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Folhetim – Revolução a favor

Devotado à carreira de lobista do PT desde que teve seu mandato cassado por chefiar o esquema do mensalão, o ex-deputado e ex-ministro José Dirceu mergulhou ultimamente em uma operação peculiar: viabilizar uma participação da presidente Dilma Rousseff na novela mais trash da televisão brasileira atual. Amor e Revolução, que estreou no SBT de Silvio Santos há um mês, fala do embate entre a esquerda e a repressão militar nos chamados "anos de chumbo" que se seguiram ao golpe de 1964. O noveleiro Tiago Santiago toma partido, definitivamente, da esquerda: cabe aos comunistas o papel de paladinos da liberdade. Seria só mais um dramalhão tosco do autor conhecido pela trilogia dos "Mutantes" (de seus tempos na rival Record), não fosse um detalhe copcioso: as figuras heroificadas comungam traços biográficos com os grão-petistas. Um dos presos políticos da novela terá sua liberdade trocada pela de um embaixador estrangeiro sequestrado por guerrilheiros, e depois vai passar uns tempos no paraíso socialista de Cuba – tal e qual José Dirceu. A mocinha Maria Paixão (Graziela Schrnitt) é uma estudante que integra uma organização revolucionária – como, adivinhem, Dilma Rousseff. Essa conexão se escancara nos depoimemos de pessoas reais ao final dos capítulos. Dirceu já celebrou seus feitos como líder estudantil e, nesta semana, terá direito a um bis. A presidente, a princípio, declinou do convite. Mas o companheirão se empenha em convencê-la. Conta uma produtora da novela: "O Dirceu prometeu interceder pessoalmente, pois acha que a presidente só tem a ganhar com isso".

A novela explora a tortura dos presos politicos em cenas que se pretendem violentas, mas cujo excesso de sangue e canastrice redunda em humor involuntário. Em diálogos de didatismo tacanho, os personagens volta e meia sacam velhos chavães conspiratórios. Afirmam, por exemplo, que "os americanos" – sempre eles – tramaram o golpe por temer a nacionalização das multinacionais. Esse proselitismo vulgar irritou um clube de militares de pijama, que pediu a censura da novela. Bastou essa irrelevância para Amor e Revolução se tomar uma causa sagrada dos "blogueiros progressistas". O fato, porém, é que a suposta critica política do SBT chegou com décadas de atraso. Corajoso era expor as mazelas do Brasil no auge da repressão, como ousou Dias Gomes por meio da alegoria política de O Bem Amado, em 1973. Hoje, cantar o heroísmo da luta armada significa tão somente ser chapa-branca. Dos noventa depoimentos colhidos até agora para a novela, só cinco são de pessoas ligadas ao regime militar. Entre os esquerdistas que vêm dar seu recado, os petistas estão bem à vontade – a produção da novela informa que a assessoria do partido sugeriu uma lista de possíveis entrevistados. yma piada já circula entre os funcionários da emissora: só falta Silvio Santos ressuscitar o famigerado A Semana do Presidente, quadro que era levado ao ar em seu programa no começo dos anos 80 para adular o último governante do regime militar, o general João Baptista Figueiredo.

Tiago Santiago esperneia para negar o oficialismo de sua criação. "Juro que não foi uma encomenda do SBT para agradar ao governo", diz. O noveleiro – repudia, em particular, qualquer ligação com a recente presteza das autoridades federais em encontrar uma solução para o rombo de 4 bilhões de reais no Banco PanAmericano, encrenca da qual o restante do império de Silvio saiu intacto. Até agora, a novela provocou mais repercussão do que audiência. Seus índices partiram em 5 pontos. Em seu programa dominical, Silvio já pediu que se investisse mais em amor e menos em revolução na novela (e aproveitou para elogiar os militares e criticar o comunismo). Santiago vai mesmo fazer mudanças nesse sentido, diminuindo, por exemplo, as cenas de tortura – mas só para manter o hábito, nega que haja qualquer ingerência patronal nessas alterações. E a lista de depoimentos deve ser engrossada por um senador da oposição, o tucano Aloysio Nunes Ferreira. Afinal, vai que os ventos do poder mudem de rumo.

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