O general alemão da reserva Egon Ramms, ex-comandante da Otan que foi responsável pela supervisão das operações no Afeganistão, afirmou nesta terça-feira (30/12) que militares alemães coletaram informações para serem usadas nos chamados assassinatos seletivos [targeted killing] de rebeldes talibãs no Afeganistão.
Ele disse que as tropas alemãs no Afeganistão estavam numa situação de guerra, e que a opinião pública do país não foi enganada sobre a dimensão da participação alemã no conflito.
Já o Ministério alemão da Defesa afirmou que as informações coletadas por militares alemães ajudaram a selecionar e identificar possíveis alvos militares, mas que não houve uma recomendação para matar inimigos.
A oposição exigiu o esclarecimento urgente do caso. O Partido Verde afirmou que o mandato dos militares alemães no Afeganistão não incluía a participação em assassinatos seletivos e que estes são incompatíveis com a Lei Fundamental [Constituição].
"Neutralização" de rebeldes
Ramms deu as declarações pouco depois de o jornal Bild afirmar que um comandante militar alemão teria uma participação decisiva nos assassinatos seletivos no Afeganistão. Com base em documentos secretos, o diário relatou que o major-general Markus Kneip escolhera pessoalmente "alvos" a serem eliminados.
Segundo o jornal, organogramas mostram que, no quartel-general alemão em Mazar-i-Sharif, havia uma chamada unidade de apoio [target support cell], cuja tarefa era coletar informações para a determinação de possíveis alvos individuais.
Segundo o Bild, os soldados dessa unidade deveriam criar arquivos com informações sobre possíveis alvos. Essas pastas eram entregues a Kneip, na época comandante da Força de Assistência para Segurança (Isaf) no norte do Afeganistão. Kneip então decidia se um alvo – no caso, uma pessoa – deveria se eliminado ou não. Numa reunião em maio de 2011, o major-general exigiu que fosse tratada como prioridade a prisão ou "neutralização" de um rebelde chamado Kari Hafiz, informou o jornal, aludindo a uma ata do encontro.
No caso de outros insurgentes, os participantes dessa reunião expressaram dúvidas se a eliminação dos rebeldes não deixaria um vácuo de poder, já que possuíam muitas armas, dinheiro e drogas.
Informações do serviço secreto
A reportagem também afirma que o BND (serviço secreto alemão) autorizou que informações coletadas pelo órgão pudessem ser empregadas no assassinato seletivo de "alvos individuais" caso houvesse a ameaça de um ataque. "Um uso para fins da prática de violência letal só é permitido no caso da presença ou da ameaça iminente de um ataque", escreveu o jornal, citando um relatório secreto do BND de agosto de 2011 sobre o líder talibã Kari Yusuf. Nesse relatório, o BND também informa números de telefone, que poderiam ser utilizados para a localização de Yusuf.
Principalmente os americanos praticam há anos ataques regulares contra possíveis líderes rebeldes e outros extremistas no Afeganistão e Paquistão, usando veículos aéreos não tripulados, os chamados drones. Na Alemanha, discute-se já há muito tempo qual a participação do BND e das Forças Armadas alemãs (Bundeswehr) nos controversos ataques com esses aviões.
O assassinato seletivo (a planejada eliminação de uma pessoa considerada uma ameaça à segurança de um Estado) é uma prática controversa, tanto do ponto de vista ético como do direito internacional. Estudos mostram que, no Paquistão, missões de targeted killing dos EUA mataram também várias pessoas inocentes. Para muitos críticos, trata-se de uma execução extrajudicial.
Após 13 anos, a Isaf, missão liderada pela Otan no Afeganistão e que previa também o combate aos radicais islâmicos talibãs, vai deixar de existir oficialmente em 31 de dezembro. A Alemanha chegou a ter mais de 5 mil soldados na missão. Futuramente, as Forças Armadas alemãs participarão com até 850 homens em missões de treinamento.