Daniela Fernandes
A francesa Thales – que atua nos setores aeroespacial, de defesa, segurança e transportes – acaba de dar um passo importante em sua estratégia de obter um crescimento rápido de suas atividades no Brasil. O contrato, assinado ontem, em Brasília, com a Visiona (joint-venture entre a Embraer e a Telebras) para fornecimento do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC) marca uma etapa significativa no ambicioso plano do grupo em relação ao mercado brasileiro. "A prioridade é ampliar a dimensão dos nossos negócios no país", disse ao Valor o presidente mundial do grupo, Jean-Bernard Lévy.
O contrato com a brasileira Visiona está entre os cinco maiores firmados pela Thales neste ano, afirma Lévy, que concedeu a entrevista em Paris horas antes de embarcar para o Brasil. Ele integra a comitiva do presidente francês, François Hollande, que encerra hoje sua visita ao país. O montante do contrato obtido pela franco-italiana Thales Alenia Space e a Arianespace, segundo estimativas do setor, é de US$ 350 milhões.
O projeto do satélite geoestacionário é avaliado em R$ 1,3 bilhão. O SGDC, que deve ser entregue no final de 2016, irá garantir, segundo o governo, a segurança das comunicações estratégicas do governo e militares e também ampliará o acesso à banda larga em regiões remotas do Brasil.
O contrato prevê a transferência de tecnologias. "Nosso objetivo é auxiliar o Brasil a desenvolver uma indústria de ponta", garante Lévy. "Não vamos guardar nossas competências internamente em filiais da Thales", diz o CEO, indicando que a transferência de tecnologia não será feita por meio de aquisições de empresas.
A Thales já possui acordos com a Agência Espacial Brasileira (AEB) e com a Embraer. Segundo Lévy, dezenas de engenheiros brasileiros irão à França para acompanhar a construção do satélite nas unidades de Cannes e Toulouse. Além do contrato com a Visiona, a Thales Alenia firmou um memorando de intenção com a AEB para transferências de tecnologias espaciais para o Brasil.
O Brasil, afirma o executivo, é um "parceiro privilegiado" na estratégia do grupo. Por esse motivo, a Thales está elaborando um "plano Brasil", que deverá ficar pronto nos próximos seis meses, com objetivos e diretrizes de atuação no país nos próximos anos. O grupo tem "várias prioridades" no Brasil, diz ele. Uma delas é desenvolver as atividades no setor aeroespacial.
Outra prioridade no país é o mercado de acústica submarina. A Thales já irá fornecer os sonares dos submarinos franceses Scorpène, adquiridos pelo Brasil em 2008 no âmbito da parceria militar estratégica com a França. Para Lévy, as oportunidades de negócios nesse setor são grandes. "O Brasil tem desafios muito importantes em suas áreas offshore, de exploração de petróleo, e marítima para a proteção da Marinha." O grupo já está se movimentando para atuar no segmento de sonares. "Iniciamos discussões com as autoridades brasileiras para desenvolver competências nessa área", afirma.
O grupo francês também prevê ampliar as atividades da filial brasileira Omnisys, que produz e exporta radares de controle de tráfego aéreo, entre outros equipamentos, e reforçar sua atuação também no setor de transportes urbanos. A empresa já fechou contratos para fornecer sistemas de sinalização para a Linha 17-Ouro do metrô de São Paulo e para o monotrilho de Manaus.
Outros grandes mercados emergentes também estão na mira da Thales. Como no caso do Brasil, planos específicos de atuação em cerca de dez outros países, como Rússia, China, Índia, Cingapura, estão sendo elaborados.
Pode parecer paradoxal, mas a Thales, presente em 56 países, quer se tornar um grupo internacional. Lévy, que assumiu o comando da empresa há quase um ano, após permanecer à frente do grupo de comunicação e entretenimento Vivendi, explica: "Temos várias unidades no mundo que apenas importam nossos produtos e prestam assistência técnica. É algo muito dependente de novos contratos", diz ele, acrescentando que o sistema produtivo da Thales é hoje quase exclusivamente centrado nas economias ocidentais.
"Há vários outros países, como o Brasil, que querem ter acesso a tecnologias. E, para isso, é necessário ter uma produção local." Para reequilibrar o que ele chama de "pegada industrial" do grupo entre economias desenvolvidas e emergentes, a Thales tem a meta de realizar joint ventures, implantações, transferências de tecnologia e parcerias com empresas. "Nossa pegada industrial precisa estar alinhada à demanda dos países com crescimento econômico rápido."
A estratégia fixada pelo CEO é fazer com que as vendas decolem rapidamente nos países emergentes. Isso é fundamental para relançar o crescimento do grupo, que há sete anos não registra aumento no volume de pedidos. "É preciso que o total de encomendas cresça mais do que o faturamento. Dessa, forma, haverá crescimento efetivo", afirma Lévy. No acumulado, até setembro deste ano, a Thales registra € 8,2 bilhões em encomendas, uma queda de 6% em relação a igual período do ano anterior. Já o faturamento, de quase € 9,5 bilhões, aumentou 6%.
As aquisições de empresas não são uma prioridade para Lévy. "Não vou me esconder atrás de fusões e aquisições para realizar o objetivo de crescimento do grupo", afirma ele, sem descartar eventuais operações quando houver interesse.
Segundo o CEO, as atividades civis da Thales deverão em breve ultrapassar as militares em razão da demanda crescente por infraestrutura em inúmeros países. A atividade que mais cresce hoje no grupo é a do transporte aéreo. A Thales fornece radares e sistemas de segurança e navegação para aeroportos e também equipamentos para construtores e companhias aéreas.