Paul Mason
A noite deste domingo pode provocar uma tempestade na Europa: instabilidade política completa na Grécia, um novo presidente francês eleito em meio a uma onda de oposição ao plano de austeridade "Merkozy", crescimento econômico despencando no continente e, por toda parte, o fortalecimento dos partidos não-centristas.
Em dezembro, depois que a desastrosa cúpula de Cannes desencadeou uma segunda crise da dívida na zona do euro, os países da UE finalmente se comprometeram com algum tipo de união fiscal.
O preço definido pela Alemanha e seus aliados do norte da Europa foi um novo tratado fiscal, assinado por 25 dos 27 membros da UE, que exigia orçamentos equilibrados pela eternidade e forçava alguns países a pisar no freio para cumprir a meta de 2014.
Austeridade obrigatória para um continente que já escorregava na direção da recessão. Mas resolveram dourar a pílula.
Soro
O Banco Central Europeu, que sempre havia resistido à flexibilização monetária quantitativa e a participar de planos de resgate em todo o continente, de repente abriu as torneiras concedendo três empréstimos de longo prazo aos bancos com taxas de juros de 1% e vencimento de três anos.
Isso foi como colocar um paciente muito doente no soro. Removeu a ameaça imediata de contágio da Grécia, e propiciou uma verdadeira operação de resgate daqueles que deram empréstimos à Grécia, mas não dos próprios gregos.
Isso, combinado à imposição de governos não-eleitos na Grécia e na Itália, e à eleição de um governo de direita pró-austeridade na Espanha, pareceu acalmar as coisas.
Então, por que elas voltaram a entrar em erupção?
Resultados limitados
Em primeiro lugar, a adoção da austeridade por todo o continente parece ter afogado o que havia sobrado da recuperação da UE. A zona do euro entrou em recessão no fim do ano passado, está em recessão agora e parece que vai permanecer em recessão por, pelo menos, mais três meses.
Apesar de os bancos parecerem mais seguros, isso acontece às custas de uma redução do crédito, o que prejudica empresas e a confiança do consumidor.
Em segundo lugar, a injeção de dinheiro nos bancos teve resultados limitados. Eles depositaram a maior parte do dinheiro de volta no Banco Central Europeu com taxas de juros de 0,25%. Há indicações de que os empréstimos interbancários caíram e de que o crédito bancário para a economia real está em território negativo.
Em terceiro lugar, esgotou-se o tempo para o governo tecnocrata imposto, pelo menos na Grécia.
Caos grego?
As pesquisas eleitorais gregas indicam que as forças combinadas dos dois principais partidos alcançam 37%, com cerca de outros 37% para a esquerda (comunistas, trostkistas, eurocomunistas e verdes) e com o voto cristão nacionalista de direita despencando para 3% em favor dos fascistas do Amanhecer Dourado (5%), que apenas quatro anos atrás tinham deixado de existir.
Se nenhum partido conseguir o número de votos necessário para governar e as eleições trouxerem apenas o caos político no país, pode haver um novo pleito, ou talvez algum tipo de golpe presidencial leve, ou mesmo um governo de esquerda que não tenha se comprometido apenas a lutar contra a austeridade, mas também, tecnicamente, a socializar a economia.
Nos dois últimos casos, isso colocaria em risco não apenas a permanência da Grécia na zona do euro, mas também a habilidade de cumprir o Tratado de Copenhague (que estipula que integrantes da União Europeia devem ser democracias) e o Tratado de Lisboa (que proíbe nacionalizações de estilo socialista).
Independente do que ocorra politicamente, parece claro que o “acordo” para Grécia reduzir sua dívida para 120% de seu PIB até 2020 por meio de enormes cortes e aumentos de impostos não será cumprido e o caminho para um calote está aberto, seguido de sua saída da zona do euro ou a criação de algum tipo de participação menor.
No entanto, por mais doloroso que seja para os gregos, a tragédia do país é apenas sinal dos problemas que devem afligir a combalida Europa.
A Espanha tem 25% de desempregados entre sua população de adultos. Seus bancos balançam próximos de outro pacote de resgate financeiro, reduzindo em grande escala os empréstimos para a economia real e o país pode ser forçado a buscar, para si mesmo, dinheiro de resgate do Fundo Europeu de Estabilização Financeira, o fundo interino do bloco.
Saída
Então nós chegamos à segunda-feira e o que acontece? Os mercados acreditam que Hollande ganhe, mas também que ele não deve cumprir suas ameaças de renegociar o pacto fiscal e os principais partidos gregos devem formar uma nova coalizão que mantenha o país de pé.
Mas a revoada dos votos europeus abandonando os centristas está mudando as coisas. A classe política estabelecida há décadas ao redor de partidos de centro, pró-globalização já percebe em alguns países estar próxima de um terremoto político.
O crescimento da direita nacionalista em Holanda, Dinamarca, Finlândia, Itália, etc sempre pareceu possível de ser contida, ou excluída por coalizões mais ao centro.
Mas se estas coalizões centristas não governam a contento, ou fazem exigências duras demais à direita nacionalista, então os governos europeus, um de cada vez, são forçados a formar novas coalizões engessadas pelos tecnocratas e protegidas contra os extremistas.
A situação se tornaria frágil quando os governos todos forem comandados por tecnocratas.
A saída, claro, é conseguir crescimento. Essa foi a promessa do pacto fiscal original e o que Hollande, além de, e por exemplo, os socialistas portugueses (e de forma mais sutil o FMI) se referiu quando pediu por cláusulas de “acentuação de crescimento” nos planos de austeridade.
Mas isso não vai acontecer a não ser que alguém estimule a demanda: seja uma recuperação rápida no resto do mundo (os EUA estão claramente em recuperação). Uma resolução sem demora da crise bancária, uma mudança radical da política fiscal por pressão de eleitores não centristas ou uma mudança rápida em direção à políticas de desregulamentação de mercado livre defendidas pelo lobby bancário, efetivamente decretando o fim da “Europa social”.
Destes fatores, apenas a recuperação externa está fora do alcance da elite política europeia e (talvez não por coincidência) a única provável de acontecer.