Os principais jornais desta quinta-feira (24) trazem em suas capas manchetes sobre a suposta morte do chefe do grupo paramilitar Wagner, Yevgueni Prigozhin. Agências de notícias russas indicam que ele está na lista de um avião que caiu entre Moscou e São Petersburgo na quarta-feira (23).
(RFI) “A queda” é a manchete do jornal Libération que estampa sua capa com o rosto de Prigozhin e sua expressão raivosa, o dedo indicador apontando para a câmera. “Acidente ou vingança, após sua espetacular insurreição no fim de junho?”, questiona o jornal.
O diário lembra que exatos dois meses após a rebelião do grupo Wagner, liderada por Prigozhin, seu avião particular parece ter caído. Dez pessoas estavam a bordo da aeronave, entre elas, 3 membros da tripulação, todos eles morreram, indica a reportagem do Libé. No entanto, a veracidade das imagens que mostram o aparelho em queda livre, compartilhadas nas redes sociais, não pode ser confirmada, reitera.
“A sombra da Rússia por trás da morte anunciada de Prigozhin” é manchete do jornal Le Figaro. O diário destaca que a última vez que a última prova de vida do líder do Wagner data de segunda-feira (21), quando ele apareceu em um vídeo divulgado por milícias próximas a seu grupo.
Senhor da guerra
Le Figaro também traz um perfil de Prigozhin “cozinheiro de Putin que se tornou o senhor da guerra”, diz o título da matéria, em referência aos muitos apelidos do combatente conhecido por sua brutalidade. De grande fiel do regime russo, Prigozhin se rebelou nos últimos meses, “como se a guerra na Ucrânia, expondo as fraquezas de Moscou, tivesse acionado o acelerador de partículas da caixa preta do poder, afiando rivalidades e revoltas”, publica.
Prigozhin também estampa a capa do jornal Le Parisien, que afirma que a guerra na Ucrânia pode tomar um novo rumo, se a morte do líder do grupo Wagner for confirmada. Em entrevista ao diário, Carole Grimaud, fundadora do think tank russo Center for Russia and Eastern Europe Research vê na queda do avião “um sinal” a todos aqueles que recusam lealdade ao regime de Putin.
Segundo ela, em junho, “Prigozhin rompeu o contrato [com Moscou]”, algo considerado inaceitável pelo Kremlin. “Esse incidente é uma mensagem direcionada às elites e às forças russas, um aviso. Putin está dizendo: ‘olhem o que espera vocês se deixarem de ser leais a mim”, analisa Grimaud.
Surovikin, o general russo com ligações complicadas com o grupo Wagner
Chamado de “general Armagedom” por seus métodos brutais, Serguei Surovikin é um dos rostos emblemáticos da ofensiva russa contra a Ucrânia. Mas seus vínculos com o grupo paramilitar Wagner e seu líder Yevgueni Prigozhin complicaram sua trajetória.
“O general de exército Serguei Surovikin foi demitido de suas funções”, afirmou nesta quarta-feira (23) a agência estatal RIA Novosti, que cita uma fonte que acompanha as movimentações dentro do exército russo.
Desde a tentativa de motim do grupo Wagner, o influente general de 56 anos desapareceu dos eventos públicos, sinal de seu declínio para os analistas.
Na madrugada de 23 para 24 de junho, quando Prigozhin defendeu a queda da cúpula militar russa e seu grupo de mercenários avançava em direção a Moscou, Surovikin apareceu em um vídeo em que falava com ar solene, segurando uma arma.
“Dirijo-me aos combatentes e líderes do grupo Wagner (…) Somos do mesmo sangue, somos guerreiros. Peço que parem”, disse. “Antes que seja tarde demais”, insistiu.
Menos de 24 horas depois, Prigozhin recuou e, segundo várias fontes, seguiu para o exílio em Belarus. Mas o apelo de Surovikin, divulgado muito rapidamente e considerado forçado por alguns observadores, não foi suficiente para evitar a marginalização do general, devido a seus vínculos com o grupo Wagner.
Com fama de implacável, Surovikin foi considerado durante muito tempo o principal aliado do grupo paramilitar dentro do ministério da Defesa da Rússia, apesar de Prigozhin pedir as quedas do ministro Serguei Choigu e do comandante do Estado-Maior, Valeri Guerasimov.
Apoio do grupo Wagner
Em maio, enquanto Prigozhin insultava o ministério russo da Defesa, acusado de privar seus mercenários de munições, ele conseguiu transformar Surovikin em seu principal interlocutor.
Antes, quando Surovikin foi nomeado comandante das tropas russas na Ucrânia, em outubro de 2022, Prigozhin celebrou a notícia. Mas a posição durou apenas três meses, pois ele foi substituído na função pelo comandante do Estado-Maior.
Em novembro de 2022, sob ordens de Surovikin, as tropas russas foram obrigadas a abandonar a cidade de Kherson e a margem direita do rio Dnieper, no sul da Ucrânia. Um revés significativo para Moscou.
O general comandou em seguida uma campanha de bombardeios contra infraestruturas de energia ucranianas, uma estratégia que pretendia deixar o país vizinho de joelhos, mas que terminou em fracasso.
Após a substituição por Guerasimov, Surovikin permaneceu no círculo de comandantes, com sua dura imagem de veterano da guerra soviética no Afeganistão, da segunda guerra da Chechênia nos anos 2000 e da brutal campanha na Síria, em 2015, quando recebeu o apelido de “açougueiro sírio”.
Ataques a hospitais
“É uma pessoa muito conhecida, os militares falam muito dele. Tem a reputação de ser um comandante insano… e impiedoso”, declarou à AFP um analista militar russo, que pediu anonimato, à AFP há alguns meses.
Outros analistas destacam suas qualidades de comandante. As tropas “Sul”, que ele comandou até o fim do ano passado na Ucrânia, foram as que conquistaram mais territórios na Ucrânia.
O Rybar, um influente blog militar que acompanha os combates na Ucrânia, afirma que a demissão de Surovikin aconteceu de fato “imediatamente depois” do motim do grupo Wagner, mas que isto “não é necessariamente uma condenação, talvez apenas uma medida temporária”.
Antes da Ucrânia, Surovikin, natural da Sibéria, foi um dos comandantes das forças russas na Síria. A ONG Human Rights Watch o acusou em 2020 como um dos que “poderiam ser responsabilizados’ por ataques ordenados contra áreas residenciais, escolas e hospitais.
Na Rússia, ele é muito conhecido por sua participação na tentativa de golpe de Estado de 1991, que representou a sentença de morte da URSS. Detido depois que as tropas que comandava mataram três manifestantes pró-democracia, Surovikin foi liberado em poucos meses.