Carla Marques Augusto – Advogada no Vigna Advogados e Associados.
A revolução tecnológica trouxe consigo uma enxurrada de dados que permeia quase todos os aspectos da vida da sociedade moderna. Essa moeda de troca digital é poderosa, e a forma como é utilizada levanta muitas questões éticas e legais. A privacidade é um dos grandes temas em pauta, afinal, lidar com a exposição constante de informações pessoais é um dos maiores questionamentos da era digital atual.
O Direito certamente precisa acompanhar esse avanço para estabelecer limites e garantir que as pessoas tenham controle sobre suas próprias informações. Leis de proteção de dados são um passo importante nessa direção, mas a rapidez com que a tecnologia evolui muitas vezes supera a capacidade das leis de se adaptarem.
A mediação pelo Direito é essencial para equilibrar o uso da tecnologia e a proteção dos direitos individuais. Afinal, como podemos garantir a segurança e integridade dos dados sem sufocar a inovação? É uma linha tênue que requer atenção cuidadosa.
O uso constante de informações de usuários de aplicativos e o acesso indiscriminado à internet deixam rastros digitais. À primeira vista, a utilização dessas informações parece inofensiva, mas estes rastros digitais deixados levam a informações confidenciais e de grande importância, que podem ser acessados, causando um enorme prejuízo.
Essa problemática é uma teia complicada. O que começa como compartilhamento aparentemente inofensivo de informações, pode rapidamente se transformar em uma exposição descontrolada de dados sensíveis. A questão dos rastros digitais é particularmente intrigante. Parece que tudo o que se faz online deixa uma marca, e essas pegadas podem revelar muito mais do que se pode imaginar.
A troca de informações por curtidas e interações sociais é uma espécie de “contrato” digital que grande parte das pessoas aceitam sem pensar nas implicações reais. É como se estivessem trocando a privacidade por um momento de validação digital. A conscientização sobre esse comércio desigual é crucial, e as pessoas precisam estar cientes do valor de suas informações.
Proteger informações no mundo digital é desafiador, especialmente com a sofisticação crescente das práticas de espionagem digital. Aqui, o papel do direito é fundamental. Leis robustas de proteção de dados, fiscalização eficiente e penalidades significativas para violações podem criar um ambiente em que as empresas e organizações pensem duas vezes antes de explorar indevidamente as informações dos usuários.
Além disso, é necessário um diálogo contínuo entre legisladores, especialistas em tecnologia e a sociedade para garantir que as leis se adaptem rapidamente às mudanças no cenário digital. A ética também desempenha um papel crucial, incentivando as empresas a adotarem práticas transparentes e responsáveis.
O Brasil foi visionário com a criação do Marco Civil da Internet, um dos mais completos dispositivos jurídicos sobre o tema. O Marco Civil da Internet prevê a segurança de dados na internet, a privacidade e a proteção à propriedade intelectual, impedindo que usuários usem ou comercializem dados públicos e pessoais de forma incorreta.
A história da regulamentação da internet no Brasil é marcada por um processo gradual de construção legislativa que reflete os desafios e as transformações digitais da sociedade brasileira. Desde o estabelecimento do Marco Civil da Internet até a promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o país tem buscado acompanhar o ritmo acelerado das mudanças tecnológicas e garantir os direitos dos cidadãos em um ambiente digital em constante evolução.
O Marco Civil da Internet, oficialmente conhecido como Lei nº 12.965/2014, foi sancionado em 23 de abril de 2014, após intensos debates e consultas públicas. Sua elaboração foi uma resposta à necessidade de estabelecer princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil.
Dentre os principais pontos do Marco Civil estão a neutralidade da rede, que garante o tratamento igualitário de todos os dados que trafegam na internet, a proteção da privacidade dos usuários, a liberdade de expressão e o estabelecimento de diretrizes para a atuação dos provedores de internet e de serviços online.
Essa legislação representou um marco na defesa dos direitos dos usuários da internet, consolidando princípios fundamentais para a garantia de uma internet livre, aberta e democrática.
Após o Marco Civil da Internet, o Brasil continuou avançando na regulamentação do ambiente digital, reconhecendo a importância da proteção de dados pessoais em um mundo cada vez mais conectado. Esse avanço culminou na promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), Lei nº 13.709/2018, que entrou em vigor em setembro de 2020.
A LGPD estabelece regras claras sobre a coleta, o tratamento, o armazenamento e o compartilhamento de dados pessoais por empresas e organizações, visando proteger a privacidade dos cidadãos e garantir a segurança jurídica nas transações realizadas no meio digital.
Com a LGPD, o Brasil se alinha às legislações de proteção de dados de outros países, como o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) da União Europeia, reforçando o compromisso com a privacidade e a segurança dos dados dos usuários.
Desde a entrada em vigor da LGPD, empresas e organizações têm enfrentado desafios significativos para se adaptarem às novas regras e garantirem o cumprimento das obrigações previstas na legislação. A adequação dos processos internos, a implementação de políticas de privacidade robustas e a conscientização dos colaboradores têm sido algumas das medidas adotadas pelas empresas para se adequarem à LGPD.
Além disso, a LGPD tem impactado o ecossistema digital brasileiro, estimulando a inovação e o desenvolvimento de tecnologias que garantam a proteção da privacidade dos usuários. A criação de novas ferramentas de segurança cibernética e o fortalecimento dos mecanismos de controle e fiscalização são aspectos importantes desse processo.
No âmbito jurídico, a LGPD tem gerado debates sobre a interpretação de seus dispositivos e sobre a atuação dos órgãos de fiscalização responsáveis pela sua aplicação, como a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). A definição de diretrizes claras e a atuação transparente dos órgãos reguladores são fundamentais para garantir a eficácia e a legitimidade da legislação.
Deste modo, claramente se percebe que o Marco Civil da Internet e a LGPD representam importantes marcos na evolução da legislação digital no Brasil, estabelecendo princípios fundamentais para a proteção dos direitos dos usuários e para o desenvolvimento sustentável da sociedade da informação. A promoção de uma internet livre, aberta e segura depende do cumprimento rigoroso dessas legislações e do constante aprimoramento dos mecanismos de proteção e controle. Em um mundo cada vez mais conectado, a garantia da privacidade e da segurança dos dados dos usuários é essencial para o fortalecimento da confiança e da cidadania digital.