Publicado Jornal da Ciencia
José Monserrat Filho
Chefe da Assessoria de Cooperação Internacional da Agência Espacial Brasileira (AEB)
A mais alta instância da cooperação Brasil-China referendou, em 13 de fevereiro passado, a decisão tomada ainda em agosto de 2011 pela Subcomissão Espacial brasileiro-chinesa de criação de um grupo de trabalho especialmente encarregado de discutir e elaborar um plano decenal de colaboração em atividades espaciais.
Não poderia haver maior e mais ambiciosa novidade na já longa – e nem sempre retilínea – trajetória da cooperação espacial entre os dois países, iniciada em junho de 1988, quando o então presidente José Sarney assinou, em Pequim, o primeiro acordo envolvendo tecnologia de ponta entre países em desenvolvimento, para a construção conjunta do primeiro satélite Brasil-China de recursos naturais da Terra, ou seja, de sensoriamento remoto dos recursos e riquezas terrestres, conhecido pela sigla CBERS (China-Brazil Earth ResourcesSatellite).
A notícia é extremamente alvissareira. Significa que o Brasil aprovou a possibilidade de assumir um planejamento espacial de nada menos de 10 anos, junto com um país altamente planejado, que graças a isso deu uma virada histórica – com um ritmo vertiginoso de crescimento – e, hoje, está bem próximo de se tornar uma potência econômica e política como poucas. Quando fizemos algo semelhante? Nunca.
A tarefa nos impõe não apenas uma política de governo, mas, em especial, uma política de Estado, de longo prazo, de pensar grande, à prova de mandatos e gestões de alguns poucos anos, apequenados pelo imediatismo. Eis aí ao alcance de nossas mãos a efetivação do antigo sonho de nossa comunidade científica e tecnológica, além de muitos gestores, ministros e parlamentares, todos conscientemente de olho nos campos estratégicos do conhecimento, indispensáveis ao desenvolvimento sustentável, sensato, responsável e promissor, que pedem muito mais do que três ou quatro anos.
Isso implica outras tarefas desafiantes. Teremos que mudar de hábitos, olhar mais longe, pesquisar a fundo com dados mais prospectivos, alargar nossas reflexões e hipóteses, e nos organizar como jamais antes para compor um novíssimo grupo de trabalho, com gente capaz e disposta a se empenhar sistematicamente na montagem de um plano de ações definidas e priorizadas com o máximo cuidado, segurança e determinação para toda uma década, no mínimo.
O plano decenal, se de fato vingar e ganhar corpo, incluirá com certeza o CBERS-5 e 6, e os seguintes, um satélite de meteorologia e, quem sabe, um satélite radar (capaz de superar as intempéries que dificultam a observação da Terra), que tanto necessitamos para melhor monitorar a imensa Amazônia, patrimônio inestimável a zelar, conhecer e explorar de forma sustentável com a mais avançada tecnologia.
Será uma escola de futuro. Provavelmente das primeiras e das mais eficientes em suas múltiplas experiências e lições. Nela, poderemos formar toda uma geração de graduados, pós-graduados, técnicos, especialistas, empresários, usuários e cidadãos preparados para viver num tempo que ainda nem sabemos se realmente virá, tamanha é a crise global que hoje enfrentamos, querendo ou não.