos usam a retórica nuclear para apaziguar o público."
Especialistas como Sulehria temem que uma economia em ruínas, uma crescente ameaça islâmica e um discurso nuclear populista são uma receita perfeita para uma crise nuclear. Eles também dizem que o governo paquistanês precisa fazer muito mais do que apenas emitir declarações oficiais sobre a segurança atômica.
DW.DE