De volta aos Estados Unidos, Susan, uma reservista do Exército, começou a evitar estacionamentos apertados que não tenham uma saída de fácil acesso. Ela sempre anda no meio da rua, como se minas pudessem estar enterradas perto da calçada. Veículos utilitários esportivos cinzas lembram os veículos não blindados que ela costumava dirigir nervosamente por Bagdá em 2007, um ano recorde para as fatalidades dos Estados Unidos no Iraque.
"Eu costumava gostar de dirigir", disse Susan, 63. "Agora minha família não se sente segura comigo ao volante."
Para muitos veteranos de guerra, dirigir tornou-se um calvário. Primeiramente, seus problemas eram vistos como uma maneira de expressar sua raiva na estrada ou até mesmo como uma busca de emoções extremas. Mas cada vez mais, a forma irregular de dirigir dos soldados que estão retornando ao país está sendo identificada como um sintoma de desordem de estresse pós-traumático – e está causando maiores preocupações a respeito da alta taxa de acidentes entre os veteranos.
A indústria de seguros tomou conhecimento disso ao revisar os registros de dezenas de milhares de soldados, antes e após servirem na guerra. A USAA, uma seguradora usada por soldados ativos, descobriu que os acidentes de automóveis causados por membros do exército sobme 13% após seu retorno da guerra. Os acidentes foram particularmente mais comuns nos seis meses posteriores a um período no Iraque, de acordo com análise feita do período entre 2007 e 2010.
A empresa está agora trabalhando em parceria com pesquisadores, as Forças Armadas e grupos da indústria de seguros para expandir a pesquisa e educar as pessoas melhor sobre a questão. O Exército diz que os acidentes fatais – que aumentaram no início da guerra – têm diminuído nos últimos anos, em parte pela melhoria na educação. Ainda assim, 48 soldados morreram em acidentes de veículo enquanto estavam de folga no ano passado, o maior número de incidentes nos últimos três anos, de acordo com as estatísticas do exército.
O Pentágono e o Departamento de Assuntos dos Veteranos também estão apoiando vários novos estudos sobre as potenciais ligações entre aqueles que serviram na guerra com a condução perigosa agressiva ou excessivamente defensiva. O Centro para Assuntos Veteranos em Albany, Nova York, iniciou um programa de sete sessões terapêuticas que ajuda os veteranos a identificar como experiências de guerra podem desencadear reações negativas enquanto dirigem. Além disso, pesquisadores em Palo Alto estão desenvolvendo terapias – que esperam transformar em aplicativos para iPhone – para pessoas com desordem de estresse pós-traumático que estejam frequentementes irritadas ou ansiosas ao volante.
"Eu não conheço alguém que tenha servido na guerra e voltado sem que me conte sobre problemas que enfrenta ao dirigir", disse Erica Stern, professora de terapia ocupacional da Universidade de Minnesota, que está conduzindo um estudo nacional para o Pentágono sobre os problemas que pessoas com desordem de estresse pós-traumático têm enfrentado na hora de dirigir.
Apesar do problema ao volante entre os veteranos de guerra não ser novidade – a pesquisa descobriu que veteranos que serviram na Guerra do Vietnã (1955-1975) e na Guerra do Golfo (1990-1991) estavam mais propensos a morrer em acidentes de automóveis do que veteranos que não foram à guerra – especialistas dizem que os veteranos do Iraque e do Afeganistão são um caso diferente, por um único motivo: suas experiências de combate eram frequentemente definidas por perigos nas estradas, particularmente bombas implantadas na beira delas.
"Não existe nenhum tratamento para isso", disse Steven H. Woodward, um psicólogo clínico do Centro de Saúde para Veteranos de Palo Alto, que está conduzindo um estudo de terapias para os veteranos com desordem de estresse pós-traumático que tenham problemas relacionados ao volante. "Esse é um fenômeno novo".
Embora tenham sido feitas algumas pesquisas sobre o comportamento irregular de condução entre os veteranos, apenas recentemente terapeutas e psicólogos começaram a entender a desordem de estresse pós-traumático como um fator importante no prolongamento desses problemas, provavelmente por levar as pessoas a encontrarem ameaças onde elas não existem – como em túneis, viadutos, locais de construção ou detritos no meio da rua.
"Em uma situação ambígua, eles tendem a enxergar mais o lado hostil", disse Eric Kuhn, um psicólogo Centro de Saúde para Veteranos de Palo Alto, que estudou os problemas dos veteranos ao conduzir um automóvel. Ele disse que sua pesquisa descobriu que os veteranos que relatam sintomas mais graves de desordem de estresse pós-traumático também tendem a ser motoristas mais agressivos.
Os especialistas observam que os problemas ao volante não são sempre resultado da desordem. Em alguns casos, os soldados podem sofrer do reflexo da aplicação de técnicas de condução aprendidas no Iraque durante o auge da insurgência – por exemplo, acelerando nos cruzamentos para evitar tiros ou a busca de perigos na estrada ao invés de observar a estrada à frente.
Em um estudo feito com os soldados da Guarda Nacional de Minnesota, que voltou do Iraque em 2007, Stern e seus colegas de pesquisa descobriram que quase um quarto dos soldados que participaram dos combates disseram ter passado por sinais vermelhos e quase um terço deles disseram que voltaram dirigindo bem pior do que antes de terem ido para guerra. Ambos os resultados foram maiores do que as respostas relatadas pelos cadetes da Guarda Nacional que não haviam participado dos combates.
Embora o problema pareça ter diminuído com o passar do tempo, eles nem sempre desapareceram. Stern revelou que muitos dos membros da Guarda ainda ficam preocupados com certas situações que encontram nas ruas, incluindo dirigir à noite ou passar por situações inesperadas atrás do volante. "Essas são coisas que eles associam com as ameaças que enfrentaram no campo de batalha ", explicou.
Susan, uma avó de quatro netos, foi enviada para o Iraque com 60 anos de idade, onde um de seus trabalhos era levar grandes somas de dinheiro para projetos de reconstrução do país fora das bases fortificadas americanas. Ela disse que aprendeu a ser muito cuidadosa durante essas viagens.
Ao voltar para a Califórnia, lutou com a desordem de estresse pós-traumático e tirou uma folga de seu trabalho como enfermeira. Ela também notou que se sentia nervosa pela primeira vez em sua vida sobre quando ia dirigir – um grande problema, pois ela tinha que dirigir para visitar seus pacientes. "Meu comportamento ao dirigir mudou", disse. "Eu vivo em um constante estado de ansiedade quando estou dirigindo."
Susan participou recentemente de um teste clínico para desenvolver e testar terapias, tais como a da respiração profunda, para que os soldados possam superar essas ansiedades. Em um Pontiac Bonneville cheio de equipamentos para acompanhar o foco visual do motorista, assim como sua frequência cardíaca e respiratória, bem como medir mudanças na velocidade e da direção do carro, os pesquisadores levam pacientes para estradas locais e observam suas reações aos perigos do tráfego, reais e imaginários.
Em uma sessão recente, enquanto Max dirigia por Palo Alto, Woodward monitoravas seus batimentos cardíacos e respiração em um laptop no banco de trás. Na frente, Marc Samuels, um especialista em reabilitação ao volante que oferece um dos poucos programas do país que foca apenas em problemas relacionados a motoristas com desordem de estresse pós-traumático, acompanhou Max ao longo de uma rota pré-planejada, preparado para agarrar o volante, caso alguma coisa desse errado.
Durante boa parte do trajeto, Susan dirigiu muito bem, mas ela ficou um pouco assustada ao passar por um canteiro de obras e depois novamente quando dois carros momentaneamente bloquearam sua passagem. Finalmente, quando seu nível de estresse chegou ao máximo em um pequeno estacionamento, Samuels lhe pediu para parar o carro e recuperar sua compostura.
Susan disse que as sessões a tornaram mais consciente das coisas que a deixam nervosa, um primeiro passo para conseguir superá-las. Mas ela diz que não acredita que vai se sentir verdadeiramente confortável dirigindo de novo e não tem planos para substituir seu querido Mustang, que vendeu pouco antes de ser enviada para o Iraque. "Para que ter um carro legal?", questiona. "Se eu não vou conseguir curti-lo.”
Por James Dao