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Brasil e Alemanha assinam cooperação para combater tráfico de drogas

Ministra alemã do Interior se encontrou em Brasília com ministro Lewandowski, da Justiça. Declaração prevê atuação conjunta contra o crime organizado, tema de viagem que inclui ainda Peru, Equador e Colômbia.

(DW) Os ministérios alemão do Interior e brasileiro da Justiça e Segurança Pública assinaram nesta segunda-feira (26/02) em Brasília uma declaração conjunta de intenções para aprofundar a cooperação entre os dois países no combate ao crime organizado e ao tráfico de drogas.

O documento prevê ainda ações de combate ao tráfico de armas e de pessoas, à lavagem de dinheiro e a crimes ambientais, por meio de investigações conjuntas entre os dois países, troca de informações entre autoridades e apoio a programas de formação e aperfeiçoamento das forças policiais.

Em Brasília desde domingo como parte de um roteiro que incluirá ainda Peru, Equador e Colômbia, a ministra alemã do Interior, Nancy Faeser, deu entrevista ao lado do ministro Ricardo Lewandowski e enfatizou a preocupação da Alemanha com o tráfico de cocaína – no ano passado, o país apreendeu 35 toneladas da droga, a maioria no porto de Hamburgo.

“Vejo com grande preocupação a importação massiva de cocaína da América Latina. Essa droga destrói pessoas e entrega enormes lucros ao crime organizado”, declarou Faeser.

A social-democrata afirmou ainda querer contribuir para reverter “a influência destrutiva dos cartéis de drogas” na região e conter a violência que eles provocam – também na Europa. Isso requer, segundo a ministra, “uma ação mais dura e melhor coordenada internacionalmente contra o tráfico de cocaína e de outras drogas”.

Segundo Lewandowski, o Brasil está interessado em aplicar a inteligência artificial no combate ao crime organizado, “especialmente em relação ao narcotráfico e à lavagem de dinheiro”.

Apreensões recordes de cocaína em portos europeus

Recentemente, o prefeito de Hamburgo, Peter Tschentscher, viajou junto com os prefeitos de Rotterdã (Holanda) e Antuérpia (Bélgica) à Colômbia e ao Equador para discutir uma estratégia conjunta de combate ao tráfico.

No ano passado, a apreensão de cocaína no porto belga chegou a 116 toneladas; na Holanda, esse número foi de 59 toneladas.

O Equador, que esteve no roteiro dos prefeitos e está no roteiro de Faeser, está em estado de exceção desde o início de janeiro, quando o presidente Daniel Noboa anunciou medidas para controlar prisões e combater organizações criminosas.

Alemanha busca aliados na América do Sul contra o tráfico

A ministra do Interior da Alemanha, Nancy Faster, realiza nesta semana uma visita à América do Sul em busca de aumentar a cooperação no combate ao crime organizado. Nos últimos anos, o tráfico transatlântico se intensificou em uma série de portos, algo que é notório pelo aumento dos volumes de apreensões dos dois lados do oceano. E com a droga, a violência também avança em ambos os continentes.

Em 2023, ocorreu em Hamburgo a maior apreensão de cocaína no continente europeu daquele ano, com um valor de mercado estimado em US$ 3,5 bilhões. Outros países europeus tradicionalmente com menor presença do crime organizado, como Holanda e Bélgica, também registraram um aumento de ações criminosas, especialmente em cidades portuárias como Roterdã e Antuérpia. Somente no porto belga foram apreendidas 116 toneladas de cocaína em 2023, um valor recorde, mas que corresponde a uma pequena fração do volume real enviado.

Do outro lado do Atlântico, houve uma mudança de escala com um boom na quantidade de drogas que passa por portos brasileiros e chega ao continente europeu, o que é medido pelo volume de apreensões, afirma a socióloga Isabela Vianna Pinho, doutoranda na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), que estuda mercados ilegais e portos.

Além de Santos, o maior porto da América Latina, outras zonas portuárias brasileiras como Paranaguá registraram um grande aumento nos envios de drogas. Na região, além das zonas de emissão tradicionais como as cidades colombianas, Guayaquil, no Equador, se notabilizou nos últimos anos pela forte presença de organizações criminosas usando suas rotas marítimas para envios de droga. Na Argentina, o município portuário de Rosário vivenciou um fenômeno semelhante.

“O fluxo enorme de mercadorias nestes portos dificulta a fiscalização e impulsiona o uso destas rotas pelos criminosos. É estratégico para os traficantes usarem estas estruturas já existentes”, explica Vianna Pinho. A pesquisadora lembra o volume de milhares de containers que passam diariamente por estes portos, o que dificulta o trabalho de verificação.

Aumento de violência e riscos de narcoestados

Em janeiro, a prefeita de Amsterdã, Femke Halsema, alertou sobre o risco de a Holanda se tornar um narcoestado em um artigo publicado no jornal britânico The Guardian. “Estimulado pela globalização e pela criminalização internacional, o comércio ilegal de drogas se tornou mais lucrativo, profissional e implacavelmente violento. Os efeitos foram desastrosos. Na última década, o porto de Roterdã, o maior da Europa, se tornou um centro de trânsito global para a cocaína”, escreveu.

Segundo Vianna Pinho, o aumento da sensação de insegurança está relacionado com a ampliação da escala da circulação de cocaína de forma transnacional. “Historicamente, a violência ficava concentrada nos países produtores da droga. Recentemente, houve uma expansão, e os conflitos estão afetando até mesmo os países europeus”, afirma.

Nos últimos anos, disputas entre grupos criminosos levaram a tiroteios e execuções em vias de públicas em cidades tradicionalmente pacíficas da Europa. Em seu relatório anual sobre o mercado de cocaína de 2023, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) apontou que “a utilização ou ameaça de violência por parte de redes criminosas é uma preocupação crescente na Europa”. Nos últimos anos, registou-se um aumento de incidentes violentos graves associados ao crime organizado, especialmente nos mercados de droga, em alguns países da União Europeia e regiões vizinhas, ressalta o documento

“Os riscos envolvidos para os países europeus são bem conhecidos na América Latina. São necessárias cada vez mais medidas de cooperação global para contê-los, já que não se trata de um problema local”, avalia Vianna Pinho.

Aumento de áreas de atuação

Nos últimos anos, os grupos envolvidos no narcotráfico na América Latina passaram a expandir suas áreas de atuação, em um fenômeno semelhante às máfias europeias. Além disso, eles passaram a operar em uma série de países, replicando modelos de empresas multinacionais tradicionais.

“O mercado das drogas está se transformando. Os grupos narcotraficantes têm outras fontes de recursos emergindo, como o garimpo ilegal de ouro”, afirma Daniel Bonilla Calle, professor de negócios internacionais da Fundação Universitária CEIPA de Bogotá. O avanço dos criminosos nestas áreas outras de atuação é apontado como um elemento importante para uma série de problemas ambientais, como o desmatamento na Amazônia.

As extorsões são outra fonte importante de financiamento das organizações criminosas na região, e a expansão de ramos de atuação envolve até o cultivo de abacates, no caso do México. “Poderíamos dizer que hoje, 60% dos recursos seguem vindo da droga, enquanto 40% vem de outras receitas”, estima Bonilla Calle.

“Uma das características destas organizações é a transnacionalidade, o que foi facilitado recentemente pela tecnologia, assim como no caso das empresas tradicionais”, afirma Bonilla Calle. “Não é possível atacar o crime organizado sem redes muito bem estruturadas de colaboração entre autoridades de vários países”, avalia.

Aumento de cooperação

Em Brasília, após uma reunião com o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, a ministra alemã afirmou que a cooperação entre os países já está a funcionando bem. “Queremos aprofundar ainda mais”, acrescentou. Ainda na região, Faeser viajará para Colômbia e Peru, os dois maiores produtores de cocaína do mundo, e para o Equador, que enfrenta uma grave crise de segurança devido ao narcotráfico.

“Vejo com grande preocupação a importação massiva de cocaína da América Latina. Essa droga destrói pessoas e entrega enormes lucros ao crime organizado”, declarou Faeser.

A ministra disse quer ajudar a “repelir a influência destrutiva dos cartéis de drogas nos países de origem”, referindo-se à destruição ambiental, à violência e à corrupção. “Os grupos criminosos exercem uma espiral de violência inacreditável – mesmo no centro da Europa”.

Além de Faeser, o prefeito de Hamburgo, Peter Tschentscher, esteve recentemente na Colômbia e Equador juntamente com os seus homólogos de Roterdã e Antuérpia para discutir estratégias conjuntas na luta contra o tráfico de drogas com as autoridades de segurança locais.

“A cooperação é importante, mas sabemos que muitas vezes as medidas tradicionais do Estado acabam gerando mais violência. Não se veem muitas medidas alternativas além da postura proibicionista”, avalia Vianna Pinho. Em sua visão, a postura tradicional de combate ao crime focada em apreensões não vem demonstrando resultados efetivos.

Para a pesquisadora, uma maior regulação dos mercados pode ser uma alternativa mais eficaz que as atuais abordagens, além de ser necessário incrementar a cooperação para ações de inteligência. Em seu artigo no The Guardian, a prefeita de Amsterdã citou a regulação do mercado, os monopólios governamentais ou a provisão para fins médicos como algumas das alternativas possíveis para lidar com a questão.

ra/as (DPA, AFP, ots)

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