Com o vírus Flame causando estragos nos sistemas de computadores iranianos, as companhias de software israelenses afirmam que a experiência de seu país com essas armas cibernéticas criou uma fonte de hackers treinados pelo exército, que podem ser contratados pelas empresas.
O bilionário Gil Shwed, que serviu em uma unidade de inteligência de elite, diz que vem recrutando pessoas entre os militares para sua Check Point Software Technologies, a segunda maior fabricante de redes de segurança do mundo. A Cyber-Ark Software, outra empresa especializada em defesa cibernética, que vendeu uma parte de seu capital para o banco Goldman Sachs em dezembro, consegue programadores experientes em unidades que incluem o programa de nove anos do exército para alunos de matemática e ciências de desempenho excepcional, segundo informou seu executivo-chefe, Udi Mokady.
Israel está entre os líderes de uma indústria que cresce em todas as partes do mundo, à medida que os governos tentam defender de ataques pela internet seus sistemas financeiros, suas usinas geradoras de energia e outros recursos públicos. A engenhosidade dos hackers, tidos como uma praga empenhada em invadir computadores para provocar danos ou obter lucros, tornou-se um recurso importante, à medida que companhias israelenses tentam abocanhar uma parcela de um mercado avaliado em US$ 18 bilhões.
Engenhosidade dos invasores de PCs tornou-se importante para um mercado de US$ 18 bilhões
Israel não revela se criou o vírus Flame. O vice-primeiro-ministro Moshe Yaalon disse que seria "razoável" para qualquer um ameaçado pelo Irã usar armas cibernéticas. Tido como um dos três países mais bem preparados para suportar ataques digitais, segundo um estudo da companhia de segurança McAfee, Israel está investindo recursos na guerra cibernética.
"Estamos entrando em uma era na qual sociedades inteiras podem ser paralisadas por ataques cibernéticos, e Israel não é diferente", disse o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, em 19 de fevereiro. "Estamos comprometidos em ser uma das três maiores potências cibernéticas do mundo."
As companhias israelenses estão tirando vantagem do cenário. As ações da Check Point, negociadas na Nasdaq, a bolsa eletrônica americana, acumulam uma valorização de quase 70% em dois anos. Os papéis de suas duas principais concorrentes, a Cisco Systems e a Juniper Networks, caíram mais de 30% no mesmo período.
"Hoje temos muito mais pesquisas sobre ataques específicos, sobre métodos usados pelos hackers e um entendimento muito maior do mundo dos hackers, para construirmos ferramentas melhores", disse Shwed, em uma entrevista em Tel Aviv.
A Check Point tinha uma participação de 10,7% do mercado mundial de segurança cibernética, em receita, em 2009, segundo um estudo divulgado em novembro de 2010 pela empresa de pesquisa de mercado IDC. As companhias israelenses ganharam cerca de US$ 4,2 bilhões com produtos de tecnologia da informação em 2010, com mais da metade disso vindo da área de segurança, disse Yafit Katz-Rubin, gerente de desenvolvimento de negócios para o setor, do Israel Export Institute de Tel Aviv.
A Bolsa de Valores de Tel Aviv e a El Al Israel Airlines foram alvos de ataques cibernéticos em janeiro, quando suas páginas na internet ficaram travadas. Os serviços de segurança israelenses estão trabalhando com outros governos para detectar a fonte.
"Estamos bastante bem frente às ameaças atuais, mas as do ano que vem e as que surgirem em dois anos serão piores e precisamos fazer frente a elas", disse Yitzhack Ben Israel, que foi escolhido no ano passado por Netanyahu para construir o National Cyber Directorate de Israel, anunciado em maio de 2011, para o qual recebeu um orçamento não divulgado. "Nossa maior preocupação são os danos aos nossos principais sistemas de emergência, que são todos controlados por computadores."
O conhecimento de Israel está atraindo investidores. O Goldman Sachs juntou-se ao Jerusalem Venture Partners (JVP) em um investimento de US$ 40 milhões na Cyber-Ark. "O mercado de segurança de informações está mesmo passando por uma grande turbulência", disse Mokady, principal executivo da Cyber-Ark.
A Elbit Systems, maior fornecedora não governamental de equipamentos de defesa de Israel, disse ontem, em comunicado, que vai vender um novo simulador de segurança cibernética destinado a treinar agências de infraestrutura do governo, militares e civis, no enfrentamento de ataques digitais.
O Irã responsabilizou Israel quando suas instalações nucleares foram atacadas pelo vírus Stuxnet no ano passado, e atribuiu o Flame ao que um porta-voz qualificou de "regimes ilegítimos", um termo empregado comumente para se referir a Israel. A Information Technology Organization do Irã disse em seu site que produziu uma ferramenta para identificar e suprimir o Flame.
Israel e os Estados Unidos foram parceiros na criação do Stuxnet, segundo uma reportagem publicada pelo jornal "The New York Times" em 1º de junho, que atribuiu a informação a participantes do programa.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, acelerou desde então os ataques cibernéticos ao Irã, segundo o jornal.
Depois do surgimento do Flame, "a maior parte das especulações concentrou-se em Israel, e posso entender o porquê", disse Gabi Weimann, autor do livro "Terror on the Internet" e professor na Universidade de Haifa. "Os israelenses estão, certamente, no primeiro time nas ciências da computação, principalmente no campo da guerra de computadores."
O Flame, descoberto pelas empresas de segurança de internet em 28 de maio, tem capacidade de roubar documentos, captar imagens de telas de computadores de mesa e propagar-se por meio de unidades externas de armazenamento de dados.
"A complexidade e funcionalidade do recém-descoberto programa ultrapassa as de todas as ameaças cibernéticas conhecidas até o momento", disse a Kaspersky Lab, empresa de segurança sediada na Rússia, em um comunicado em seu site. A companhia qualificou o Flame como uma "superarma cibernética" e disse ser provável a existência de um governo por trás dele.
Erell Margalit, fundador e presidente do conselho de administração do JVP, disse que o governo precisa fortalecer os vínculos entre os militares e as empresas tecnológicas para estimular mais inovação de produtos de segurança de internet.
"O que queremos fazer é transformar um dos maiores problemas mundiais em uma oportunidade econômica para Israel", disse Margalit.