Os foguetes americanos de longo alcance que a Rússia afirma ter identificado no campo de batalha na Ucrânia podem se tornar um recurso estratégico para Kiev nos próximos meses, apontam especialistas.
A Rússia disse na terça-feira que havia derrubado um foguete GLSDB, de pequeno diâmetro, alta precisão e alcance de 150 quilômetros, fabricado pela companhia americana Boeing e a sueca Saab.
Mais longe
Os lançadores de foguete múltiplos americanos os quais os ucranianos dispunham até agora somente alcançam até 80 km além das linhas russas.
“Os Himars [lançadores de foguetes] já haviam forçado os russos a reorganizar seu comando e logística, tornando-os mais discretos perto do front ou forçando-os a recuar além de 80 km do front”, explica à AFP Léo Péria-Peigné, do Instituto Francês de Relações Internacionais (IFRI).
Agora, com os GLSDB móveis montados sobre caminhões ou “lagartas”, “os russos terão que encontrar outras soluções”, especialmente, duplicar as distâncias “com uma frota de veículos já limitada”.
A costa do Mar Negro controlada pelos russos também está se tornando acessível aos ataques, o que dificulta os abastecimentos russos por barco.
Os Estados Unidos anunciaram em fevereiro que entregariam os novos foguetes à Ucrânia, sem especificar um prazo, mas o governo de Kiev, no entanto, não confirmou.
Na segunda-feira, o Ministério da Defesa britânico informou 14 ataques desde 21 de fevereiro em torno da cidade de Mariupol (sob controle russo, sudeste), a mais de 80 km do front.
“É provável que a Rússia se preocupe que estejam produzindo explosões inexplicáveis em uma zona que provavelmente antes era considerada fora do alcance da capacidade de ataque ucraniana”, disse a mesma fonte.
Qual será o impacto?
O impacto militar está por vir. Cada nova arma entregue aos ucranianos traz uma diversidade de dúvidas sobre sua eficácia.
Os foguetes não são exceção, e este modelo foi testado pela primeira vez na Suécia em 2015, segundo o site da Boeing na internet.
“Este será o primeiro uso real e massivo desta arma que colocará à prova seu desempenho, especialmente em termos de precisão”, afirma Léo Péria-Peigné. Segundo seus fabricantes, tem uma precisão de ataque de um metro.
A Rússia anunciou a derrubada de um foguete GLSDB logo depois da confirmação de entrega de tanques britânicos, americanos e alemães à Ucrânia, fundamentais, segundo o governo de Kiev, para seus objetivos de reconquista militar.
“Cinquenta tanques, ainda que sejam os melhores do mundo, dificilmente podem ter um efeito estratégico, ao contrário de 10.000 GLSDB, se estes sistemas cumprirem suas promessas”, declarou o especialista francês.
Ivan Klyszcz, investigador do Centro Internacional de Defesa e Segurança (ICDS), com sede na Estônia, aponta que “a introdução de novos sistemas pode mudar a dinâmica do front”.
Mas por enquanto, “o esforço de guerra se baseia em homens e obuses”, assegura.
A entrega destes novos foguetes também mostra que, ainda que os ocidentais frequentemente hesitem antes de entregar novas armas, em muitos casos acabam fazendo.
Segundo Ivan Klyszcz, a lentidão é explicada pelas dificuldades dos aliados em concordar sobre uma estratégia comum, mas também pelo temor de atrair a ira da Rússia, ou de irritar as opiniões públicas ocidentais cansadas pelo esforço bélico.
Ucrânia usou foguetes americanos de longo alcance GLSDB, diz Rússia
A Rússia afirmou, nesta terça-feira (28), que abateu um foguete americano de longo alcance GLSDB, confirmando pela primeira vez que essas munições foram entregues à Ucrânia, que considera esse tipo de armamento crucial para lançar uma contraofensiva.
O governo de Kiev não forneceu informações sobre o emprego desse tipo de foguete, projétil de pequeno diâmetro e alta precisão.
O Ministério da Defesa russo informou que “a defesa antiaérea (…) derrubou 18 foguetes do sistema Himars e um foguete guiado GLSDB” (sigla para “Ground Launched Small Diameter Bomb”).
Esses projéteis, fabricados pela americana Boeing e pela sueca Saab, com alcance de até 150 km, podem atingir posições russas, especialmente depósitos de armas, longe das linhas de frente.
“A precisão dos GLSDB é tão elevada que podem atingir a roda de um pneu”, afirma a empresa Saab em seu site.
Relutância inicial
A Ucrânia tem insistido em que precisa deste tipo de munições para destruir as linhas de suprimento russas e contrabalançar sua falta de tropas e equipamentos, visando uma contraofensiva no sul e leste do país.
Em junho de 2022, a entrega ao exército ucraniano de sistemas de lançadores de foguetes móveis de alta precisão Himars, com munições com alcance de 80 km, permitiu a Kiev atacar as reservas do exército russo e infligir duros golpes a Moscou.
Com essa vantagem, Kiev conseguiu tomar amplos territórios do sul e nordeste da Ucrânia entre setembro e novembro.
Em resposta à ameaça dos Himars, as forças russas estenderam suas linhas de suprimento, movendo suas reservas de munição para mais longe do front.
Os países ocidentais inicialmente hesitaram em fornecer sistemas de alcance mais longo à Ucrânia, devido aos temores de que fossem utilizados para atacar o território russo, provocando uma escalada do conflito.
A Ucrânia, por sua vez, prometeu repetidamente que essas armas serão usadas apenas para atacar alvos em territórios ocupados.
Após a Ucrânia sofrer uma onda de ataques contra suas cidades e infraestruturas, os Estados Unidos anunciaram em 3 de fevereiro que forneceriam a Kiev sistemas GLSDB.
No entanto, não foi divulgado um cronograma para as entregas e algumas fontes estimaram que levaria vários meses.
Além das munições, desde o início do conflito, em fevereiro de 2022, a Ucrânia tem insistido em que precisa de centenas de tanques pesados para fazer frente à invasão.
Os países ocidentais prometeram enviar tanques de guerra, mas o número de envios parece estar aquém das expectativas de Kiev.
Na segunda-feira, o ministro da Defesa da Ucrânia, Oleksiy Reznikov, anunciou ter recebido um arsenal de tanques britânicos Challenger, veículos blindados americanos Stryker e Cougar e veículos alemães Marder.
Para a Rússia, o envio de armas ocidentais é uma prova de que os Estados Unidos e a Europa estão travando uma guerra indireta contra a Rússia.
Em resposta a essa ajuda, a Rússia anunciou que implantará armas nucleares táticas em Belarus, país vizinho da Ucrânia que emprestou seu território para a invasão russa, embora não participe do combate.
Belarus confirmou, nesta terça-feira, que abrigará armas nucleares táticas, ainda que tenha dito que seu exército não terá controle sobre o arsenal.
Além disso, o Ministério das Relações Exteriores bielorrusso afirmou que isso “não contradiz de forma alguma os artigos I e II do Tratado de Não Proliferação Nuclear”.