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O BRICS deve se lançar ao espaço

Pedro Riopardense


A cooperação na área de lançadores e de satélites poderia ser um dos pontos altos do BRICS. Os cinco sócios do bloco possuem indústrias aeroespaciais sólidas e sofisticadas e três deles, China, Índia e Rússia, realizaram disparos bem sucedidos. Herdeira da União Soviética, a Rússia se destaca. Coloca homens no espaço e realiza praticamente todas as missões de suprimento da Estação Espacial Internacional. Os feitos da República Popular da China falam por si, realizando voos tripulados e estabelecendo bases para uma instalação própria capaz de alojar homens e laboratórios em órbita da Terra em um futuro próximo. Por sua vez, a Índia realiza corriqueiramente disparos de satélites com peso superior a uma tonelada.

Os feitos do Brasil, diante desses gigantes, são relativamente modestos, mas estabelecemos um bom recorde no disparo de foguetes de sondagem suborbitais. O país apostava pesadamente na parceria tecnológica com a Ucrânia, ao integrar a Alcântara Cyclone Space (ACS), empresa binacional que pretende explorar serviços de satélites a partir do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), no Maranhão. No entanto, o quadro político do país coloca em dúvida a viabilidade do programa. Kiev se aproxima da União Europeia e dos Estados Unidos, que veem o esforço brasileiro com suspeita, apesar de nossa adesão clara ao MCTR, Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis.

A Agência Espacial Europeia opera o Centro de Lançamentos de Kourrou, na Guiana Francesa e não vê com bons olhos o possível surgimento de um concorrente. O governo brasileiro já investiu R$ 1 bilhão no CLA para cumprir os termos do acordo espacial assinado em 2002. Parte desse dinheiro foi empregada como contrapartida no desenvolvimento do Cyclone 4. Para o Brasil, a parceria garante a troca de experiência e de tecnologia na construção de foguetes. A Ucrânia será beneficiada pelo uso da base de lançamento de foguetes em Alcântara (MA). O local é considerado privilegiado por estar próximo à linha do Equador, o que garante boas condições climáticas e um menor custo para impulsionar o foguete até a órbita.

Segundo o cronograma original, o primeiro lançamento deveria ter ocorrido em dezembro de 2010, mas foi adiado para dezembro de 2012. Agora, não se espera um lançamento até 2015. A cooperação com Kiev poderia ser ampliada com a construção de satélites. O Brasil necessita, em médio prazo, de um satélite geoestacionário para ajudar na previsão do tempo e integrar o Sistema Nacional de Prevenção e Alerta de Desastres.

Vários problemas colaboraram para o atraso. Comunidades quilombolas (formadas por descendentes de escravos) vivem na região e criaram obstáculos para o projeto, que também teve de enfrentar as autoridades ambientais federais e estaduais. As obras, finalmente, tiveram início em setembro de 2010. A área de 500 hectares incluirá as estruturas do Complexo Técnico, do Complexo de Lançamento e da área de armazenamento de propelente. O governo brasileiro também construirá um porto em Alcântara, o qual, além de atender às necessidades do sítio de lançamento da ACS, para receber cargueiros de até 100 mil toneladas.

O acordo entre Brasil e Ucrânia nunca foi uma unanimidade. Sofre forte oposição de setores da Força Aérea Brasileira e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que gostariam de aplicar mais recursos no Veículo Lançador de Satélites (VLS), de concepção nacional. O Brasil já aplicou mais de US$ 2 bilhões no programa, sem nenhum resultado positivo. Depois de um grande acidente, em 25 de agosto de 2003, que dizimou a equipe que trabalhava no projeto, o Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) recebeu apoio de técnicos russos. Com base nessa cooperação, as falhas do foguete foram sanadas. Um novo terceiro estágio foi desenhado, usando combustível líquido em lugar de sólido, ampliando a capacidade de carga do lançador. Esse projeto, no entanto, foi substituído por outro, de tecnologia alemã.
 
O BRICS

O Itamaraty e a chancelaria russa são os maiores entusiastas do processo de institucionalização dos BRICS. O bloco torna-se cada vez mais importante para a formação e regulação de uma ordem multipolar. Nesse âmbito, o surgimento de uma agência espacial do grupo ofereceria uma excelente alternativa de mercado aos Estados Unidos e à União Europeia. A cooperação poderia explorar o desenvolvimento conjunto de um novo vetor na classe do Cyclone 4 (ou superior) a combustível líquido, com o possível uso dos propulsores sólidos do VLS como segundo ou terceiro estágio ou o desenvolvimento binacional de um novo lançador de pequeno porte envolvendo tecnologia brasileira de combustível sólido desenvolvida para o VLS e para a Missão Completa Brasileira.

Outro ponto interessante está no desenvolvimento de satélites de sensoriamento remoto e de comunicações. Brasil e China montaram uma parceria bem sucedida na série CBERS. Infelizmente, o último disparo não foi bem sucedido, mas os anos de experiência conjunta dão uma boa ideia das potencialidades do programa.

Para a viabilização do CLA seria interessante obter repasse de tecnologia para o gerenciamento de sítios de lançamento, de maneira a evitar potenciais problemas e minimizar danos no caso de eventual catástrofe. Outro ponto atrativo envolveria a fabricação in loco de combustível líquido em instalações montadas em Alcântara (a proposta ucraniana não abrangia essa possibilidade e estabelecia o arriscado procedimento de transportar o material preparado em navios).

Brasil e África do Sul também poderiam se beneficiar de um maior intercâmbio técnico e de pessoal com a China, a Índia e a Rússia. A verdade é que a cooperação entre os países do BRICS apresenta um potencial que vai muito além da área econômica. Explorá-lo é questão de tempo.

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