Camila Viegas-Lee e João Fellet
Na reunião do Conselho, serão discutidos os próximos passos do Conselho diante da violência na Síria, que já deixou 1,7 mil mortos e milhares de detidos desde o início dos protestos contra o governo, em março. A família Assad está no poder há 41 anos.
Segundo diplomatas brasileiros, o Itamaraty defenderá medidas de pressão sobre Damasco para que interrompa a violência e implemente as promessas de transição à democracia.
No entanto, o governo avalia que é necessário dar tempo para que Assad mostre sinais de seriedade e organize um processo eleitoral que permita ao país deixar o modelo unipartidário.
Para a diplomacia brasileira, uma escalada de sanções individuais contra a Síria também seria negativa e poderia provocar ainda mais divisão no país, impondo obstáculos ao fim dos confrontos.
O Brasil prega ainda que os membros do órgão se mantenham coesos e que os elementos contidos na declaração presidencial aprovada pelo Conselho em 3 de agosto – que condena o uso das Forças Armadas contra os manifestantes e exige a implementação de uma democracia multipartidária – sejam cobrados insistentemente.
Ainda que todos os 15 membros do Conselho, no qual o Brasil detém assento rotativo, defendam o fim da violência na Síria, há diferentes opiniões sobre como alcançá-lo.
Na semana passada, a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, exortou todos os países a cortar laços políticos e econômicos com Damasco.
Segundo Hillary, ao comprar petróleo e gás natural da Síria e lhe vender armas, os países dão a Assad fôlego para manter a repressão.
Os EUA, que já cobraram a renúncia do líder sírio, impuseram sanções unilaterais a Damasco e têm estimulado outros países a adotar medidas semelhantes.
Países europeus também adotaram sanções, e mesmo nações do Oriente Médio têm se posicionado contra Assad.
Neste mês, a Arábia Saudita, o Bahrein e o Kuwait convocaram seus embaixadores em Damasco (medida diplomática que expressa reprovação à postura do governo sírio), e o chanceler turco, Ahmet Davutoglu, disse que os métodos das forças de segurança sírias eram "inaceitáveis".
Missão humanitária
Na reunião desta quinta, também deve ser anunciado o envio de uma missão humanitária do Escritório para a Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU (Ocha, sigla em inglês) à Síria, com o qual o governo sírio teria concordado.
Em abril, o Conselho de Direitos Humanos da ONU aprovou uma resolução em que condenou a repressão a manifestantes e pediu o envio de uma missão para investigar supostos crimes cometidos pelas forças de segurança sírias. No entanto, Damasco tem se recusado a receber a missão investigativa.
Para o Itamaraty, a aceitação do governo sírio a uma missão humanitária e a entrada da imprensa internacional representariam dois passos positivos em direção à solução dos conflitos.
Diplomatas brasileiros se opõem, no entanto, a ações mais incisivas, dizendo que elas poderiam desencadear reações indesejadas, como incentivar a oposição a rejeitar ofertas de diálogo e a exigir a queda da Assad – o que aumentaria o risco de confrontos.
Além disso, os diplomatas acreditam que medidas mais duras sinalizariam ao líder sírio que a comunidade internacional teria lhe fechado as portas, não lhe dando outra alternativa que não combater a oposição até o final.
Além de esperar que o governo Assad dê provas de seriedade e tome ações concretas, o governo brasileiro deseja que as decisões do Conselho de Segurança tenham respaldo regional e convençam mais membros da oposição síria a se engajar num diálogo com o governo com vistas a um entendimento.
Em 10 de agosto, uma delegação do grupo Ibas, integrado por Brasil, Índia e África do Sul, reuniu-se com Assad em Damasco. No encontro, o grupo pediu que o governo sírio considerasse a resolução do Conselho de Direitos Humanos.
O grupo comunicou que é fundamental que o regime dê prosseguimento ao diálogo nacional e às reformas políticas, com o objetivo de atender às aspirações da população.
No encontro, o ministro para os Negócios Estrangeiros e Expatriados, Walid Al-Moualem, respondeu que a Síria será uma democracia livre, pluralista e multipartidária até o fim do ano e que um comitê jurídico independente foi formado para investigar a violência.
O Brasil quer aguardar o relatório desse comitê para saber se o país terá condições de julgar e punir os responsáveis pela violência. O Itamaraty acredita, no entanto, que a simples criação do comitê dá margem para que a comunidade internacional exija a responsabilização dos culpados e a imparcialidade do órgão.
Críticas ao Brasil
Embora elogiem a iniciativa do Brasil em buscar uma solução para o impasse na Síria, ONGs internacionais têm criticado a recusa da diplomacia brasileira em exercer uma pressão maior sobre Damasco.
Para a diretora da Human Rights Watch Peggy Hicks, o Brasil deveria se esforçar para que o governo sírio autorize o acesso da missão de investigação.
Hicks rejeita o argumento da diplomacia brasileira de que a adoção de medidas mais duras poderia levar à intensificação dos confrontos.
"Mesmo sem essas medidas, a situação já vem se deteriorando. É hora de dar passos adiante", disse à BBC Brasil.
Segundo ela, está claro que a Síria não acatou as sugestões do grupo Ibas, que ela classificou de "bem intencionadas".
Camila Asano, coodenadora de política externa e direitos humanos da ONG Conectas, diz que o governo brasileiro e o Ibas têm usado uma "linguagem branda demais" ao tratar da violência na Síria.
Ela condenou uma declaração do Ibas em que as decisões do governo sírio diante dos confrontos foram classificadas como "erros".
"Não foram erros, foram claras violações dos direitos humanos", diz.
Asano afirmou, no entanto, concordar com a cautela com que o Itamaraty tem tratado a ideia de uma possível intervenção militar na Síria, similar à que hoje ocorre na Líbia.
"Mas não é por condenar medidas coercitivas que o Brasil deve adotar um tom brando, que deixe o governo sírio numa posição confortável para manter a repressão", diz.