Divulgação de que acordo para exportação a países da região contestados pelo autoritarismo passou de 800 milhões de euros só no primeiro semestre renova polêmica sobre destino que Alemanha dá ao armamento que fabrica.
A revelação feita nesta semana pelo governo Angela Merkel de que, só no primeiro semestre de 2013, foi aprovada a venda de 817 milhões de euros em armamento para países do Golfo Pérsico intensificou o debate sobre o destino que a Alemanha, terceiro maior exportador do setor, dá às armas que fabrica. E, a dois meses das eleições, na linha de frente da contestação está a oposição.
Terceiro maior exportador mundial de armas, a Alemanha poderá superar em 2013 seu próprio recorde. No ano passado, foi aprovada a entrega, em encontros secretos do governo federal, de mais de 1,4 bilhão de euros em armas para os seis países integrantes do Conselho de Cooperação do Golfo: Bahrein, Kuwait, Omã, Arábia Saudita, Qatar e Emirados Árabes. Só o Qatar, com apenas 2 milhões de habitantes, receberá um carregamento de 635 milhões de euros neste ano.
"Os países do Golfo não são exatamente conhecidos como lugares onde se respeita os direitos humanos", disse à Deutsche Welle Jan van Aken, deputado do partido opositor A Esquerda responsável por pedir ao governo a divulgação dos números.
Van Aken acusa Merkel de manter políticas de exportação "irrestritas". Segundo ele, o respeito aos direitos humanos é um dos critérios estabelecidos para restringir a exportação de armas na Alemanha. E tal critério, afirma, frequentemente perde lugar para os interesses da política externa do governo liderado pela União Democrata Cristã (CDU).
Berlim só costuma divulgar detalhes sobre seu comércio exterior de armas em boletins anuais, publicados apenas no ano posterior ao do fechamento dos acordos. Mas, segundo a imprensa alemã, ao Qatar serão destinados 62 tanques de guerra Leopard 2 e 24 obuses autopropulsados em 2013. De acordo com a fabricante Krauss-Maffei Wegmann, o contrato chegará a 1,9 bilhão de euros.
Em seu mais recente relatório anual, a Anistia Internacional (AI) citou uma série de casos de tortura, desrespeito aos direitos das mulheres e restrição à liberdade de expressão no Qatar.
Também na mira de organizações de direitos humanos pelo suposto uso de tortura pelas forças de segurança, a Arábia Saudita comprou da Alemanha no ano passado um recorde de 1,24 bilhão de euros em armas. Neste ano, o comércio alcançou apenas 118 milhões de euros.
Vendas ao Egito suspensas
No entanto, segundo Van Aken, isso não mostra uma mudança da política do governo Merkel– ainda há, afirma, muitos pedidos pendentes para entrega de barcos de patrulhamento e também de tanques. A imprensa alemã especula que os sauditas têm interesse em adquirir um grande número de tanques Leopard da Alemanha.
As duras críticas sobre a exportação de armas para a Arábia Saudita e o Qatar são antigas. Os dois países são liderados por regimes tidos como autoritários e enviaram tanques e soldados para reprimir, com violência, os protestos que ocorreram no Bahrein durante a Primavera Árabe, em 2011. O próprio governo saudita costuma usar a força para conter manifestações no país.
"Tudo aquilo que criticamos no Talibã provavelmente também podemos acusar a família real saudita de fazer", compara Van Aken. E isso inclui, segundo ele, a repressão à mulher, sentenças de morte e torturas.
O ministro das Finanças, Philipp Rösler, garante que o governo adota uma posição responsável na hora de aprovar pedidos de exportação de armas. No caso do Egito, por exemplo, o ministro conta que o governo decidiu suspender a análise de um pedido de compra por causa da instável situação política no país.
Em resposta aos questionamentos da oposição, o governo Merkel afirma que "todas as decisões envolvendo pedidos de exportação de armas para o Egito foram adiadas". Elas continuam em aberto "enquanto não houver razões para uma resposta imediata positiva ou negativa".
DW.DE