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América Latina e Israel


MAC MARGOLIS

Há poucos meses, quando a Faixa de Gaza ainda estava coberta de azul e não de pólvora, tudo corria bem entre Israel e seus novos melhores amigos nas Américas. O primeiro-ministro Binyamin Netanyahu anunciara um plano de US$ 14,5 milhões para fortalecer os laços econômicos com a América Latina. Israel acabara de reabrir sua embaixada no Paraguai, fechada há uma década, e de abrir novos consulados no continente.

Israel ainda comemorava sua integração, como estado observador, à Aliança do Pacífico, o mais novo bloco comercial sul-americano, e um pacto bilateral com a Colômbia, a estrela emergente das economias latinas. "Eu teria orgulho se chamassem meu país do Israel da América Latina", afirmou o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, à época.

Foi bom enquanto durou. Com a recente operação Limite Protetor, na Faixa de Gaza, Netanyahu comprou um abriga também no outro lado do Atlântico. Hoje, a América Latina engrossa o refrão global contra a ofensiva israelense, da praça pública à internet.

A presidente Dilma Rousseff, que começa a gostar do jogo internacional, criticou o "massacre" da ofensiva "desproporcional". Veio a resposta de Yigal Palmor, porta-voz do chanceler israelense, que desdenhou o Brasil como país "irrelevante" na diplomacia.

Malandragem do israelense. A ofensa foi, na verdade, um plágio de Jorge Castañeda, ex-ministro das Relações Exteriores do México, que em entrevista ao Estado, estranhou o melindre do Brasil frente aos flagrantes de censura e abusos de direitos humanos na Venezuela. Uma postura digna de um "gigante econômico e anão moral", disse.

Mas os latinos fecharam com Brasília. Na última cúpula do Mercosul, em julho, os países do bloco clamaram à ONU para investigar os "crimes de guerra" de Israel. Em poucos dias, Argentina, Chile, El Salvador e Peru chamaram seus embaixadores em Tel-Aviv para consultas e o Congresso chileno congelou as negociações de um tratado bilateral de comércio.

Os países bolivarianos não deixaram por menos. O presidente venezuelano, Nicolás Maduro, ofereceu receber palestinos, vítimas dos ataques à Gaza. Evo Morales decidiu exigir vistos para visitantes israelenses, rasgando um acordo de fronteiras abertas de 1972.

O mau humor diplomático ainda promete. Mas até quando? Quem apostar no cancelamento de tratados e acordos comerciais pode se dar mal. Israelenses e latinos têm laços compridos e ninguém está a fim de desatá-los. Sem os países da América do Sul e Central, talvez Israel nem existisse. Dos 33 votos exigidos para a criação do Estado Judeu, em 1947, 12 vieram dos latinos.

O elo comercial cresce a cada ano. À América Latina, Israel vende US$1,5 bilhão por ano em eletrônicos, maquinaria agrícola, medicamentos e consultoria em segurança. Destaque para os US$604 milhões em armamentos.

Já a diplomacia tomou um caminho mais acidentado. A partir da década de 70, a América Latina abraçou a causa palestina e, na década passada, se uniu em favor da criação de um Estado Palestino.

Com a ascensão do caudilhismo pelo continente, o libelo anti-Israel tornou-se estridente, quando não sinistro, como na Argentina, onde o comentarista da rede CNN, Pedro Brieger, justificou o assassinato de três jovens israelenses por extremistas em Gaza.

A fúria impressiona, mas muitas vezes, toma ares de uma querela fora de lugar, na qual a imagem de Israel se confunde com a dos EUA. "Alguns líderes populistas do momento têm pouco discernimento do cenário internacional e jogam para a plateia interna", diz Jaime Aparicio, ex-embaixador boliviano em Washington. Em tempo: Nicolás Maduro foi à TV para bradar contra Israel pela destruição de "mais de 50 sinagogas…Perdão, mesquitas".

Enquanto a conflagração em Gaza continua, o tiroteio contra Israel pode até crescer, com mais algumas baixas. No campo de retórica.

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