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ECONOMIA – Commodities queda de preço afeta o Brasil?


 

CÍNTIA JUNGES
Gazeta do Povo – PR


Durante quase uma década, o Brasil cresceu amparado no boom das commodities no mercado internacional. Agora, o recuo dos preços de alimentos e minérios acendeu um sinal amarelo no campo e na balança comercial brasileira. Embora as cotações ainda estejam historicamente altas, a queda sugere que o “superciclo” das matérias-primas está chegando ao fim. E as economias do Brasil e do Paraná não vão passar ilesas.

Consumo cresce menos e vai exigir ajuste na produção

Embora a tendência seja de queda, os preços de algumas commodities ainda estão historicamente altos – portanto, ainda vantajosos. No espaço agrícola, a perspectiva é de que a demanda continue forte, mesmo crescendo em ritmo menos acelerado. “As tecnologias de plantio e genética implementadas nos últimos anos, assim como o clima mais favorável deste ano e o aumento de áreas de plantio, contribuem para o aumento ainda mais acelerado da oferta, que terá de passar por um ajuste”, afirma o analista Pedro Dejneka. Isso sinaliza que as margens de lucro serão menores para a camada produtora, e até negativas em casos em que não houve disciplina nas estratégias de comercialização. No setor industrial, por outro lado, os usuários de commodities serão favorecidos pelos preços mais baixos. “Temos um mercado para compradores, que se beneficiam da competição entre vendedores“, afirma o analista.

País desperdiçou chance de investir, diz especialista

O fim do ciclo das commodities vai impor grandes desafios às economias dependentes de produtos primários. Os países que devem se sair melhor, na avaliação de especialistas, são os que souberam aproveitar a época de preços altos para resolver gargalos e fazer investimentos. Não foi exatamente o caso do Brasil.

Para Eugênio Stefanelo, especialista da Conab no Paraná, o país perdeu oportunidade de fazer reformas que eram fundamentais para tornar a economia mais competitiva, como, por exemplo, a reforma tributária e, principalmente, de infraestrutura. “Ciclos de alta de preço não são eternos. Temos uma carga tributária que equivale a 36% do PIB e o gasto do governo geral em investimentos em 2013 não chegou a 4% do PIB”, afirma.

Embora tenha uma situação relativamente melhor que os vizinhos da América Latina, com uma economia mais diversificada, o Brasil cresceu menos que a média da região nos últimos três anos, e tudo indica que isso vai se repetir em 2014. Enquanto a economia brasileira avançou, em média, 2,2% ao ano nesse período, países como Peru (6,5%), Equador (5,7%), Bolívia (5,7%), Chile (5,1%) e Colômbia (5%) tiveram resultados bem melhores. “Isso mostra que nossos problemas são internos”, afirma Stefanelo.

As commodities agrícolas e industriais são as mais suscetíveis. O preço da soja recuou 40% em relação a setembro de 2012, quando atingiu o pico na Bolsa de Chicago, de US$ 17,7 por bushel (27,2 quilos). Desde agosto de 2012, a desvalorização do milho chega a 60%. E o minério de ferro, carro-chefe das exportações brasileiras, perdeu quase 40% do seu valor ao longo de 2014, fechando em US$ 81,90 por tonelada na quinta-feira. A cotação do barril de petróleo também está abaixo de US$ 100 desde julho, e segue em queda.

Os preços estão caindo justamente no momento em que dependência do Brasil por produtos básicos bate recorde. Produtos primários como soja, minério de ferro, petróleo bruto, carne e açúcar somaram 50,4% do valor exportado de janeiro a agosto, a maior participação para o período desde 1978, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).

A causa da desvalorização das commodities está na relação oferta e demanda. “Os preços registrados durante o mais recente pico, de 2011 a 2013, não são sustentáveis dentro dos quadros atuais em que a produção cresce acima do consumo”, afirma o analista e sócio da PH Derivativos Pedro Dejneka, que atua em Chicago, nos Estados Unidos.

Além da recuperação dos estoques internacionais e da projeção de uma supersafra norte-americana, o apetite da China – maior importador de commodities agrícolas e minerais – não é mais o mesmo. Em 2013, o país absorveu 23% das exportações do agronegócio brasileiro. Segundo Dejneka, no momento não existe um comprador alternativo com a potência de compra dos chineses, mas há demanda global. Mesmo crescendo menos (entre 7% e 7,5% neste ano), a China ainda é um grande cliente, completa Eugênio Stefanelo, especialista da Conab no Paraná.

A desvalorização coloca um viés negativo para os principais produtos primários exportados pelo Brasil e pelo Paraná. “O agronegócio brasileiro era competitivo porque o preço das commodities estava tão elevado no mercado internacional que compensava todas as nossas ineficiências em portos, logística, transporte, legislação trabalhista anacrônica, legislação ambiental restritiva”, afirma Stefanelo. Agora, segundo ele, esses gargalos devem aparecer com mais força.

O fim do ciclo de preços altos terá efeito multiplicador, avalia Gilda Bozza, coordenadora de Conjuntura Agropecuária da Federação da Agricultura do Paraná (Faep). Menos dinheiro no campo significa menos dinheiro no comércio e nos serviços, e investimentos retidos. “Os preços podem até reagir, mas não devem voltar aos patamares anteriores. Os produtores terão de tirar a diferença em ganhos de escala, tecnologia e produtividade”, afirma.

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