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Serious Game – A simulação do caos

Max Milliano Melo

Quando um terremoto de magnitude 7 na escala Ricther sacudiu o Haiti, as tropas brasileiras tiveram que lidar com um desafio complemente novo e desconhecido. A reconstrução política e social do país ficou ainda mais complicada com mais de 40% dos prédios reduzidos a escombros. Como coordenar uma missão de paz em uma condição tão adversa? A solução está no treinamento. Como no Brasil, dificilmente se poderiam criar condições como as enfrentadas no país da América Central, as Forças Armadas decidiram recorrer à tecnologia. Utilizando o Joint Master Simulation Event List (JMSE, na sigla em inglês), o sistema funciona como uma espécie de jogo de simulação, que reproduz missões que já foram enfrentadas na vida real e ajuda os militares a aprender a como agir quando o problema for real.

O sistema, denominado serious game, foi a base do Exercício de Operações de Manutenção da Paz Américas 2011, feito em Brasília na primeira quinzena de maio e que reuniu militares de 14 países do continente americano. O software, desenvolvido nos EUA, possui um poderoso banco de dados alimentado com dados provenientes de experiências já vividas em missões de paz ao redor do mundo. “Isso garante que as situações vivenciadas nele tenham 100% de conexão com a vida real”, explica o comandante Jason King, militar do Canadá que participou do exercício com o sistema. “É uma oportunidade única de aprendermos com o Brasil sobre como lidar com situações tão extremas quanto as vividas no Haiti”, completa o canadense.

A lógica de funcionamento é semelhante à de um game comum. Um país imaginário, chamado Oceana, foi criado, com base no mapa e nos aspectos físicos de Porto Rico. Como o objetivo era aprender com as situações enfrentadas no Haiti, os dados que “recheavam” a história são os mesmos do pequeno país que enfrentou um terremoto: clima, incidência de doenças como malária, aumento da violência, terremotos e um processo eleitoral conturbado. Como num jogo, os participantes foram divididos em dois grupos, as células 1 e 2, que precisam cuidar das regiões mais importantes e populosas de Oceana: a capital, San Juan, e a segunda maior cidade do país, Arecibo. Há ainda um terceiro grupo, que não é avaliado, mas recebe as mesmas missões, composto por organizações internacionais.

Além dos três grupos de competidores, existe a chamada Célula Branca, uma espécie de organizadora do jogo. É essa célula que elabora as missões e define quando cada uma deve ser cumprida. Durante todo o dia, os grupos recebem pelo sistema JMSE situações relacionadas ao cotidiano de um a missão de paz.

“Há aquelas mais simples, que podem ser resolvidas em poucos minutos, e também as mais complexas, que precisam de um dia todo para serem equacionadas”, explica o coronel Átila Torres, um dos coordenadores do treinamento — que, a cada ano, ocorre em um país da América. Depois de respondidas, elas são enviadas de volta, o sistema processa e, se for o caso, a Célula Branca envia uma nova tarefa baseada na resposta dada à anterior.

Entre as tarefas, está, por exemplo, julgar como agir no caso de um estrada ser fechada depois de uma queda de barreira. “Em uma missão, os recursos, tanto humanos quanto materiais, são limitados. Então, quando acontece um problema, o comando precisa avaliar o seu impacto, a capacidade de o país lidar com ele sozinho e como realocar as tropas que estão em outras tarefas para resolver aquela situação”, completa o militar. “Nesse caso, por exemplo, o comando precisa pensar na importância daquela via, se ela vai comprometer o abastecimento do país, de que outra área da nação devem sair os militares que irão desobstruir a via ou mesmo se será possível apenas dar o suporte para que o governo local lide sozinho com o problema”, completa o coronel.


Sentimentos

Se a tecnologia ajuda a recriar os problemas e desafios de uma missão internacional, uma coisa que ela ainda não é capaz é de reproduzir as emoções humanas que estão envolvidas em situações de crise. Nessa hora, complementando o sistema JMSE, entra em ação um grupo de atores que encenam protestos, brigas e conflitos que as tropas têm que estar preparadas para resolver. “São situações complicadas. Entre as que encenamos aqui, está um protesto da população revoltada com o suposto estupro de uma jovem e uma invasão do quartel por causa do atropelamento de uma criança por um caminhão do Exército”, explica o coronel Átila. “Também se aprende a lidar com a imprensa. Quando e como divulgar informações e dar entrevistas e como tratar os jornalistas em entrevistas mais complicadas”, completa.

Assim como na vida real não existem certos ou errados absolutos, no treinamento também é assim. As respostas dadas pelos grupos, além das filmagens feitas das encenações, servem para duas avaliações. No fim do dia, verificam-se os pontos positivos e negativos das ações dos grupos. “No fim do treinamento, há uma avaliação mais global e muitas das ações tomadas no ambiente de simulação são esquematizadas para serem postas em prática na realidade”, explica o coronel. São as chamadas “boas práticas”, que são enviadas para as tropas e servem de orientação para que, quando uma situação parecida acontecer na vida real, as equipes saibam como agir”, completa.


O objetivo é educar

Na tradução literal, serious game significa “jogo sério”. O termo se refere a um software ou hardware desenvolvido com os princípios do desenho de jogo interativo e com o objetivo de transmitir um conteúdo de caráter educativo ao utilizador. A palavra “sério” está ligada, nesse caso, a produtos e situações ligadas à área da defesa, da educação, da exploração científica, dos serviços de saúde, da gestão de emergências, do planejamento urbano, da engenharia, da religião e da política.

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