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Armas do Brasil violam embargo, afirma ONU

Roberto Simon 
 
Investigadores das Nações Unidas encontraram armamento não letal de fabricação brasileira na Costa do Marfim, em violação ao embargo imposto pelo Conselho de Segurança. A informação está em um relatório apresentado em outubro ao órgão máximo da ONU, com documentos confidenciais da empresa Condor, a fabricante das armas, e fotos do arsenal "made in Brazil" descoberto. 
 
O governo brasileiro alegou aos investigadores internacionais que as armas foram vendidas a Burkina Faso, e não à Costa do Marfim. O Itamaraty enviou à ONU o contrato de venda entre o governo burquinen-se e a Condor – assinado pelo diretor comercial da companhia, Ricardo Bester o qual proibia a reexportação das armas. O relatório das Nações Unidas não chega a uma conclusão sobre como elas foram parar no território marfinense. 
 
O pacote vendido pela empresa incluiu 700 lançadores de granadas não letais e milhares de projéteis, ao custo de cerca de R$ 2,7 milhões. As armas foram destinadas diretamente ao "Estado-maior particular da presidência" do país do oeste africano, segundo os documentos obtidos pela ONU. O embaixador de Burkina em Brasília, Alain Ilboudo, disse que não estava "informado" sobre o caso e deixou sem resposta as perguntas do Estado. 
 
O Conselho de Segurança da ONU impôs o embargo de armas à Costa do Marfim em 2004, tentando frear uma guerra civil que se estendia por quase cinco anos. A situação marfinense, porém, continua altamente volátil: em 2011, o presidente Laurent Gbagbo recusou-se a reconhecer a vitória nas urnas do rival Alas sane Ouattara, e o país voltou a ser palco de batalhas de rua e massacres. Em abril daquele ano, tropas francesas intervieram e prenderam Gbagbo. 
 
Em uma aparente coincidência, cinco dias após a publicação do relatório da ONU informando sobre as armas brasileiras, a Casa Civil em Brasília publicou o decreto, assinado pela presidente Dilma Rousseff, que renovava o compromisso com o embargo internacional à Costa do Marfim. 
 
Riscos. Para Daniel Mack, da ONG Sou da Paz, o governo brasileiro também deve ser responsabilizado. "A existência de uma rota de tráfico entre Burkina Faso e a Costa do Marfim é notória", afirma Mack, que diz ser "impossível ignorar os riscos" de uma operação desse tipo. Além da Costa do Marfim, o território burquinense faz fronteira com o Mali, país que foi palco de uma guerra civil e uma intervenção militar europeia este ano. 
 
Alegando obrigações contratuais, a Condor se recusou a comentar a venda sob investigação da ONU. A empresa, que exporta armas não letais para 40 países, disse ainda que "jamais foi notificada" por autoridades nacionais ou internacionais sobre o caso. No entanto, o Ministério da Defesa afirmou que, após os funcionários das Nações Unidas encontrarem o arsenal na Costa do Marfim, a Condor foi consultada e "ratificou ter exportado" o armamento a Burkina Faso. 
 
Dentro do governo brasileiro, as explicações sobre quem deve responder pelo caso são contraditórias. A pasta da Defesa, que supervisiona exportação de qualquer tipo de armamento, disse que sua "responsabilidade é compartilhada" com o Itamaraty. 
 
O Ministério das Relações Exteriores confirmou ter enviado as informações à ONU, mas disse que não participou diretamente da decisão de exportar o material a Burkina Faso. A chancelaria alega que o fato de se tratar de armas não letais a isenta de participar da decisão final sobre a venda.
 
A ONG Sou da Paz rejeita a ideia de que a exportação desse tipo de armamento merece tratamento mais brando. "Não existe "armamento não letal": as armas em questão podem ser "menos letais", mas, em mãos despreparadas, criminosas ou irresponsáveis, podem causar ferimentos sérios e até a morte, como se viu diversas vezes", afirma Mack, citando como exemplo o uso de armamento da Condor em países do Oriente Médio durante a Primavera Árabe e nos protestos de junho no Brasil. 
 
Armas brasileiras no Bahrein e Turquia 
 
Armamento não letal da empresa Condor, do Rio de Janeiro, já foi empregado contra manifestantes em países da Primavera Árabe, como o Bahrein, e refugiados sírios na Turquia. A empresa diz exportar seus produtos para 40 países, mas se recusa a detalhar quem são os clientes, alegando restrições contratuais. 
 
No caso do Bahrein, os lançadores e projéteis de gás lacrimogêneo fabricados no Brasil haviam sido vendidos à Arábia Saudita, cujas tropas atuaram para reprimir os manifestantes que pediam mais liberdade política no pequeno reino vizinho. Armamento da Condor também foi usado contra turcos que em maio ocuparam a Praça Taksim, em Istambul. 

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