TECMUNDO
Eduardo Vieira Karas
Desde dezembro de 1988, os céus do mundo inteiro servem de palco para o maior e mais pesado avião já construído pelo homem. O soberano Antonov An-225 Mriya atua no transporte comercial de cargas e apenas uma unidade encontra-se em atividade.
O projeto foi concebido na Ucrânia quando esta ainda pertencia à antiga União Soviética, sendo liderado pela Antonov Design Bureau, companhia especializada no ramo de aeronaves que foi fundada logo após a Segundo Guerra Mundial, em 1946. O codinome “Mriya” vem do idioma ucraniano e quer dizer “sonho”. Na OTAN, seu nome de identificação é Cossack.
Só para ter uma ideia, caso o avião fosse tripulado integralmente, poderia levar mais de 1,5 mil pessoas dentro de sua estrutura — quase o dobro do que comporta o Airbus A380, o maior avião comercial de passageiros existente nos dias de hoje.
Operação Tonelada
Inicialmente, o modelo An-225 foi concebido para carregar o ônibus espacial soviético Buran na parte externa da fuselagem. Dito e feito: como um carro que transporta uma prancha de surf nos finais de semana, o gigante cumpriu sua missão em junho de 1989, durante o Paris Air Show, evento considerado como o maior do mundo em relação a demonstrações aéreas.
Fora a capacidade suportada pelo rack exterior (200 toneladas), o Mriya aguenta ainda mais peso na parte interna dos seus compartimentos (250 toneladas). Entretanto, uma medida exclui a outra, ou seja, a carga se concentra ou dentro ou fora da aeronave. O recorde de transporte foi estabelecido em setembro de 2001, quando um carregamento de 253,86 foi conduzido por cerca de 1000 km.
O maior mamífero do mundo, a baleia azul, com suas 180 toneladas e mais de 30 metros de comprimento, poderia ser transportada sem problemas pelos ares através do maior avião do mundo — o comprimento de 84 metros e a altura de 18 metros ajudam a “estacionar” carregamentos enormes no bagageiro.
Segredos da engenharia
Diferente de Boeings convencionais, o An-225 possui uma porta móvel (que mede mais de 6×4 metros) na parte frontal de sua estrutura para receber e descarregar cargas. Dessa forma, peças e objetos de dimensões grandes podem entrar com mais facilidade. Além disso, também há uma rampa com engrenagem móvel que é acionada apenas no embarque.
Apesar de a fuselagem superior tolerar menos peso, ela permite o transporte de cargas maiores em tamanho (desde que estas sejam providas de uma aerodinâmica compatível). A envergadura das asas (88,4 m — imagine a distância de uma trave a outra em um campo de futebol) supera todas as outras medidas e é o grande segredo para manter a vigorosa máquina segura nos ares.
Para levantar voo e manter a estabilidade aérea, as asas contam com três motores Lotarev D-18T cada uma — o triplo de um Boeing 737 convencional. Na hora do pouso, trinta e duas rodas em catorze rolamentos são necessárias para suportar o impacto da aterrissagem, que pode superar, somando-se avião e carga, o montante de 600 toneladas.
A pequena tripulação do peso-pesado é de apenas seis pessoas: piloto, copiloto e quatro assessores de voo. Por ser antigo, o An-225 não é nenhuma maravilha tecnológica e tem grande parte dos comandos realizados a partir de procedimentos analógicos. Porém, mesmo com toda a sua massa, o An-225 pode chegar a 850 km/h — a mesma velocidade média de aviões tradicionais tripulados.
Colosso em Guarulhos
No ano passado, o antológico aeroplano pousou pela primeira vez na América Latina. A ocorrência se deu no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, e foi acompanhada por uma multidão de pessoas. Na ocasião, o An-225 estava a serviço da Petrobrás e trouxe três válvulas para a Refinaria de Paulínia (REPLAN), que também é a maior refinaria da empresa em termos de produção.
O irmão adormecido
Quase 15 anos se sucederam desde o seu lançamento e o Antonov An-225 continua sendo a maior obra de engenharia capaz de voar feita pelo ser humano. Em maio de 2001, o avião recebeu um reforço em sua base (além de equipamentos de monitoramento mais avançados) que estendeu seu limite de peso para decolagem de 600 toneladas para 640 toneladas.
Ainda no final dos anos 80, a Antonov começou a construir um segundo An-225. Infelizmente, devido a problemas financeiros e ao fim da União Soviética, a conclusão do modelo foi abandonada pela empresa em meados de 1994.
Devido ao sucesso do outro Mriya em atividade (que custou cerca de US$ 300 milhões), especulou-se a retomada do projeto de seu “irmão” em 2006. Mas, apesar dos esforços e previsões, a construção foi novamente deixada de lado em agosto de 2009.
Passando o trono adiante
Além das rotas privadas, as centenas de voos realizadas pelo maior avião do mundo foram cruciais na questão de ajuda humanitária.
Em junho de 2003, junto a um procedimento que envolveu outras aeronaves, 800 toneladas de medicamentos e comida foram entregues para auxiliar as vítimas do confronto no Iraque.
Em 2002, 216 mil refeições prontas foram entregues a soldados americanos residindo em uma base no Omã. Recentemente, o último beneficiado foi o Japão. Após as tragédias causadas pelo tsunami e a pela usina de Fukushima, 145 toneladas de produtos assistenciais foram enviadas à ilha.
Entretanto, boatos sobre um modelo ainda maior e mais robusto circulam desde o século passado. O sucessor, An-325, teria mais dois motores (totalizando oito) e estaria apto a bater o recorde do Mriya, conseguindo levantar voo com ainda mais toneladas em seus compartimentos. Sobre o assunto, nada oficial ou promissor é confirmado pelo fabricante atualmente.
Curiosidade: no filme "2012", um modelo Antonov An-225 foi usado durante as filmagens e também recriado com efeitos especiais. Algumas características, como a cabine e portas de entrada, foram modificadas para as cenas. Dessa forma, o protótipo fictício foi chamado de An-500 — o que seria uma versão atualizada e mais moderna do seu antecessor.
O total de recordes quebrados e mantidos pelo Antonov An-225 Mriya é de 240. Provavelmente — já que não há projetos concretos para o desenvolvimento de aviões maiores —, a história deve continuar assim nos próximos anos. Outra coisa: se você precisar transportar algo grande (monstruosamente grande!), já sabe a quem recorrer.