O brigadeiro general Harold J. Greene só tem de olhar ao redor de sua casa para entender os desafios que o Exército enfrenta para engajar jovens soldados. Seus filhos, diz ele, estão sempre "enfiados em um telefone celular ou em um iPad".
Greene, um oficial de alto escalão do Comando de Pesquisa do Exército, está entre um grupo que pede que as Forças Armadas adotem tecnologias que já são muito populares entre os consumidores, como os smartphones, videogames e mundos virtuais. O objetivo é fornecer ferramentas de treinamento para engajar soldados que cresceram usando produtos eletrônicos sofisticados e estão ansiosos para incorporá-las à sua rotina.
Em uma época de orçamentos reduzidos, essas ferramentas são vistas como relativamente baratas em comparação a equipamentos de treinamento mais caros e ao mesmo tempo proporcionam uma experiência de formação surpreendentemente realista.
As Forças Armadas americanas já usam alguns jogos de videogame para o recrutamento e treinamento de soldados, e agora começaram a experimentar os mundos virtuais também. As ferramentas são desenvolvidos especificamente para uso militar.
Além disso, o Exército realizou recentemente um concurso entre os soldados para determinar quem conseguiria desenvolver o melhor aplicativo para smartphone. Entre os aplicativos já disponíveis em um site do Exército estão um que contém alertas de corneta, uma calculadora de gordura corporal, um que lista os credos do Exército, um que mantém o atirador alerta e outro que evita a captura. (A maioria dos aplicativos está disponível para o iPhone e Android, mas alguns são para apenas um sistema.)
"Temos de nos adaptar a como eles são", disse Greene, falando da necessidade de recorrer a jovens soldados e ensiná-los usando dispositivos a que estão acostumados. "Isso é algo que absolutamente temos que fazer”.
Mas os esforços para expandir muito o uso de jogos virtuais e eletrônicos usados no cotidiano se deparam com uma série de obstáculos criados por uma burocracia militar lenta para aceitar mudanças.
Preocupações de segurança sobre o uso de dispositivos sem fios por soldados em ação no campo de batalha são um problema, porque as transmissões devem ser criptografados. Outro obstáculo é a crença persistente entre alguns oficiais de alto escalão de que os jogos, aparelhos e avatares simplesmente não têm lugar nas Forças Armadas.
Orçamento
Por enquanto, o orçamento para o treinamento através de videogames e smartphones é pequeno. Por exemplo, o Exército gasta entre US$ 10 milhões e US$ 20 milhões por ano em licenças, modificações e desenvolvimento de jogos do Exército.
"O orçamento é sempre um problema", disse Frank C. DiGiovanni, diretor de treinamento e estratégia do Departamento de Defesa. "O que estou tentando fazer é demonstrar são extremamente eficazes”.
DiGiovanni fez suas observações na GameTech, uma convenção que já tem cinco anos e que foi realizada em Orlando, em março. Ela mostrou o crescente uso de simuladores, jogos de vídeo, mundos virtuais e smartphones por parte dos militares.
Além dos jogos de videogames que permitem que os soldados ensaiem para o combate, os vendedores ofereciam dispositivos que oferecem aulas de cultura e de línguas, formação médica e prática de tiro.
Embora a GameTech seja minúscula para os padrões de convenções americanas, com apenas 775 participantes e 29 fornecedores, vários participantes disseram considerar importantes os avanços que tal evento tem conseguido, dado o ceticismo exibido por líderes militares em relação aos jogos de vídeo há uma década atrás.
"Quando eu comecei com isso em 1999, você não pode usar a palavra 'jogo'", disse James Korris, presidente-executivo da Creative Technologies e criador de um dos primeiros jogos de videogame para militares, o Full Spectrum Warrior. "Falávamos em guias de formação ou ferramentas de desenvolvimento cognitivo”.
"GameTech?", acrescentou. "Quem poderia imaginar?"
Indústria
Os militares são parcialmente responsáveis pelo crescimento da indústria de videogames. Durante décadas, eles criaram simuladores e jogos de guerra cada vez mais sofisticados.
Algumas das pessoas envolvidas na criação desses produtos foram trabalhar para fabricantes de videogames, levando seu conhecimentos a eles. Então, conforme os jogos de vídeo comerciais se tornavam mais sofisticados, os militares começaram a tomar ideias emprestadas deles.
Por exemplo, em meados dos anos 1990, alguns fuzileiros modificaram o popular jogo Doom, substituindo armas de fantasia por armas verdadeiras e monstros por soldados. Alguns anos mais tarde, os militares colaboraram com o meio acadêmico e desenvolvedores de jogos para criar Full Spectrum Warrior, que foi projetado para imitar o combate real.
O treinamento virtual nunca vai substituir o treinamento real, que ainda é essencial, disseram fontes militares. Mas ele permite que os soldados pratiquem muitas vezes sem o custo de grandes equipamentos ou o risco de usar munição de verdade.
E a eficácia dos jogos melhorou drasticamente, disseram autoridades. "Você não pode simular a poeira, sujeira, calor e estresse que inevitavelmente se sente em situações de combate", disse o primeiro tenente Fish Roy, 34 anos, comandante de pelotão com base em Camp Leatherneck, no Afeganistão. "Mas acho que a simulação o coloca tão perto do Afeganistão quanto possível quando se está na Carolina do Norte".
Os mundos virtuais oferecem alguns dos mesmos benefícios, sem o aspecto de jogo. Por exemplo, os mundos virtuais podem permitir que os instrutores no Afeganistão ofereçam formação a jovens soldados nos Estados Unidos, dando-lhes uma ideia da paisagem e até mesmo os apresentando às autoridades locais, disse Jeff Mills, coordenador do projeto de mundos virtuais na empresa Katmai, uma contratada dos militares.
Mills disse que um mundo virtual também pode ser usado para instruir os mecânicos sobre como consertar aviões ou tanques.
"Nós temos uma boa oportunidade e precisamos tirar proveito disso", disse ele.
As Forças Armadas demoraram para abraçar os smartphones, mas os aparelhos têm muitos defensores de alto escalão, incluindo o tenente-general Michael Vane, do comando de formação do Exército.
Ele disse que a formação atual de soldados frequentemente envolve sentá-los em uma sala de aula por 45 minutos para que assistam a uma apresentação de PowerPoint. Smartphones, disse ele, levariam "o conteúdo para um soldado no momento de necessidade", significando que os soldados que tivessem aparelhos consigo o tempo todo poderiam receber informações úteis imediatamente.
Ao descrever a utilidade dos smartphones, os oficiais citam um aplicativo recém-criado do Livro Azul do Exército, que descreve as obrigações e responsabilidades básicas dos militares do Exército. O aplicativo levou três dias para ser criado e custou relativamente pouco dinheiro – uma impressão recente do Livro Azul levou 135 dias e custou US$ 750 mil.
O Exército realizou recentemente um projeto piloto que forneceu smartphones a alguns soldados. Mas por causa de preocupações com a segurança, a capacidade de acesso sem fio dos telefones foi cortada e os soldados se queixaram do aparelho não ser mais interativo.
"Não temos certeza de como será daqui para frente", disse Mike Piercy, um conselheiro sênior de gestão de formação do Exército para aquisição de simulação, que lida com smartphones. "Mas estamos indo em frente”.
*Por Andrew Martin e Thomas Lin