Do nada para lugar nenhum
Roberto Lopes,
Jornalista especializado em assuntos militares.
Em 2000 graduou-se em Gestão e Planejamento de Defesa
no Colégio de Estudos de Defesa Hemisférica
da Universidade de Defesa Nacional dos Estados Unidos,
em Washington. É autor da monografia “Oportunidade para Civis
na Condução dos Assuntos da Defesa Nacional: o Caso do Brasil”,
lançado em Washington no ano de 2001.
Somente a irresistível vocação da diplomacia petista para cortejar as ditaduras sanguinárias e corruptas do Terceiro Mundo explica o constrangimento a que foram submetidos os comandantes das Forças Armadas, na segunda semana de janeiro deste ano, convocados pelo Ministro da Defesa, embaixador (filiado ao PT) Celso Amorim, a perderem seu tempo em uma fastidiosa reunião com Gotabaya Rajapaksa, Secretário da Defesa e do Desenvolvimento Urbano (?!) da conturbada República Democrática Socialista do Sri Lanka (antigo Ceilão).
Protocolos superdimensionados, que forçam as altas patentes a interromperem suas agendas de trabalho para, em Brasília, reverenciar visitantes das mais modestas origens – como as delegações militares da Serra Leoa e de Antigua e Barbuda –, são parte do legado que a Era Amorim deixa ao funcionamento interno do Ministério.
É conhecido o caso da bela professora María Fernanda Espinosa Garcés, ministra da Defesa do Equador, que, em novembro último, tendo viajado a Paris para tratar de assuntos da sua Pasta no Ministére de La Défense, foi recebida não pelo titular do órgão, Jean-Yves Le Drian – ocupado com os assuntos da Síria e do emprego de tropas francesas na África –, mas por Kader Arif, um dos seus vice-ministros. Nem por isso María Fernanda sentiu-se ofendida, ou considerou que sua viagem foi um fracasso.
No Ministério da Defesa do Brasil, a política de punhos-de-renda não permite que visitantes de nações de menor “potencial estratégico” (digamos, polidamente, assim) sejam atendidos por oficiais-generais ou executivos civis do segundo escalão.
O estilo Amorim força os comandantes das Forças Singulares a assistirem verdadeiras aulas sobre as realidades nacionais de países sem expressão – cujos governos, na maior parte das vezes, vêm apenas solicitar vagas para seus jovens nas escolas militares brasileiras. Treinamento gratuito, naturalmente, onde todos os custos correm por conta do já sacrificado – e maltratado – orçamento da Defesa Nacional.
Foi assim, por exemplo, no caso do tapete vermelho estendido ao visitante do distante e enigmático Sri Lanka.
A assessoria do Ministério da Defesa destacou possibilidades de “treinamento e o intercâmbio de militares, bem como a cooperação técnica e industrial no setor de defesa” como “principais pontos” do encontro. O visitante foi apresentado aos diferentes projetos de navios militares construídos pela indústria nacional, mas uma eventual encomenda por parte da Marinha do seu país é pouco provável. O Sri Lanka vem obtendo, de graça, navios usados da Guarda Costeira americana – e isso parece bastar-lhe.
Na verdade, se existe alguém ansioso por vender nessa parceria é a nação asiática – que, em setembro último, durante um workshop em Brasília, anunciou seu plano de inundar a América Latina com o conceituado Ceylon Tea (“Chá do Ceilão”).
Resta, contudo, dizer uma palavra sobre o ilustre hóspede do ministro da Defesa.
Na condição de irmão mais novo do presidente do Sri Lanka, Mahinda Rajapaksa, Gotabaya – um oficial da reserva do Exército – comandou, nas últimas três décadas, uma brutal repressão à guerrilha separatista dos Tigres Tamis, que, segundo os números oficiais, deixou 90 mil civis mortos e 30 mil mutilados (estatísticas independentes falam em mais de 200 mil vítimas não militares).
Seu nome aparece como protagonista de diferentes relatos encaminhados à Corte Internacional de Haia por causa da eliminação física de rebeldes e de lideranças budistas do grupo Bodu Bala Sena, apoiador dos insurretos, em episódios eivados de denúncias sobre torturas. E também por seu empenho em amordaçar a imprensa independente do Sri Lanka. Tudo exaustivamente documentado por mídias como The New York Times, BBC News, Daily Mirror, Reuters e outras.
Nessa conturbada trajetória, o bom Rajapaksa caçula sobreviveu a um atentado contra a sua vida, em dezembro de 2006, quando um homem-bomba foi ao sacrifício extremo para tentar tira-lo de cena.
Recentemente, a agência Defesanet.com.br trouxe uma advertência do ex-comandante da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, general (da reserva) Luiz Eduardo Rocha Paiva, sobre a manipulação da área militar pelos petistas: “A liderança política está transformando a liderança militar em uma burocracia muda e submissa, sob um Ministério da Defesa partidário, servil a programas de governo mesmo se danosos à segurança nacional como é a política indigenista” (“Dissuasão Extrarregional, assim é só discurso”, 19 de janeiro de 2014).
O pior, é que no labirinto diplomático da política sul-sul (terceiro-mundista), montado pela diplomacia do PT, é facílimo ir da cruel ditadura da Guiné Equatorial – que o presidente Lula visitou sorridente, em julho de 2010 – aos salamaleques para Gotabaya Rajapaksa. Ou, em outras palavras, ir do nada para lugar nenhum.
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