Programa Espacial Brasileiro cria oportunidades para a Base Industrial de Defesa
A última reunião Plenária Conjunta do SIMDE – Sindicato Nacional das Indústrias de Materiais de Defesa com o DESEG – Departamento de Defesa e Segurança da FIESP, realizada por videoconferência na segunda-feira, 3 de maio 2021, contou com a participação Diretor-Geral do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial da Força Aérea Brasileira, Tenente-Brigadeiro do Ar Hudson Costa Potiguara e do Presidente da Agência Espacial Brasileira, Carlos Augusto Teixeira de Moura.
O General de Divisão Adalmir Manoel Domingos, Coordenador Executivo de Conselhos e Departamentos da FIESP abriu os trabalhos passando a palavra para o Diretor-Presidente do SIMDE, Carlos Erane de Aguiar, também Diretor-Titular do DESEG, que falou da importância estratégica do setor espacial e citando a criação do Comitê Aeroespacial do SIMDE “Marechal do Ar Casimiro Montenegro Filho” que se debruça sobre o tema junto as associadas e a FAB, tendo promovido, inclusive, uma visita ao Centro de Lançamento de Alcântara em março de 2020.
Carlos Erane destacou que “a economia espacial global está mudando de forma e assumindo papéis mais expressivos com a nova corrida espacial em curso” que conta com a forte participação do setor privado e da presença militar crescente. “Este rico quadro de possibilidades que se descortina, é o início de um exponencial de crescimento da economia espacial e dos sistemas de defesa. O Brasil não pode mais ignorar!”
O Tenente-Brigadeiro do Ar Hudson Costa Potiguara, Diretor do DCTA, apresentou as Ações do Comando da Aeronáutica em relação às perspectivas do Programa Espacial Brasileiro, focando nas atividades aeroespaciais, espaciais e no Centro Espacial de Alcântara e o Presidente da AEB, Carlos Augusto Teixeira de Moura, apresentou a Visão de Mercado a respeito do Programa Espacial Brasileiro, apresentando dados importantes para o desenvolvimento do setor espacial brasileiro.
No encerramento, o Dr. Carlos Erane de Aguiar aproveitou a presença do Diretor Executivo de Projetos e Chefe de Gabinete da Presidência da Fiesp, Tenente-Brigadeiro de Ar Aprígio Eduardo de Moura Azevedo, para destacar todo o apoio que tem sido dado pelo Presidente da Fiesp, Paulo Skaf, às atividades do Deseg e do SIMDE
Após a palestra dos representantes, foi reservado um tempo para que eles pudessem responder as perguntas enviadas previamente:
Recentemente foi concluído o processo do Chamamento Público para lançamentos não militares no Centro Espacial de Alcântara com o anúncio das primeiras 4 empresas que estão negociando o texto contratual para início de suas operações. Neste contexto, quais são os desdobramentos esperados? Qual o papel esperado para a indústria nacional no CEA? A indústria nacional está sendo considerada com prioridade para os serviços de apoio no Centro? Como as empresas nacionais, pequenas ou não, podem utilizar o CEA? Ainda há espaço para empresários interessados em fabricação nacional de lançadores ou componentes de lançadores a serem lançados do CEA? E, concluindo esta questão, a quem a indústria nacional pode procurar para ser apoiada ou contratada para operação em Alcântara?
Tenente-Brigadeiro do Ar Hudson Costa Potiguara: Essas quatro grandes empresas que virão não vão trazer tudo que precisam para operar no Brasil. Elas vão precisar de outros serviços, vão demandar a indústria nacional. Eu diria que a indústria nacional tem que se inserir neste contexto e a priorização será da indústria nacional.
Há espaço para todas as capacidades, todos os meios estarão à disposição. Nós temos que nos inteirar e participar. A diversidade de objetivos e necessidades para o Centro Espacial de Alcântara serão gritantes, então a indústria terá que estar atenta e participar dessas necessidades.
Em termos de infraestrutura do Centro de Lançamento de Alcântara, nós já temos as empresas, elas sabem como nos procurar e nós também vamos demandar dessas empresas dentro daquele catálogo que o Coronel Moura citou, vamos procurar essas empresas para as necessidades que temos. Todos os nossos canais já estão abertos, eu me coloco à disposição como Ministério da Defesa, como Força Aérea Brasileira, a encaminhar para quem for necessário e fazer o link.
A legislação atual instituiu a figura das encomendas tecnológicas, abrindo um mar de possibilidades para contratação de empresas e instituições privadas para o desenvolvimento de tecnologias inovadoras de interesse do Estado brasileiro. Existe algum planejamento em se intensificar a utilização deste instrumento na área espacial como alternativa para acelerar o desenvolvimento das atividades espaciais brasileiras? Pode-se considerar a adoção deste mecanismo como uma tendência segura daqui para frente?
Carlos Augusto Teixeira de Moura: Vamos deixar claro que esse mecanismo ETec (Encomendas Tecnológicas) dentro desse conceito de Lei da Inovação, é diferente de uma encomenda de governo. Nós sabemos que existe um anseio muito forte das nossas indústrias já estabelecidas por terem projetos cadastrados pelo governo, é um desafio muito grande, mas a encomenda tecnológica é um mecanismo de contratação que envolve necessariamente a falta de uma solução pronta de mercado, desenvolvimento e um risco da solução não ser atendida. Então é um mecanismo que permite o governo comprar algo de um mercado e, eventualmente, não se chegar a um produto e tudo bem, era um risco mapeado e a empresa não vai ser crucificada, nem o administrador público, esse é o conceito.
Mas como foi dito aqui, ainda não havia nenhum exemplo concreto de uma ETec feita totalmente dentro desse enquadramento, nós fomos a primeira organização federal que se dispôs a fazer isso, temos seguido todo o regulamento MindBook tanto é que o TCU montou recentemente uma cartilha baseada em todos os procedimentos que têm sido aprendidos com esse nosso estudo de casa, a ABDI montou uma ferramenta no site dela com o apoio do TCU, seria uma espécie de um toolkit para as empresas que queiram entrar nesse tipo de modalidade, então nós acreditamos que sim, esse é o mecanismo mais apropriado para aqueles em que nós tenhamos que desenvolver algo completamente novo que não exista no mercado e que exista um risco forte de não se chegar a um resultado concreto.
Na sexta-feira passada, nós tivemos um webinar com diversas instituições e se confirmou que de fato esse tipo de ferramenta está sendo bem utilizada, já existe a prefeitura de Niterói utilizando a ferramenta num problema ambiental, ele foi utilizado também agora na questão da produção de vacinas, então me parece que para o setor espacial, naquilo que envolver um grande risco, ele deve vir a ser utilizado.
Agora, vai depender muito também de duas coisas, eu imagino. Primeiro, o administrador público utilizar bem as informações já disponíveis, segundo, vai depender das nossas indústrias olharem isso como uma oportunidade diferente de desenvolver negócios.
Essa ferramenta não é a única, o MCTI tem trabalhado também nisso, eles têm uma espécie de ajuda para como utilizar diversos mecanismos de inovação, diversos apoios à indústria, então a ETec é apenas um deles. Eu sugiro para aqueles que ainda não conhecem, acessar o site do Ministério e lá tem o Departamento de Financiamento, dentro dessa secretaria está todo o mecanismo de utilização da Lei do Bem, Lei da Inovação e coisas do gênero.
Varios países no mundo estão aumentando sua presença militar no espaço sideral, tornando delicada a posição de nações sem presença militar neste Domínio, uma vez que ficam à mercê dos interesses destas outras nações e ficam limitadas ao tentarem defender seus interesses nacionais, quando estes dependem de alguma forma dos sistemas espaciais desprotegidos. Como o Brasil encara este desafio? Há interesse do governo em proteger os interesses brasileiros no espaço? O Brasil tem se preparado para garantir sua autodefesa com a aplicação de sistemas espaciais? Qual o papel da indústria nacional de defesa a ser considerado neste contexto?
Tenente-Brigadeiro do Ar Hudson Costa Potiguara: Quando a gente fala do Centro Espacial de Alcântara, a gente fala de lançamentos não militares. E, logicamente, a gente tem que lembrar que o Brasil tem pactuado o uso pacífico do espaço. Mas eu diria que em detrimento disso tudo, toda tecnologia tem a sua dualidade, para o emprego civil e na atividade militar. Falamos simplesmente de geogerenciamento, de GPS, podemos falar de várias outras coisas que nós temos hoje que a atividade espacial vai prover. Então por isso que especificamente falando, respondendo aos questionamentos, existe sim o interesse militar.
Claro que há interesse em proteger os interesses brasileiros no espaço, se não tivermos a base de lançamento, passaremos a ser compradores de serviços. E em caso de alguma situação em que a gente queira comprar e quem oferece o serviço não queira vender, é simples assim: não teremos o serviço. Então é por isso que o governo brasileiro tem interesse sim.
O Brasil sempre está preocupado com a sua autodefesa, para isso que nós, as Forças Armadas, existimos. Mas eu diria que essa tecnologia hoje, a visibilidade dela está voltada para a dualidade civil dela, mas a tecnologia pode sim e nós teremos capacidade de empregar toda essa tecnologia no âmbito nacional.
Atividades econômicas no espaço estão ficando cada vez mais diversificadas e ampliadas, abrangendo desde atividades tradicionais de comunicações, geoposicionamento e sensoriamento remoto, até campos anteriormente desconsiderados, como mineração espacial, serviços em órbita, fabricação de materiais em órbita, agricultura fora da Terra, fabricação de tecidos biológicos para propósitos diversos fora da Terra e em ambientes de microgravidade. Neste contexto, como a Política Espacial Brasileira tem se posicionado? Há uma tendência em curso de priorização política das atividades espaciais ou as atividades deste setor continuarão a ser encaradas como mera disciplina restrita a um ambiente físico fora da Terra e sem conexão com todas as áreas da vida moderna? O crescente papel econômico, que lembra o início da nova economia criada com o descobrimento das Américas, tem sido reconhecido como importante para o crescimento econômico do Brasil?
Carlos Augusto Teixeira de Moura: Eu diria que nós ainda não somos reconhecidos como um setor econômico importante, as pessoas acham as ideias interessantes, provocativas, concordam com nossa visão estratégica, mas ainda não nos veem como um setor econômico significativo, como é o caso da Aeronáutica. E fica meio naquela situação de um Tostines ao contrário, tem pouca prioridade porque tem pouco resultado, tem pouco resultado porque tem pouca prioridade.
Nós reconhecemos que apesar de estarmos na estrada do setor espacial desde os anos 60, nós não conseguimos chegar ao coração do cidadão brasileiro. É diferente de outros países que as pessoas conhecem, sabem que existem, sabem para quê que eles servem. Nós temos intensificado muito nesses dois últimos anos com apoio de outros Ministérios, a Aeronáutica também participa, uma comunicação mais integrada do que que é atividade espacial brasileira.
Foram citados nessas perguntas alguns exemplos concretos, essa questão de experimentos da microgravidade, isso não é só ficção, já existem empresas trabalhando com isso. Existe uma empresa que nos procurou e que já identificou realmente um nicho interessante, principalmente na indústria farmacológica para aplicação do experimento de microgravidade.
Quando o Japão por exemplo manda uma sonda para encontrar um meteoro e essa sonda é capaz de se acoplar nesse corpo Celeste, extrair uma amostra e voltar a terra, ele fez um evento científico e tecnológico muito importante. Mas vejam bem que isso daí também poderia ser uma sonda para tentar desviar o caminho desse corpo celeste, ou pode ser também o equipamento que pode ir ao espaço e recolher lixo espacial, ou pode ser também um equipamento que interfere em outro objeto espacial, então o mesmo tipo de ferramenta pode ser desenvolvido para diversos fins. Existe hoje uma miríade de aplicações espaciais e a nossa indústria pode entrar nisso, seja com sistema completo, seja com negócio ou seja com equipamentos. Nós gostamos sempre de lembrar um exemplo de uma diretora da Agência Espacial Canadense, que falou que um dos objetivos principais dela lá é garantir que cada coisa que vá ao espaço lá tenha algum componente canadense, pode ser uma arruela, um parafuso, um chip ou um software, ou seja, eles exploram mercado, nem que não seja com sistema completo. Então parece que às vezes falta um pouco para nós, como um país, essa visão.